Um trabalho integrado de três organizações internacionais dedicadas à compreensão dos fenômenos da mudança climática, Climate Action International, NewClimate Institute e Germanwatch, organizou dados globais sobre o desempenho dos 60 países de maior impacto ambiental.
No Climate Change Performance Index 2018, o Brasil foi apontado na 19ª posição, o primeiro entre os países classificados com desempenho médio. O ranking considera quatro aspectos para definir a pontuação: emissão de gases de efeito estufa (40% da pontuação geral), políticas climáticas, uso de energia e energia renovável. Poucos anos atrás, em 2012, o país estava na 4ª colocação, à frente até países tradicionalmente sustentáveis, como Suécia e Noruega.
O VIX consultou dois dos principais especialistas no tema, o professor de Física da USP Paulo Artaxo Netto, que estuda alterações climáticas desde 1985, e Andrea Santos, secretária executiva do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC), para explicar o que o Brasil tem feito de certo e de errado do ponto de vista ambiental.
Emissão de gases de efeito estufa: Brasil piora
O desempenho do Brasil no quesito emissão de gases que contribuem para o efeito estufa está em queda livre, entendem os especialistas. No ranking, o Brasil ocupa a 21ª posição, no grupo das nações de desempenho médio – no levantamento de 2012, estávamos entre os países de desempenho alto.
O fator mais determinante para é o aumento do desmatamento, sobretudo da Amazônia e do Cerrado.
“Não há dúvida sobre o aumento da taxa de desmatamento da Amazônia, antes era de 5 mil quilômetros por ano e hoje está em torno de 8 mil quilômetros por ano. E a área desmatada do Cerrado é ainda maior. É enorme, do ponto de vista ambiental. Tem que diminuir”, afirma Paulo Artaxo. “Há uma mudança na política do uso de solo e floresta, favorecendo a agropecuária”, completa Andrea Santos.
Os especialistas listam ainda mais vilões, como o uso mais recorrente de termoelétricas (como resultado da crise hídrica, uma vez que a matriz energética do Brasil é hidrelétrica) e os incentivos para a exploração de petróleo e gás (concedidas pelo governo federal) – as cifras podem superar R$ 1 trilhão e o período de extração de recursos naturais é de 25 anos.
A medida do governo tem resultados tão desastrosos do ponto de vista ambiental que na COP (conferência sobre mudanças climáticas promovida pela ONU), o Brasil foi “homenageado” com o prêmio Fóssil do Dia. “O Brasil, o gigante verde sul-americano, a terra de biocombustíveis sustentáveis e o portador orgulhoso de um mix de energia de baixo carbono é a mais nova vítima da febre do petróleo”, ironiza a entidade no anúncio da premiação.
Energias renováveis: o melhor desempenho do Brasil
O Brasil é um país excepcional para o aproveitamento de várias matrizes de energia renovável, como hidrelétricas e campos de energia solar e eólica – e é este o fator mais bem avaliado pelo ranking. Neste quesito, o desempenho brasileiro é considerado alto, na 13ª colocação.
“A principal matriz de energia do Brasil é limpa, a hidroeletricidade, e novas matrizes já estão ajudando”, analisa Andrea. “Temos algumas vantagens estratégicas enormes, como o programa de biocombustíveis, um projeto único no planeta. É um potencial enorme em energia solar e eólica e este potencial está sendo explorado”, afirma o professor da Usp, destacando que tais fontes de energia tendem a surgir, principalmente, no Nordeste.
Uso de energia: Brasil abusa dos combustíveis fósseis
De acordo com o levantamento, o Brasil ocupa a 25ª posição no quesito uso de energia, com desempenho qualificado como médio. Neste módulo, o país é avaliado pelo seu consumo per capita de energia e pela sua capacidade de cumprir as metas assumidas anteriormente, sendo a principal delas de reduzir o índice atual de emissão de gases do efeito estufa em 43% até 2030.
“A posição do Brasil no ranking significa que ainda temos chances de alcançar essa meta”, explica a secretária executiva do PBMC. “Há mais fatores: usamos muito combustível fóssil para o transporte (gasolina e diesel) e recorremos às termoelétricas quando ocorrem crises hídricas”, completa.
Políticas climáticas: o pior desempenho do Brasil
No quesito políticas climáticas, o Brasil vai mal. O desempenho está no limite do considerado médio, sendo avaliado como ruim em alguns tópicos, e confere a 30ª posição ao país. Na análise dos especialistas ouvidos pela reportagem, a conclusão é a mesma: o momento é de retrocesso.
“Até a Conferência de Paris (em 2011), o Brasil tinha apresentado metas e reduzido o desmatamento. Mas, nos últimos 5 anos, mostra retrocesso e discordâncias de políticas: a de energia não conversa com a economia e com o desenvolvimento”, analisa Andrea Santos.
Para Paulo Artaxo, o caso das concessões de campos de petróleo é um bom exemplo disso. “São políticas públicas que abrem para empresas estrangeiras explorarem as riquezas nacionais com subsídios”, afirma. “Isso acontece porque o Congresso brasileiro é hoje dominado pela bancada ruralista, que não tem nenhum interesse em trabalhar pela preservação do meio ambiente. Isso traz dificuldades importantes para o país, é um problema de política pública, de fato”, conclui.
Conclusão do relatório
No documento, os ambientalistas internacionais reafirmam críticas à política climática do atual governo brasileiro, citando alguns cortes de verba para programas de desenvolvimento de fontes alternativas de energia. “As fracas tendências evidenciadas ao longo dos anos passados recentes nas emissões de gases causadores de efeito estufa e no consumo de energia levam à uma baixa avaliação do Brasil nos últimos 5 anos, mas ainda de forma mediana para cumprir suas metas até 2030”, encerra o relatório.
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