Franquias: comércio em série

Se nos primórdios da civilização, a famosa ordem celestial “Crescei e multiplicai-vos” fosse aplicada para fins comerciais, a essa altura, as barraquinhas de quibe dominariam o mundo. E judeu nenhum teria passado 40 anos de fome no meio do deserto. Já pensou? Voltando à atualidade, parece que o conselho transcrito por Moisés foi finalmente ouvido no meio empreendedor. Cada vez mais empresas que se firmam seguem a filosofia bíblica, proporcionando meios para que outras pessoas adotem a marca e reproduzam o estabelecimento à sua imagem e semelhança. Graças a um método conhecido como franchising, que prega a constituição de uma rede padronizada a partir de um modelo de negócio tão formalizado quanto os dez mandamentos. Hoje em dia, se Maomé recusasse a subir até a montanha para conseguir um produto ou serviço, provavelmente contaria com uma franquia igualzinha bem perto dele.

Um é exemplo e dois, dez, cem são pouco para quem visa conquistar clientes pelo país e até mundo afora. Como ninguém é Deus para estar em todo o lugar, haja capacidade de gestão para administrar o imenso legado. Sem contar com o dinheiro que banque a instalação de toda a parafernália. Felizmente, as preces desses empreendedores foram ouvidas! A luz no fim do túnel foi o sistema de franchising, uma excelente alternativa de espalhar um negócio sem precisar ser onipresente e onipotente. “No contrato de franquia, o dono de determinada marca autoriza alguém a usá-la, o que remete à possibilidade do contratante aproveitar os aparatos físicos existentes e o modus operanti da empresa – ou seja, a maneira como conduzi-la”, explica o advogado de marcas e patentes Vicente Ramos.

Claro que o franqueador deve estar sempre atento ao discípulo. Em troca, o mestre recebe uma parcela do faturamento, chamada royalty, e outras vantagens: “Toda nova loja que abre traz novos contatos, idéias, consultores… A rede vai aumentado, é mais público, alcance e fidelização”, acrescenta o diretor executivo da rede de produtos naturais Mundo Verde, Jorge Eduardo Antunes, uma marca abençoada pelo milagre da multiplicação. A empresa começou tímida em Petrópolis, no Rio de Janeiro, e não pára de crescer. “Atualmente, existem 107 lojas em 11 estados do Brasil, em geral, controladas por clientes que se identificaram conosco e quiseram se unir a nós. Assim, eles escolhem o local e passam por um treinamento de três semanas em que é passada toda nossa filosofia de atendimento, marketing principal da empresa”, diz Jorge Eduardo, que visita estabelecimentos regularmente para fiscalizar se há manutenção dos padrões.

E não é só a obra verdadeira que ganha com o relacionamento. A possibilidade de entrar em um negócio já implantado e reconhecidamente de sucesso representa uma opção bastante viável para quem não quer pisar em ovos. “O franqueado se beneficia com o êxito e a confiança que a empresa conquistou. O acordo possui regras, só que tudo é resolvido com muito diálogo e jogo de cintura”, comenta Jorge Eduardo Antunes. Pois é, gerenciar o próprio negócio dá trabalho. “Ao franqueado cabe o custo fixo dos aparatos montados, o investimento pelo usufruto da marca e, principalmente, responsabilidade de gestão. Ele é obrigado a respeitar todo o know-how e normas de conduta de uma firma já existente, com pequenas variações. Afinal, é a reputação dela que está em jogo”, resume o advogado de marcas e patentes Vicente Ramos.

A psicanalista Tânia Veiga foi uma que aderiu à moda das franquias. Há dois anos, ela juntou dinheiro, disposição e dois sócios para montar uma réplica de um famoso bar e botequim português. “A vantagem da franquia é poder fazer parte de algo que já deu certo, que tem nome na praça, e um modelo de gestão. Você entra com o dinheiro e eles providenciam o pacote completo. Além disso, mostram caminhos, com um padrão de excelência pra copiar”, explica Tânia. No entanto, ela reconhece que a iniciativa só funciona para quem tem espírito empreendedor. “A prática exige dedicação, investimento financeiro e emocional. Não adianta só abrir e contar com a credibilidade da matriz”, afirma a psicanalista, alegando que ambas as partes possuem responsabilidades: “Como franqueada, eu tenho a obrigação de preservar a imagem do negócio, enquanto eles precisam ficar em cima para a qualidade não cair”.

De acordo com a voz da experiência, o futuro franqueado deve se enquadrar em algumas exigências. “Para a prática dar certo, o candidato precisa se identificar com a atividade. A sinergia com os produtos, valores e princípios, que ele vai viver, são imprescindíveis”, indica o diretor executivo do Mundo Verde, Jorge Eduardo Antunes. Para evitar fracassos e arrependimentos, ele também traça um perfil dos empresários em potencial: “Tem que gostar de lidar com o publico, dispor de tempo para ficar na loja, como todo comércio em geral. A flexibilidade também é importante, porque o franqueado vai estar sujeito a algumas regras, como a padronização. A pessoa tem que estar bem consciente disso”, aconselha ele.

Com o intuito de difundir a prática e amparar as partes envolvidas, surgiu a Associação Brasileira de Franchising – ABF. “A ABF orienta as ações necessárias para formatar o negócio, e também relaciona profissionais de consultoria em franchising que assessoram o processo”, define a própria entidade. Havendo interesse em montar sua franquia, ela é destino certo. Assim se fez a franquia, um conceito empresarial que conquista importância na economia nacional, gera empregos e ainda beneficia criador e criatura.