A busca do sucesso a qualquer preço no mundo dos negócios criou um tipo de profissional que os americanos denominaram de workaholic. O termo originou-se da palavra inglesa alcoholic, que significa alcoólatra. Ou seja, a pessoa também é uma viciada – só que em trabalho. Copiar a cultura americana não é uma novidade no Brasil e nem mesmo esse vício escapou de ser absorvido. E filhos, maridos, amigos e lazer estão sendo colocados em segundo plano. De um lado, a alta competição do mercado, a obsessão em ganhar dinheiro e a vaidade. De outro, a péssima qualidade de vida, insônia, impotência e, até, depressão. No entanto, as empresas querem funcionários bem-humorados e criativos e, para isso, é preciso equilíbrio em todos os setores da vida. Mesmo porque, trabalhar muito não é sinônimo de qualidade.
Uma das características comuns a esses viciados em trabalho é a ambição que, na dose certa, funciona como mola propulsora da realização de sonhos, mas em excesso pode levar a comportamentos compulsivos. “Quero morar sozinha num apartamento comprado por mim e manter o padrão de vida que minha mãe me proporciona. Por isso, não rejeito nenhum trabalho. Fora o meu emprego, ainda pego outros ‘freelas’. Então, sempre que chego em casa, ainda tenho milhares de coisas para fazer”, afirma a jornalista Lisa Guedes. E, como diz o ditado, ‘filho de peixe, peixinho é’, Lisa é filha de uma workaholic e cresceu vendo a mãe chegar de madrugada do trabalho. Mesmo sentindo a ausência materna, ela repete a mesma história. “Minha mãe é nova e bem-sucedida na carreira, sempre trabalhou e se dedicou muito. Quero corresponder às expectativas dela, ou melhor, superá-las. Preciso mostrar que também sou capaz de ter uma história de sucesso na carreira cedo e para isso trabalho uma média de 12 horas por dia, sábados, domingos e feriados. É compulsivo”, admite.
Fazer o que se gosta é ótimo e necessário para ser feliz. Mas isso pode levar a extremos. “Confesso que sou viciada em trabalho, não só porque gosto do que faço, mas porque quero minha independência o quanto antes. E isso gera muitos conflitos, porque tenho apenas 24 anos e sinto que estou queimando etapas da minha vida. Meus amigos nem me ligam mais, já sabem que não tenho tempo. E dessa forma me faltam opções de diversão e acabo trabalhando para preencher o tempo. É uma bola de neve”, lamenta Lisa, que já sente no corpo os sintomas do exagero. “Tenho problemas de insônia e, quando não consigo fazer tudo o que preciso, acordo no meio da noite preocupada e não durmo mais. Não tenho esse ‘time’ de abstrair e, o que é pior, parei de malhar, falto muito as aulas na faculdade, quase não vejo meu namorado e praticamente não tenho lazer”, relata.
O problema é quando essa obsessão detona noções de limite, aumenta cada vez mais o expediente e faz com que se abra mão do resto da vida. Não há família que agüente. As pressões são inevitáveis e, muitas vezes, o divórcio também. “Me separei há seis meses de um casamento de oito anos com uma workaholic, ou seja, era falta de atenção mútua. Mas precisei fazer uma reabilitação mental para não cair nunca mais nessa roubada que não há dinheiro que pague. Minha filha está com quatro anos e só agora estou presente no crescimento dela. Nossa relação está maravilhosa, me permito levá-la todos os dias à escola, a vejo todas terças e sextas e ela passa um fim de semana a cada dois comigo. Respeito esses compromissos religiosamente”, comenta o empresário Márcio Lopes. Sua vaidade o levou a ter um comportamento compulsivo típico da síndrome. Aos 29 anos foi diretor, com 33 vice-presidente e hoje, com 36, é presidente de uma multinacional. Uma raridade, verdadeiro exemplo de condicionamento empresarial. “Tive uma história de sucesso, que me fez míope por um tempo. Hoje trabalho 12 horas, mas antes eram 14. Agora estou focado no treinamento de me conhecer e, com isso, me recriando. Voltei a fazer exercícios, sexo, vou ao cinema, viajo e como pipocas”, diverte-se.
Além de ser prejudicial à saúde, essa dedicação excessiva pode fazer com que todo o caminho profissional construído desça ralo abaixo. Segundo o terapeuta empresarial Ricardo Estevam, quando um workaholic procura ajuda a situação já está grave. “É bastante comum os casos de depressão por excesso de trabalho. Mas impotência sexual, insônia e fadiga são ainda mais corriqueiros. O indivíduo se isola tanto no seu mundo empresarial que esquece do resto. Lazer, família e diversão são totalmente abolidos. Na maioria das vezes, essa obsessão vem de outras insatisfações e o trabalho serve como um escudo protetor, para tirar o foco das verdadeiras razões que estão incomodando. Isso torna o tratamento mais demorado, pois preciso ajudar a pessoa a sair dessa loucura desenfreada e encontrar um equilíbrio, para depois tratar dos outros conflitos emocionais mal resolvidos”, explica. Mas tudo tem solução e o melhor é não deixar a situação chegar ao limite. “Oriento as pessoas a começar a diminuir a carga horária, nem que seja apenas meia hora no início, procurar atividades que lhes dêem muito prazer, buscar o entrosamento com a família e com os amigos, voltar a ter uma vida social, fazer alguma atividade física, não levar nada para casa e, em hipótese alguma, falar de trabalho no final de semana”, aconselha.
Além dos males físicos e psicológicos, essa obsessão também traz problemas na carreira. É cada vez maior a preocupação das empresas com a qualidade de vida dos seus funcionários. Já está ultrapassada essa idéia de que para ser um bom profissional é preciso ser um workaholic. A experiência mostrou que felicidade gera produtividade e, consequentemente, resultados melhores. “Hoje em dia, o mercado não tem interesse no profissional com esse perfil compulsivo. Na década anterior isso era comum, mas hoje não é bem visto. As empresas perceberam que para o profissional ter bom desempenho, não precisa trabalhar 24 horas por dia. Pelo contrário, ele precisa ter tempo para administrar os outros papéis da vida”, esclarece a headhunter e diretora do Grupo Catho, Miriam Sion Adissi. Durante o processo seletivo, ouvir que a pessoa vive para o trabalho é tudo o que ela não quer. “O mercado precisa de pessoas que saibam balancear e isso significa dar atenção para todos ao setores da vida. Quero uma pessoa ambiciosa, mas que se preocupe com sua vida fora da empresa também”, define.
Apesar de parecer óbvio que quantidade não significa qualidade, os workaholics, na sua maioria, não percebem a diferença. Trabalhar é ótimo, prazeroso e enriquecedor. Mas não pode ser tudo na vida. Talento e competência são frutos de uma qualidade de vida em todos os setores. O equilíbrio é a palavra-chave para uma carreira bem-sucedida.
Agradecimentos:
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Ricardo Estevam
Psicólogo e terapeuta empresarial
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