O perigo mora ao lado

A proximidade que caracteriza as relações familiares é, muitas vezes, um terreno fértil para que sentimentos de toda natureza se desenvolvam: amizades fortalecidas pelos laços de sangue, ódios que nem as gerações seguintes conseguem apagar e amores que teoricamente seriam impossíveis. Especificamente nesse campo sentimental, o que vem à mente é quase sempre o clássico namoro entre primos. Censurado por muitos, mas que no fim das contas acaba sendo digerido por todos. No entanto, pouco se fala e menos ainda se sabe sobre o polêmico amor entre cunhados – até mesmo por razões óbvias.

Ele era para ser visto como um irmão. Afinal, ele é de fato, do marido. Mas, algumas vezes, não é bem fraternidade que rola nessa intrincada relação entre cunhados, muito pelo contrário. Quem não se lembra do escândalo envolvendo aquele presidente colorido e sua cunhada, e no qual o irmão, supostamente traído, deflagrou um rumoroso processo de impeachment. Pois é, coisas assim acontecem nas melhores e também nas piores famílias, e mesmo sem ganhar tamanha proporção, as mágoas deixadas, com certeza, se equivalem.

A professora Alessandra Braga Cerqueira carrega em sua memória – já que fotos e cartões não comportam nessa situação – o arrependimento pelo envolvimento com o irmão de seu marido. Ela conta que os dois, desde que se conheceram, sempre se identificaram muito, e foi exatamente o ombro amigo que a levou para outras partes. “Eu estava me separando do meu então marido, e estava arrasada. Ele foi o único da família que realmente se preocupou com o meu estado, que prestou solidariedade e me deu apoio naquela fase difícil. Mas conforme o tempo ia passando, a amizade foi dando lugar a outros sentimentos: eu fragilizada e ele ali, disponível e atencioso. Tudo bem que eu era a mulher do irmão dele, mas também a mulher que havia sido trocada por outra”, conta Alessandra, comentado ainda que o romance durou cerca de dez anos e nunca foi assumido porque ele não teve coragem de arcar com a situação perante a família. “Ele acabou se envolvendo com outra e a nossa relação acabou. E me arrependo de mais uma vez ter investido em algo que não tinha futuro, já que ele sempre deixou isso claro”, lamenta.

A traição já é difícil, quando ela então acontece no contexto familiar é complicadíssima

Mas, em alguns casos, o sentimento que une é o de vingança, e o incauto cunhado acaba sendo visto apenas como uma arma, justo contra o seu próprio irmão. A arquiteta Simone Cardoso assume que deu em cima do irmão de seu ex-namorado motivada apenas pela vontade de feri-lo. “Achei que me vingar dele com o irmão seria mais doloroso e, de um jeito ou de outro, foi mesmo. Comecei a dar mole para o Guilherme e, numa festa, com ele já meio altinho, dei o bote: agarrei e fiquei com ele na frente de todo mundo. Na época, não pensei nas conseqüências, porque acabou ficando mal para ele e para mim também. Eu querendo agredir o babaca do meu ex, meti o irmão dele numa situação delicada que não era necessária ”, confessa Simone, contando que a polêmica ficada deu muita confusão. A mãe dos rapazes foi procurá-la e de um jeito nada amistoso pediu a ela para não semear discórdia na sua família, já que os irmãos sairam no tapa por sua causa. “Ela ainda fez questão de deixar claro que o relacionamento com qualquer um dos filhos, depois de tudo, não seria bem visto. Então, achei melhor tirar meu time de campo. Hoje, não falo mais com nenhum dos dois”, revela.

Para início de conversa, a psicóloga Vera Soumar alerta que a entrada de outra pessoa na relação caracteriza que está havendo espaço para isso. Mas se a pessoa em questão for justamente o cunhado, o problema é dobrado, ou triplicado, pois não se esqueçam da sogra.”A traição já é difícil, quando ela então acontece no contexto familiar é complicadíssima. A pessoa está mexendo com vínculos afetivos muito próximos, colocando toda uma família em conflito”, diz a psicóloga, comentando que a traição nesse caso é dupla. “Ele está sendo traído por quem supostamente nunca deveria fazer isso com ele, o próprio irmão, além da mulher. Portanto, a pessoa deve ter a devida dimensão do que pode acontecer e ter a certeza de que os sentimentos são verdadeiros. Mesmo que mais tarde o romance não dê certo, a relação desses irmãos é como um cristal, que depois de quebrado nunca voltará a ser igual, por mais que se tente colar”, adverte Vera.

Nem sempre o envolvimento surge a partir de um desentendimento. Muitas vezes é a amizade que desperta a admiração e faz com que os sentimentos sejam confundidos. “Conheci dois irmãos e os achei umas gracinhas. Mas logicamente comecei a namorar com apenas um, logo o que mexia menos comigo. Conforme fui me envolvendo com a família, ia ficando com mais tesão no meu cunhado. Morria de ciúmes das namoradas que ele arrumava e cheguei ao ponto de evitar meu namorado na sua frente”, conta a gerente de marketing Adriana Garcia. Só que com o passar do tempo, Adriana foi criando anticorpos contra o irmão do seu namorado e percebendo que aquilo não passava de uma fantasia.

Vera Soumar revela que isso é bastante comum de acontecer, pelo simples fato de se tentar procurar no irmão características que não são encontradas no parceiro. “Como ele é a figura mais próxima, mais parecida, a pessoa pode criar fantasias. Ou seja, ela começa a encontrar no cunhado características que gostaria que o parceiro tivesse”, diz Vera, afirmando que caso o affair seja mesmo pra valer, o único jeito é enfrentar a situação. “Por mais difícil que seja, a verdade é sempre a melhor saída, para que traíção fique apenas no campo físico e não também no moral”. E, não querendo jogar um balde de água fria no seu talvez-relacionamento, mas será que alguém merece uma sogra ao quadrado?