Loucas por beleza

por | jun 30, 2016 | Beleza

Beleza pode até não pôr mesa. Mas atrai olhares, provoca suspiros, arranca elogios. E quem é que não gosta dessas coisas? É uma atitude pra lá de natural: todo ser humano quer ressaltar aquilo que tem de mais bonito e melhorar aqueles detalhes que não estão lá essas coisas: pode ser o cabelo, um culote, a oleosidade da pele, uma unha quebradiça. Mesmo sabendo que, algumas vezes, a beleza exige sacrifícios. Cuidar da aparência é bom e até saudável. Inclusive, faz bem à auto-estima. Mas isso não quer dizer que a luta pela beleza deva se transformar em uma espécie de vale-tudo. Pelo menos não para aquelas que têm bom senso. Só que, quando o resultado parece compensar, convenhamos: quem é que se prende a um detalhe como o bom senso?

A estudante Maria Carolina Magalhães entende disso melhor que ninguém. Mesmo calçando 36, já comprou sapatos com numeração de 34 a 39. “Porque eram lindos de m-o-r-r-e-r e estavam na promoção!”, explica. Carol é daquelas que sabe de cor todas as utilidades possíveis para lama do Mar Morto. E quando termina um namoro, se interna no cabeleireiro: “Saio de lá me sentindo mais bonita, mais confiante”, afirma ela.

Mesmo assim, ela acha que não faz o suficiente para ficar bonita. “É que a mulher convive com muita competição: tem que ficar bonita para o homem, para ela mesma e para todas as outras mulheres! É bastante pressão!”, comenta. E quando alguém se aproxima com a ladainha de que vaidade é coisa para gente desocupada, ela rebate, dizendo que toda mulher deve buscar um equilíbrio: “Sabe o que é? Estou cansada do estereótipo da mulher inteligente: eu quero poder ler Foucault, mas também quero ter o direito de malhar para poder entrar numa calça da Gang!”, filosofa. Uma de suas máximas é: “Não há mal que uma tarde de shopping não cure”. Que ela leu na cancela de um shopping e nunca mais esqueceu.

Mas, convenhamos, algumas pessoas exageram. É o caso da vendedora Leila Viana, que tem 43 anos e nunca se conformou em ser branquela e ter cabelo escorrido. “Na adolescência, eu queria ser morena, ter cachinhos”, confessa. Para resolver aquele que considerava um “problema” de sua pele, Leila teve uma idéia: passar Coca-Cola no corpo enquanto se bronzeava. O refrigerante foi seu companheiro de praia durante alguns dias. Até que uma noite Leila foi parar na emergência do hospital, com bolhas de queimadura em todo o corpo. “As manchas demoraram muito a sair, quando saía na rua, eu escondia o rosto com o cabelo, sentia vergonha”, recorda. “Eu continuo querendo ser morena, mas agora tomo mais cuidado”, diz Leila.

Já para conseguir cachos, Leila não chegou a apelar para Coca-Cola. No entanto, seus cabelos não conseguiram se safar dos truques e das mandingas. Durante um bom tempo, sempre que lavava o cabelo, era batata: colocava bobes e esperava até secar. Ficava trancada todo esse tempo no banheiro, para ninguém descobrir seu ritual. Até que soube de uma simpatia. Bastaria pedir para alguém de cabelo cacheado cortar suas madeixas e seus problemas estariam resolvidos. Porque seu cabelo assumiria a textura das madeixas da pessoa que cortou. Leila não teve dúvidas: procurou uma amiga que tinha muitos cachos e nenhum conhecimento sobre como cortar cabelo. A amiga, a princípio, se recusou, só que o assédio de Leila foi incisivo. Um dia, apareceu na casa da amiga com a tesoura na mão e um ultimato: ou a amiga cortava o seu cabelo ou a amizade estaria ameaçada. Mesmo sem nunca ter dado uma cabeleireira antes, a amiga realizou o pedido. A amizade não mudou. E nem o cabelo escorrido de Leila.

Quem nunca fez e nem nunca sonhou fazer alguma loucura pela aparência que atire a primeira pedra. Mas, às vezes, algumas pessoas chegam a certos ridículos. Ana Maria Andreazza, consultora de moda, conta o caso de uma amiga que costuma esticar a pele do rosto com esparadrapos invisíveis antes de ir para festas. Depois, dá aquela jogada de cabelo por cima, para disfarçar. Numa espécie de plástica em minutos, só que caseira. E ela ainda acredita que ninguém vai perceber a mudança do seu rosto da piscina do clube, de manhã, para a festa, à noite.

A psicanalista Nadiá Paulo Ferreira ressalta que cada época tem o seu padrão de beleza. “O problema de hoje é que o padrão vigente é tão impositivo que não leva em conta as diferenças. Cada pessoa deve saber reconhecer os seus limites”, alerta a psicóloga, apontando ainda para o papel dos meios de comunicação. “Eles não são os culpados pela imposição do padrão, mas acabam ajudando a consolidar essa ditadura da imagem. Repare nos galãs de novela. Hoje em dia, todos eles têm um corpo bem torneado, um sorriso perfeito, uma pele impecável”, comenta Nadiá.

Vaidade é saudável, só que deve ter limites. Adepto das academias de ginástica, há quase 20 anos, Renato Braga Melo, gerente operacional de uma rede de lavanderias, também se recorda de algumas histórias bizarras. “Conheci uma menina muito bonita, todos na academia elogiavam. Mas ela ficou tão obcecada por atingir um corpo ideal que começou a tomar bomba, pegar pesado na musculação. Acabou ficando monstruosa”, conta ele.

Para Nadiá, essa atitude é comum em pessoas que não conseguem aceitar a idéia de que a vida não é feita só de prazeres. “Aí, a mulher passa a investir tudo numa imagem perfeita. Ela pensa que o corpo ideal vai anular os seus defeitos, funcionando como um passaporte para uma vida perfeita, sem sofrimentos, com todos os homens aos seus pés e a inveja de todas as outras mulheres”, diz a psicóloga. Todos sabemos que seres humanos sem defeitos não existem. Você pode até conhecer os seus e querer melhorá-los, no entanto, não há como extirpá-los completamente. Porque a Mulher Maravilha até existe. Mas só em gibi, filme ou desenho animado.