Finalmente consegui um tempo para visitar a primeira retrospectiva de pinturas de John William Waterhouse, inaugurada há duas semanas na Royal Academy. Estava antecipando uma viagem para um universo paralelo, onde femmes fatales, que parecem à primeira vista inofensivas, estão sempre à espreita de pobres heróis inocentes. Elas são uma verdadeira obsessão desse pintor. Ou melhor, “ela” é uma verdadeira obsessão desse pintor, pois apesar de várias de suas telas reunirem mulheres em grupos de sete (“Hylas & The Nymphs”, “The Danaides”, “Ulysses & The Sirens”), todas parecem modeladas a partir da mesma figura feminina.
Mas esse é justamente o maior problema da exposição. “Ela” (não sabemos exatamente o nome da modelo que Waterhouse usava, pois ele não deixou diários. Mas sabemos pelo menos que não era sua mulher) está em todo o canto: surgindo de um riacho para acordar um jovem que descansa numa clareira (“A Naiad”), como sereia penteando seus longos cabelos ruivos à beira do mar (“A Mermaid”) ou disfarçada de Isolda, dividindo a poção mágica com Tristão (Tristram & Isolde). O espectador começa seu tour intrigado com o ideal de beleza aparentemente tranquila representado por Waterhouse, mas acaba entediado com a mesmice das telas.
John William Waterhouse nasceu em 1849 e ingressou na Royal Academy em 1870. Lá ele treinou inicialmente como escultor, mas acabou mudando de direção artística e se tornou pintor
Enquanto é interessante o conceito de captar em suas personagens esse momento de calmaria, antes da tempestade de emoções, como se estas fossem mulheres à “beira da beira” de um ataque de nervos, o resultado nos parece artificial e excessivamente manipulador. Ou para parafrasear um dos críticos do trabalho de Waterhouse, D.S. MacColl, que disse na época da inauguração da tela “Circe Offering the Cup to Ulysses” (1891) o resultado é uma pintura “semi-realista e não convence nem como sonho, nem como expressão de realidade”.
John William Waterhouse nasceu em 1849 e ingressou na Royal Academy em 1870. Lá ele treinou inicialmente como escultor, mas acabou mudando de direção artística e se tornou pintor, vindo a expor sua obra pela primeira vez em 1874. Waterhouse desenvolveu muito da sua técnica imitando o trabalho de outros pintores contemporâneos, notadamente o Holandês Alma-Tadema, que pintava cenas da vida doméstica situadas numa Grécia antiga idealizada. Waterhouse começou por essa trilha, mas logo mudou de cenas do Egito/Grécia/Roma antiga para lendas medievais e personagens Shakespearianos que eram moda entre os pintores vitorianos da época.
Assim, Ofélia de Hamlet, Miranda de “A Tempestade” e Mariana de “Medida por Medida” dividem as paredes da exposição com figuras da mitologia grega, como a feiticeira “Circe” (A Odisséia), Ariadne, Medea. As telas de Waterhouse capturam essas mulheres com técnica e precisão inegáveis, por vezes até exagerada em detalhes como o caimento dos tecidos e as psicodélicas estampas dos vestidos, que parecem saídos da última coleção de Matthew Williamson. As vestimentas cheias de simbolismo parecem nos dizer mais sobre a personalidade de suas mulheres cruéis do que seus rostos pseudo-passivos. Nesse sentido, ele era, sim, um inovador.
Mais informações no site: http://www.royalacademy.org.uk/exhibitions/waterhouse/