A poluição já é uma das principais causas de morte em todo o planeta. O resultado da poluição do ar é responsável pelo óbito de 8 milhões de pessoas no mundo (4,3 mi em ambientes contaminados e 3,7 mi resultantes da contaminação atmosférica). Isso significa que já mata mais que acidentes de carro (1,25 milhão), que diabetes (1,6 milhão) e já está próxima aos índices de câncer (8,8 milhões).
Segundo relatório anual da Organização Mundial de Saúde (OMS), 92% da população mundial vivem em ambientes nos quais a qualidade do ar não cumpre as metas estabelecidas pela entidade. De acordo com a entidade, 3 bilhões de pessoas estão diariamente expostas a fontes de energia potencialmente intoxicante em suas próprias casas – caso de carvão, madeira e esterco.
O que a poluição faz no corpo
Não há parte do organismo humano que não seja impactado por níveis altos de poluição do ar. Afeta desde condições mais amplas de cognição até casos aplicados de câncer de pulmão. Compromete ainda, sistema vascular, coração e até reprodutividade.
Sistema respiratório
O sistema respiratório é o mais afetado pela alta da poluição atmosférica. O artigo “ Poluição do ar: um potencial fator de risco para o câncer de pulmão” [tradução livre], publicado na revista científica Nature Cancer Reviews afirma que “evidência epidemiológica que liga a poluição do ar à mortalidade por câncer de pulmão é robusta”.
Um dos autores do estudo é o médico patologista e professor da Universidade de São Paulo, Paulo Saldiva. Em entrevista à agência de fomento da ciência Fapesp, ele reafirmou a descoberta. “Chegamos à conclusão de que havia evidências muito sólidas da redução da expectativa de vida por doenças respiratórias e cardiovasculares induzidas pela poluição do ar e também que a exposição à poluição urbana é uma causa do câncer de pulmão”, disse.
Os dois principais vilões para o pulmão são os materiais particulados, MPs (elementos sólidos ou líquidos que compõem o ar que respiramos), e o dióxido de enxofre (produzido em massa nas fumaças dos veículos motorizados). A presença desses dois elementos aumenta a mortalidade diária de doenças respiratórias em 6%.
Estudos diversos relacionam a exposição a poluentes a alta prevalência de doenças respiratórias, caso da asma, da rinite e da bronquite. Os mais afetados são as crianças e os idosos – compõem 60% das mortes decorrentes de problemas respiratórios.
Sistema cardiovascular
O principal responsável pelos problemas cardíacos relacionados à poluição é o monóxido de carbono. Pesquisas que relacionaram a presença deste elemento a doenças do coração constataram que há uma relação entre sua quantidade e a ocorrência de angina de peito e infarto agudo do miocárdio.
Associado com MPs e dióxido de enxofre, constatou-se que em idosos, a presença dos componentes aumenta em até 4% a taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares. Foi identificada também maior índice de arritmias cardíacas, mesmo em regiões com padrões de qualidade do ar dentro das metas atuais.
“Alguns estudos mostraram que morar a menos de 300 metros de um parque reduz o risco de morte por infarto agudo do miocárdio em 30%. É mais do que a estatina [princípio ativo do medicamento usado para baixar a taxa de colesterol no sangue”, disse Dr. Paulo Saldiva à Fapesp.
Alterações de temperatura
A grande emissão de gases pelos carros e pela indústria impacta diretamente o microclima das cidades grandes – elevando as temperaturas urbanas. O estudo “ Risco de mortalidade atribuível à alta ou à baixa temperatura ambiente”, publicado na revista científica Lancet, examinou esta relação em 384 cidades.
O trabalho mostrou que nosso organismo é pouco eficiente, do ponto de vista fisiológico, para se adaptar a temperaturas mais altas do que a mais baixas. Cita que em São Paulo, onde a temperatura média é de 22ºC, o risco de morte por infarto aumenta 50% caso sua para mais de 30ºC.
O caso mais emblemático dos efeitos do aumento abrupto da temperatura ocorreu em Londres, em 1952. Uma intensa inversão térmica manteve uma grande quantidade de poluentes sob o céu da cidade. Ao longo de três dias, houve um aumento de 4 mil mortes em relação à média da capital inglesa.
Alterações na reprodução
O Dr. Paulo Saldiva relatou à Fapesp que a poluição muda até a razão entre os sexos: em lugares muito poluídos nascem mais fêmeas que machos. “Por causa da poluição há um desequilíbrio hormonal e possivelmente um efeito deletério sobre os cromossomos sexuais masculinos, com a sobrevivência preferencial do X e não do Y”, disse o especialista.
Em 1978, um episódio trouxe essa hipótese à tona. Houve um acidente com vazamento de policloreto de vinil na cidade italiana de Seveso. Após o evento, durante um período nasceram apenas meninas na região.
Situação do Brasil
Em relação à poluição relativa do ar e em mortes decorrentes da poluição, o Brasil está em condições melhores que a média do planeta. Ainda assim, as consequências são nocivas à sociedade.
No quesito poluição do ar, a concentração de partículas (MP2.5) em áreas urbanas (μg/m3) é de 11,3, enquanto a média mundial é de 38,4. O melhor índice nacional é da Suécia, de 5,9; o pior é da Arábia Saudita, de 127,1.
No que diz respeito a mortes relacionadas diretamente à poluição, o Brasil também apresenta uma das melhores taxas, em comparação com a média mundial. A média em todo o planeta é de 92,4 mortes a cada 100 habitantes em decorrência da poluição; no Brasil, 15,8 mortes. Novamente a Suécia é o país de melhor desempenho: morre 0,4 pessoa a cada 100 mil habitantes. O pior é a Coréia do Norte, com 238,4 mortes.
“A maior parte das cidades brasileiras são menos poluídas do que os municípios chineses e indianos, mas as autoridades do governo brasileiro não definiram ainda o que é preciso fazer para atingir os níveis mais baixos de poluição, que é o padrão ideal”, analisa Dr. Paulo Saldiva.
Levantamento feito por pesquisadores da USP para o Instituto Saúde e Cidadania, em 2015, afirma que dentro de 15 anos a poluição terá sido responsável pela morte de 250 mil pessoas em todo país, além de levar 1 milhão de brasileiros a internações. O custo financeiro estimado é de R$ 1,5 bilhão.
Em São Paulo
A capital paulista é a principal fonte de pesquisa para questões de poluição do ar, afinal é a cidade mais populosa do país – e a mais poluída também. Em São Paulo, estima-se que 4 mil pessoas todos os anos morram por causa da poluição do ar. É 25% dos casos de todo o país.
Os paulistanos têm o dobro de chances de ter infarto, 30% mais possibilidades de ter câncer de pulmão e 25% a mais de risco de abortos espontâneos. A população mais em risco na cidade são os profissionais do trânsito, como taxistas e motoristas.
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