O casamento de um homem de 65 anos com uma menina de 12 anos chamou atenção das pessoas que passavam pela Times Square, um dos pontos mais movimentados da cidade de Nova York, nos Estados Unidos. Muitos pararam para ver e algumas chegaram a se exaltar diante da cena. Mas, na verdade, o casamento era apenas uma encenação criada pelo “YouTuber” Coby Persin com o objetivo de conscientizar sobre o problema do casamento infantil, cujos números são alarmantes em todo o mundo.
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Vídeo de casamento infantil
O “YouTuber” atuou como o fotógrafo da falsa cerimônia e, com uma câmera oculta, captou as reações das pessoas, que ficaram incomodadas, irritadas, chocadas e indignadas. Alguns usaram adjetivos como “nojento”, “doente” e “pervertido” para xingar o noivo, mesmo após ele dizer que os pais da menina tinham autorizado a união, e um chegou a ameaçar chamar a polícia.
No final, o vídeo mostra algumas estatísticas: “Todos os dias, mais de 30 mil crianças se casam e têm sua infância roubada. Nenhuma criança deve passar por isso. Compartilhe e ajude a sensibilizar”.
Assista ao original com áudio em inglês:
Casamento infantil é legal?
De acordo com a definição da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CRC), o casamento infantil é uma união que envolve pelo menos uma das partes com menos de 18 anos. O ato é reconhecido internacionalmente como uma violação aos direitos humanos, embora aconteça com mais frequência do que se imagina.
Segundo o Centro Internacional de Pesquisas sobre Mulheres (Internacional Center for Research on Women – ICRW), no mundo todo, uma em cada nove meninas se casa antes dos 15 anos. E a estimativa é de que nos próximos 10 anos cerca de 150 milhões de meninas se casem antes dos 18 anos.
A prática é considerada legal em 91 países, como Afeganistão, Iêmen e Etiópia. No Brasil, no entanto, não é permitido, salvo algumas exceções.
Quando um menor pode se casar
O Código Civil brasileiro diz que a idade mínima para casar é 18 anos, quando a maioridade se completa. Mas aos 16 e 17 anos o casamento também é possível caso haja autorização dos pais. E, ainda, em idades inferiores, quando houver gravidez ou para evitar condenação por “estupro de vulnerável”. “Abaixo de 18 e até 16 são pessoas relativamente capazes, ou seja, podem ser emancipadas, podem votar. São consideradas tecnicamente menores de idade, mas sob determinadas circunstâncias, com a autorização dos pais, podem se casar. Abaixo dos 16 anos somente em casos de gravidez ou situações extremamente especiais. Porém todos os casos dependem de apreciação judicial. O juiz examinará os argumento de cada caso e poderá autorizar o casamento”, explica o advogado Luiz Fernando Gevaerd, especialista em Direito de Família.
Casamento infantil no Brasil
O Brasil é o quarto país do mundo com maior número absoluto de mulheres que se casaram antes dos 18 anos. Os dados são da pesquisa “Ela vai no meu barco” , realizada pelo instituto internacional Promundo, em parceria com a Plan International Brasil e a Universidade Federal do Pará, realizada entre 2013 e 2015. Em outros países da América Latina e Caribe, os níveis de ocorrência são maiores apenas na República Dominicana e Nicarágua
Os números do estudo estimam que o país tenha mais de 88 mil meninas e meninos entre 10 e 14 anos vivendo em uniõesconsensuais, tanto civis como religiosas. Além disso, 877 mil mulheres brasileiras com idades entre 20 e 24 anos se casaram até os 15 anos de idade. A maioria das uniões envolve homens adultos e meninas na fase da infância e adolescência, e os estados onde a prática mais acontece são Maranhão e Pará.
Por que isso acontece?
Ainda de acordo com a pesquisa, os principais fatores que levam ao casamento infantil são: o desejo de um membro da família em proteger a reputação da menina diante de uma gravidez indesejada; o desejo de controlar a sexualidade das meninas e limitar comportamentos associados à vida de solteira, como relações sexuais sem parceiros fixos; o desejo das meninas ou de seus familiares de terem segurança financeira; o desejo de sair da casa dos pais, com uma expectativa de liberdade; o desejo dos homens mais velhos de se casarem com meninas novas, consideradas mais atraentes e mais fáceis de controlar.
Riscos
A prática pode ter sérias consequências para os menores envolvidos, causando atrasos e desafios educacionais, limitações sociais, exposição à violência do parceiro e problemas de saúde ligados à gravidez precoce – além, é claro, de impactos psicológicos e físicos causados pelo desenvolvimento forçado e precoce da sexualidade da criança.