O ponto final

Apostamos que você rezou para todos os santos para que esta matéria trouxesse um guia prático de como terminar um relacionamento de forma segura, rápida e indolor. Infelizmente, temos uma má notícia: colocar um ponto final na relação só é fácil em final de novela, quando o mocinho descobre que a namorada é na verdade a vilã terrível e supermalvada da história. Na vida real, não há como escapar. É um momento difícil, conturbado e sem fórmula para o sucesso. Mas muita calma nessa hora! Encarar a questão de frente pode ser o primeiro passo para definir a situação. Afinal, se a idéia de colocar um fim no romance anda persistente, é sinal de que vocês não estão nada bem juntos.

Insegurança, comodismo e o medo da reação do outro são alguns fatores que transformam a missão do término em um verdadeiro pesadelo. A psicóloga Nina Maria Góes vai mais longe para explicar esta dificuldade, afirmando que nós não fomos feitos para términos, apenas para começos: “Começar é sempre melhor em tudo e mais fácil também. Começar a gravidez dá menos trabalho do que terminar. Começar a festa de um casamento dá menos canseira do que encerrar. Começar uma refeição é melhor do que acabar. Num relacionamento, o começo é delicioso porque nossos sonhos acordam, as expectativas são imensas, a realidade é inventada”, contrapõe.

Não é raro que, frente ao desafio, a opção de deixar para depois o anúncio do término pareça sedutora. Este caminho pode fazer com que o romance se desgaste ainda mais, facilitando o ponto final. A advogada Carla Maggi viveu esta experiência e, agora, respira aliviada por ter tido firmeza para pôr fim no namoro que, há tempos, estava longe de fazê-la feliz. Após três anos e meio de relacionamento, muitas brigas e incontáveis ameaças de cisão, ela se sentiu verdadeiramente esgotada e decidiu que era o momento de viver um pouco sozinha. “Terminamos várias vezes. Mas, no dia seguinte, os dois agiam normalmente, como se nada tivesse acontecido. Via que não estava bem, só que não conseguia levar o fim a sério. Foi um processo que durou um ano inteiro. Terminei quando pude, como se fosse meu organismo já pedindo. Não é a melhor opção. Para mim foi a mais fácil. Se você não rompe de uma forma brusca, você vai se convencendo da situação”, acredita Carla.

Para quem segue o exemplo da advogada, atenção: adiar a decisão pode soar como alternativa confortável, porém, não está livre de seus riscos. Empurrar o relacionamento “com a barriga” pode maximizar os problemas de uma forma insustentável, transformando descontentamento em rancor e ressentimento.

Até que somos felizes…

A rotina está cansativa e os desentendimentos, cada vez maiores. Mas tem sempre aquele fim de semana em que tudo parece perfeito a dois. O papo é agradável, os risos correm soltos e a sintonia está de volta. A psicóloga Nina Maria Góes conta que as pessoas tendem a se agarrar aos pontos positivos ainda existentes na relação e, com isso, protelam o fim do relacionamento. “Tem gente que passa a vida toda apenas ensaiando terminar, porque até o pior relacionamento traz um ganho, mesmo que secundário. É comum pessoas que vivem relacionamentos já esvaídos dizerem ‘a turma se reúne às sextas feiras, se nos separarmos, quem completará a mesa?’ Não fique surpreso. É por aí! Outra desculpa: ‘As passagens para os Estados Unidos já estão compradas, se nos separarmos, como será?’”, exemplifica a psicóloga.

Uma ameaça

O término também pode ser visto como uma forma de consertar o relacionamento que não anda bem das pernas. Uma maneira de despertar o medo no outro e fazer com o que ele passe a se comportar da forma desejada. A estudante de economia Júlia Lederman apostou nesta estratégia com o ex-namorado, com quem viveu um relacionamento conturbado. “Ficava insatisfeita e terminava. Achava que assim ia dar um tranco nele. Durante cinco meses funcionou”, diz ela. Júlia conta que a iniciativa fez com que a relação se prolongasse, mas não foi suficiente para acertar os ponteiros entre os dois. “Comecei a perceber a falta de vontade dele em estar junto e fazer os meus programas. Também passei a me sentir da mesma forma. No final, não queria nem olhar na cara dele”.

Este resultado desastrado e frustrante pode ser natural, segundo a psicóloga Nina Maria Góes. Já que uma mudança de atitude surge somente a partir de um desejo profundo da pessoa e não à base de ameaças. “Há os que ensaiam terminar para ver o impacto que este teste causa no parceiro. Mas estão se enganando. Nada do que a gente faz pode motivar alguém a fazer o que não quer”, alerta a psicóloga.

O problema é comigo

Muitas vezes, a decisão já está tomada e sacramentada na sua cabeça. No entanto, falta a bendita coragem para expor ao companheiro as verdadeiras razões para o fim. É aí que entra uma saída aparentemente perfeita: colocar a culpa em complicações pessoais, que nada têm a ver com o outro. Se você nunca usou este argumento, provavelmente já o escutou: “O problema não é com você, sou eu”. Frases como esta e suas mais criativas variantes não são raras nessas horas. Mas a psicóloga Mariana Matos adverte: honestidade é sempre a melhor opção, mesmo que ela não venha acompanhada de um desfecho positivo. “Colocando as coisas de forma sincera, você permite que o outro tome conhecimento de algo que também o diz respeito. Falar a verdade pode causar um sentimento ruim na hora, só que irá contribuir para a relação no futuro. A pessoa irá valorizar a honestidade com que tudo foi conduzido”, assegura ela.

Tempos modernos

O dilema pode ser antigo, no entanto, as soluções estão se tornando cada vez mais modernas. Um estudo divulgado recentemente pela pesquisadora australiana Dra Natalie Robinson, da Macquarie University, revelou que 15,8% dos jovens entrevistados já utilizaram mensagens SMS para terminar relacionamentos. Os tradicionais torpedos de celular se tornaram recursos poderosos para quem quer se esquivar dos momentos decisivos de um romance. “É inegável que os meios de comunicação influenciam. Nós não pegamos o início do telefone. Devia ser estranho tratar certos assuntos por ele quando surgiu e, atualmente, é algo bastante natural. É importante, porém, que estas tecnologias não sejam usadas como uma simples válvula de escape por medo de encarar a situação”, analisa a psicóloga Mariana Matos.

Existem diversas formas de expor a verdade a alguém. No momento de colocar o ponto final num romance, muitos sentimentos podem motivar uma ação impulsiva e você pode se arrepender por não ter tratado com mais carinho a situação. Vale a pena lembrar do famoso ensinamento expresso pelo francês Saint-Exupéry no clássico “O Pequeno Príncipe”: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.