Depois de instituído o inverno como a temporada geral de chutação de balde da boa forma, a primavera constuma ser a estação de retomada da consciência física – devidamente auxiliada pelas denúncias impiedosas do espelho e pelas calças que não passam mais, nem pela coxa. Mas, tudo bem, a natureza é sábia: até a hora de abandonar de vez as mangas compridas e estarrecer o mundo de biquíni e bronzeado, ainda faltam misericordiosos e decisivos quatro meses. É nessa fase que os salões de malhação voltam a ficar apinhados de ratos pródigos de academia que, como bons filhos, à casa tornam e, até dezembro, pretendem estar com tudo no lugar outra vez. Só que, em meio a tanta movimentação e com o prazo apertado – apesar de possível – o que também não faltam são dúvidas e lendas sobre como atingir o resultado ideal, ganhando massa e perdendo gordura, em menos tempo.
Dúvidas, aliás, que surgem logo ao adentrar o ambiente maromba. De um lado, esteiras e bicicletas, do outro, anilhas e halteres: pra onde correr primeiro? Segundo o personal trainner Marcello Barbosa, da Downtown Fitness, no Rio de Janeiro, tudo depende do objetivo pretendido. “Se a pessoa está buscando hipertrofia, o exercício aeróbico, como bicicleta ou esteira, tem que ficar em segundo plano, principalmente se ela malha todos os dias. Nesse caso, o ideal é praticá-lo umas duas vezes por semana, para dar um bom descanso para a musculatura dos membros inferiores. Inclusive, se por exemplo você vai fazer um spinning antes da musculação, pode ocorrer um déficit de glicogênio grande, o que compromete a força muscular”, explica Marcello. Por isso, o roteiro recomendado é o da aeróbica depois da musculação, até para quem, além de ganhar massa, ainda está preocupado com algumas calorias extras. “Nesses casos, o melhor é fazer a aeróbica nos dias de musculação dos membros inferiores. E, depois, dar descanso absoluto para a região, de 48 horas no mínimo. Porque, apesar de uma corrida e uma série de força realizada em aparelhos serem estímulos diferentes, os dois mexem com a reserva energética do corpo, o que a gente chama de treinamento concorrente”, observa ele.
Quando o assunto é malhação, existe uma infinidade de variáveis que são determinantes para a programação das séries de exercícios. De cargas e repetições até respostas individuais e mesmo o feeling do professor, o resultado da boa forma é a combinação eficiente desses elementos. Um bom exemplo disso é o trabalho de pré-exaustão muscular, corriqueiro entre os marombeiros de carteirinha. “Empiricamente, tivemos bons resultados com algumas pessoas fazendo um número bem alto de repetições, que depois são diminuídas e têm a carga aumentada. O resultado é uma sensação de inchaço muscular porque, com esse trabalho, as células absorvem mais água, acontecendo a chamada hipertrofia metabólica”, explica Marcello, afirmando, entretanto, que esse crescimento, além de não ter garantias científicas, não representa aumento de força. Para isso, é preciso desenvolver a fibra muscular. “O que dá resultado nesse sentido é mesmo a hipertrofia mais comum, conquistada com séries de seis a doze repetições, sempre no limite da força do músculo”, orienta ele.
Outra medida fundamental está em respeitar o descanso da musculatura. Por isso, é tão importante alternar os grupamentos trabalhados no dia-a-dia da malhação. “Em treinamento de hipertrofia, com necessidade de resultados rápidos, o ideal é dar ênfase num grupamento em um dia e, em seguida, deixá-lo em descanso, partindo pra outro grupamento”, comenta Guilherme. Marcello Barbosa explica que é durante esse processo que ocorre o ganho de massa. “Qualquer ganho vem do repouso da musculatura, que também é imprescindível para manter a sobrecarga e não repetir uma série abaixo do nível inicial”, acrescenta ele, lembrando que fisiculturistas, que trabalham grupamentos com intensidades fortíssimas em um único dia, costumam precisar de uma semana de descanso da região treinada para atingir seus objetivos. “Mas é importante também lembrar que os músculos se adaptam às séries e que, por isso, é crucial trabalhar alterações nessas variáveis, tipo de estímulo, número de repetições, de dois em dois meses. Mexer com as ferramentas que se têm é muito valioso para o trabalho de hipertrofia”, lembra Guilherme.
Uma solução para garantir essa alternância é dividir o programa em A, B e C, um recurso que, embora mais utilizado por homens, também pode ser usado por mulheres. “No primeiro dia, o trabalho se concentra em costas e bíceps, no dia seguinte, peitoral e tríceps e, depois, membros inferiores e ombro. Com isso, o descanso é maior porque você só vai voltar a trabalhar aquela área três dias depois”, comenta Marcello. No entanto, essa orientação só é válida para quem malha, em média, seis vezes por semana. “Quem malha três vezes por semana, por exemplo, precisa de um programa mais amplo”, garante o personal.
Outro ponto controvertido é em relação aos exercícios conjugados, duas atividades diferentes, que normalmente se complementam, realizadas seguidamente, com o músculo exaurido e sem descanso. O gasto calórico é altíssimo mas, para quem busca hipertrofia, eles não costumam ser a melhor opção. “Você muda a forma de solicitação muscular e, com isso, acaba gastando mais tempo do que se não estivesse conjugando, com metade da eficiência”, explica Guilherme. Marcello prefere mesmo apostar no poder de emagrecimento do treinamento. “Esse tipo de série é melhor para queimar calorias ou mesmo para aumento de resistência, motivação. O primeiro exercício deve ter mais repetições para exaurir e o seguinte, com sobrecarga e pouca repetição”, diz ele. Respondidas as dúvidas, só resta agora partir para o ferro, segura de que a boa forma é só uma questão de suor e muita informação.