Psicóloga explica quando e como falar de morte com os filhos, esclarecendo que privá-los do contato com isso pode piorar a reação delas a futuras frustrações
O fim da vida é um tópico presente na vida de todos, mas, afinal, como falar de morte com os filhos? Esse tópico veio à tona recentemente conforme o ex-BBB Eliezer relatou que a filha de 2 anos, Lua, estaria “traumatizada” com a morte de um personagem do filme infantil “O Rei Leão” – e, segundo psicóloga, situações como essa podem ser, na realidade, uma porta para conversar sobre o assunto de forma enriquecedora.
Eliezer relata “trauma” da filha após ver filme infantil

Usando o Instagram, o ex-BBB Eliezer, marido da influencer Viih Tube, afirmou achar que a filha de 2 anos, Lua, estaria “traumatizada”. Isso porque a pequena assistiu ao filme “O Rei Leão” com o pai – e se desesperou na cena em que um dos personagens principais, o leão Mufasa, morre em uma queda.
“Tô chateado, acho que traumatizei minha filha. Sempre sonhei em assistir a ‘O Rei Leão’ com ela. Hoje tive a ideia e estava indo tudo bem até a cena da morte do Mufasa. Ela começou a falar: ‘Não quero esse, não quero esse’. Eu, na hora, tirei. Ela pediu para ver a mãe e chegou na Viih agitada falando que ‘o leão caiu’”, disse ele, narrando a reação da esposa.
“A Viih agiu rápido. Pediu para botar no final do filme para mostrar para ela que ficou tudo bem e acalmá-la. Acho que ela nunca mais vai assistir a ‘Rei Leão’ comigo”, lamentou o influencer.
A atitude deles dividiu opiniões entre internautas – e, em entrevista, a psicóloga Alessandra Augusto, especialista em terapia sistêmica, terapia cognitivo comportamental e neuropsicopedagogia, explica os possíveis efeitos disso, bem como formas de contornar situações semelhantes.
Cena de morte em um desenho pode gerar traumas?

Segundo a psicóloga, o desconforto de uma criança ao assistir a uma cena de morte em um filme não é necessariamente o mesmo que um trauma. “Sentir tristeza, susto ou até medo diante de uma cena impactante não configura, por si só, um trauma. O que traumatiza não é o conteúdo, mas sim a forma como ele é elaborado – ou não”, explica a terapeuta.
De acordo com ela, o trauma é criado quando, após uma situação ou sensação intensa, a criança é silenciada, ignorada ou desacreditada pelos adultos. “Se a criança vive uma situação difícil, mas encontra acolhimento, explicação, presença emocional do adulto, ela transforma isso em aprendizado”, afirma Alessandra.
Falar de morte com os filhos: a criança deve ser poupada?

Por outro lado, no entanto, Alessandra lembra que esconder ou proibir assuntos como a morte para crianças pode ser prejudicial. “Superproteção, nesse contexto, pode até parecer carinho, mas impede que a criança desenvolva recursos para lidar com as perdas da vida – e elas virão, cedo ou tarde”, diz ela.
Mas, afinal, como é possível tratar de assuntos tão densos com uma criança pequena como Lua, por exemplo? A saída, segundo a psicóloga, é abordar questões difíceis de acordo com o repertório da criança, entendendo o que ela consegue ou não assimilar.
“Com dois anos, a compreensão ainda é muito concreta. Ela não vai entender o conceito de ‘fim da vida’, mas vai perceber ausência, mudança, perde, e vai sentir. Isso não significa que devemos evitar o assunto. Significa que precisamos traduzir a experiência na linguagem dela”, orienta a terapeuta.
Quando e como falar de morte com os filhos?

Conforme explica Alessandra, não existe uma idade certa e muito menos uma forma universal de falar com crianças sobre morte. “Não existe uma ‘data de validade emocional’ marcada no calendário. O que existe é o repertório da criança. O que ela entende? Como simboliza o mundo? É a partir disso que podemos conversar”, diz ela.
Na sequência, a psicóloga pontua que, na hora de elaborar o assunto, é necessário levar em consideração as crenças da família. Isso facilita a criação de uma conversa coerente com a cultura familiar – que não deve nunca “enganar” a criança. “Evite frases que confundem, como ‘foi viajar’, ‘virou estrela’ ou ‘foi dormir’. Isso pode gerar medo real, como o receio de dormir e ‘não voltar’”, pontua.
Alessandra também exemplifica, usando a situação vivida por Eliezer, Viih Tube e Lua, uma forma simples e sensível de abordar a questão. “Prefira algo como: ‘O leão caiu, filha. Ele morreu. Isso quer dizer que ele não volta mais. E é normal a gente ficar triste. Mas ele viveu uma vida bonita e deixou muito amor’”, diz ela, afirmando que o mesmo vale para situações reais.

“Se for um parente, um pet, um vizinho querido, o princípio é o mesmo: respeitar a maturidade da criança, mas não mentir. Reflita antes: em que sua família acredita? Fala-se em céu? Em reencarnação? Em ciclo da vida? Seja qual for a resposta, mantenha a coerência e sempre traga a mensagem de que a dor existe – mas o amor também. Devemos falar disso com leveza, verdade e afeto”, afirma ela, pontuando os benefícios disso.
“Tudo tem um fim, e falar disso desde cedo ajuda nossos filhos a lidarem melhor com mudanças, perdas, separações e até frustrações simples da vida. Se ensinarmos nossos filhos que as coisas acabam, talvez eles cresçam aprendendo a agradecer enquanto têm A não adiar o afeto. A sair das telas e entrar na vida. A cuidar mais das relações”, reflete.
Por fim, ela afirma que, tanto durante quando depois de uma conversa assim, é preciso ter paciência. “Abra espaço para perguntas. Responda com verdade e afeto, sem pressa de fechar o assunto. Criança elabora em etapas. Às vezes ela vai voltar nisso dias depois, do nada. E tudo bem”, conclui.