Molde perfeito

Afinal, os seios de Maria Antonieta deram ou não origem à taça de champagne? Falamos da coupe, aquela larga, de pouca profundidade, volta e meia ainda utilizadas.

Numa ótima resenha sobre o livro “Presença do Vinho no Brasil” (sobre o qual já falamos aqui), o jornalista Luiz Carlos Zanoni, do Paraná-Online, menciona uma palestra do grande Carlos Cabral, autor do livro, que teria falado que “o bojo das primeiras taças da bebida foi modelado tomando como medida os seios de Maria Antonieta“. Teria fundamento essa afirmação, pois são várias as lendas que cercam a criação dessa taça? Qual a verdadeira?

Os deuses gregos estavam tão encantados com Helena, que ordenaram a Paris que tirasse um molde dos seios da rainha em cera. Paris teria feito isso e muito mais. Paris acabou ficando com a rainha inteira. E deu naquela encrenca toda

Na primeira delas, foram os seios de Helena de Tróia que serviram de modelo. O autor romano Plínio teria sido o primeiro a contar essa história: uma taça de bronze teria sido moldada a partir dos seios de Helena. Ou seja: ela teria sido feita há mais de 1300 anos, ao fim da Idade do Bronze. Falam que, na Antiguidade, o original dessa taça era guardado num tempo da ilha de Rhodes. Segundo o autor belga Maurice des Ombiaux (1868-1943), os deuses gregos estavam tão encantados com Helena, que ordenaram a Paris que tirasse um molde dos seios da rainha em cera. Paris teria feito isso e muito mais. Paris acabou ficando com a rainha inteira. E deu naquela encrenca toda.

Hoje, essas taças, mas em vidro, são apresentadas aos turistas que visitam o sítio onde teria existido Tróia, na atual Turquia, num comércio que se repete, por exemplo, no Egito, quando os comerciantes nos oferecem um pedaço da tumba de algum faraó. Acredite se quiser. De qualquer modo, os seios femininos sempre foram particularmente apreciados. Na antiga Grécia, as mulheres andavam com eles à mostra, como comprovam afrescos e vasilhames.

Na Idade Média, Henrique II da França (1519-1559), rei francês, teria ordenado que se fizessem taças a partir dos seios de sua amante, Diane de Poitiers (1499-1566). Seriam seios “semelhantes a maçãs”, sempre a fruta do pecado a pontificar.

Só que tanto no tempo de Helena, quanto no de Diana, o vinho espumante ainda não havia sido criado – o que só vai acontecer a partir do século 17. Mas, sem dúvidas, as taças poderiam ter servido para o vinho parado.

Depois, no fim do século 18, a lenda chega à rainha Maria Antonieta (1755-1793), esposa de Luís XVI. E pelo menos aqui temos alguns fundamentos. Por ordem do rei, a fábrica de porcelana de Sèvres teria criado moldes do nobre modelo e produzido quatro taças brancas, cada qual montada sobre uma base composta por três cabeças de cabra. Tudo para adorno e também uso na leiteria da rainha no castelo de Rambouillet, perto de Versalhes. Eram vasilhames comuns na época, derivados de antigas tigelas gregas que lembravam seios femininos (chamavam de mastóide – de mastos, seios em grego).

Mas não há documento que suporte essa teoria. Essas taças, originalmente em porcelana, destinadas ao consumo de leite, continuam a ser feitas até hoje pela fábrica de Sèvres. Veja as taças aqui: são as famosas “jattes tétons”, mais ou menos “tigela de mamas”. Foram feitas para beber-se leite e não champanhe. O filme de Sofia Coppola deixa bem claro esse lado “rural” da rainha, com farto consumo de leite de cabra na vila campestre existente no “Petit Trianon” e em Rambouillet. No mesmo filme, assistimos ao consumo regular do espumante, mas em coupes de cristal.

As quatro taças originais sobrevivem no Museu Nacional de Cerâmica, em Sèvres, em Paris – e reproduções dos mesmos podem ser encomendadas por interessados em arte, leite ou peitos.