Moda do bem

Como já era esperado, a nova campanha publicitária da Diesel é glamourosa, sofisticada e muito criativa. O que chama atenção, desta vez, é a total ênfase nas paisagens e locações ao invés do foco no produto. As imagens retratam como seria a vida num ambiente completamente alterado pelo aquecimento global, com conseqüente elevação da temperatura e do nível do mar. O inusitado fica por conta de tradicionais cartões postais como Nova York, Londres e o Monte Rushmore estarem submersos. A Muralha da China, por sua vez, quase desaparece nas imensas dunas de areia. Os famosos pombos da Praça de São Marcos, em Veneza, dão lugar a coloridos papagaios e a Torre Eiffel, em Paris, é retratada ao lado de palmeiras e lagartos.

O ponto é que “Charity”, termo comumente usado e que quer dizer “caridade”, é uma prática muita usada por empresas privadas para criar uma imagem positiva para a marca.

A campanha faz parte do movimento de conscientização mundial da Diesel sobre os efeitos colaterais do superaquecimento e defende a premissa de que é possível continuar vivendo com charme e estilo sem causar danos ao planeta.

De uns anos pra cá, muitas empresas privadas despertaram para a necessidade de um engajamento real e efetivo em ações sociais e ecológicas e começaram a apoiar projetos dos mais diferentes portes.

A sociedade civil também percebeu a importância de se organizar e agir. O número de ONGs espalhadas pelo mundo cresce vertiginosamente e muitas dessas organizações apresentam resultados surpreendentes. Uma das instituições sem fins lucrativos de maior destaque é o Greenpeace, famosa por sua luta incansável em proteger o meio ambiente. No Brasil, a SOS Mata Atlântica e a Fundação Ondazul há mais de 15 anos pesquisam, ensinam e protegem a fauna e a flora do nosso país.

O combate ao vírus HIV nos países de Terceiro Mundo, por exemplo, tornou-se uma das prioridades mundiais. A MAC, empresa de cosméticos Canadense, lançou a campanha VIVA GLAM cuja venda de um determinado produto da marca é revertida para o combate à Aids; a ALDO, famosa fabricante de sapatos e acessórios, se uniu a estrelas como Charlize Theron, Avril Lavigne e Cindy Crawford para também colaborar com essa luta. Bono Vox criou a RED, iniciativa que hoje conta com a participação da GAP, Motorola, Mastercard, Armani, entre outros, no intuito de amenizar o sofrimento dos portadores de HIV.

Aqui, os profissionais da moda nacional fazem a sua parte de diversas maneiras: contratam o trabalho artesanal de comunidades urbanas e rurais como a Coopa-Roca, Meninas da Rocinha, Coosturart e Criola; organizam vendas especiais de produtos com renda revertida para instituições e/ou projetos; criam produtos exclusivos para serem leiloados em eventos e ainda, atuam como consultores e orientadores de projetos de moda em ONGs e cooperativas.

Muitas celebridades já se envolveram em causas humanitárias desde que Audrey Hepburn – ela mesma uma refugiada do nazismo durante a II Guerra Mundial – participou ativamente, até a sua morte em 1993, do United Nations’s International Children’s Emergency Fund.

No entanto, há quem questione a participação de estrelas de Hollywood, top models, cantores ou mesmo estilistas de luxo, em questões humanitárias, apesar da força e do alcance de sua imagem.

Alguns alegam que uma celebridade é capaz de distorcer e até mesmo denegrir a reputação da instituição ou mesmo do projeto em questão. O foco acaba sempre sendo desviado para autopromoção.

Alguns funcionários da Unicef chegaram a criticar a aparição de Angelina Jolie e Brad Pitt na África, argumentando que, além de fazerem exigências muitas vezes difíceis de serem atendidas, causavam um tumulto inevitável por serem quem são. Além disso, efetivamente, o retorno de mídia não tinha sido satisfatório: notícias sobre o dia-a-dia do casal com os filhos adotivos em vez de informar o que efetivamente está sendo feito pela população local.

Uma recente auditoria da Unicef dentro do grupo PPR (Pinault-Printemps-Redoute), trouxe à tona práticas abusivas por parte de fornecedores indianos utilizados pelo conglomerado, que obrigavam os funcionários a trabalhar por salários irrisórios, muito abaixo do valor de mercado. Resultado: dor de cabeça para a Gucci, empresa do grupo parceira da Unicef, que havia convidado a atriz Jennifer Connelly para estrelar a campanha de Natal focada em educação para jovens de Moçambique.

O ponto é que “Charity”, termo comumente usado e que quer dizer “caridade”, é uma prática muita usada por empresas privadas para criar uma imagem positiva para a marca. É como um endosso ao discurso “somos uma empresa boazinha, que ajuda os que precisam”. O que acontece é que muitas vezes a empresa resolve iniciar um trabalho filantrópico justamente para encobrir práticas ilícitas.

Fica aqui então uma advertência: fazer o bem como uma estratégia de marketing não é um pecado capital. Porém, o consumidor de hoje é bem informado, antenado, globalizado. Achar que ele não vai perceber quem de fato está contribuindo é ingenuidade. O consumidor sabe como exigir as provas de um trabalho honesto, eficaz, com resultados.

E vai fazê-lo.