7h, acordar! Ginástica, banho, café, jornal, cachorro, filhos, trânsito, trabalho, almoço, mais trabalho, relatório, casa, marido, banho, jantar, louça, cama. Ufa! Seu dia mais parece um furacão, com minutos cronometrados para toda e qualquer tarefa? Prestes a entrar em colapso, não agüenta mais a pressão? Calma, você não é a única a correr atrás do tempo dia e noite. A pressa é o mal do século XXI, nos forçando a comer depressa, andar rápido e trabalhar em dobro. O mundo anda tão veloz que às vezes dá vontade de dar uma de louca e largar tudo inacabado. A velocidade nos tomou de assalto, levando embora saúde, paciência e finais de semana. Quem nunca se pegou adiantando trabalho em pleno domingo, já prevendo que cinco dias não seriam suficientes? Deixou de ir à reunião escolar dos filhos por estar presa no trabalho? Cancelou a viagem com o namorado para colocar a casa em ordem? Tudo errado, você sabe. Mas a solução continua sendo um mistério.
Foi a sensação de que o tempo estava passando rápido demais que fez com que o escocês Carl Honoré repensasse seu estilo de vida. Após passar anos correndo atrás do relógio, Honoré publicou o livro “Devagar” (Ed. Record), um verdadeiro tratado sobre o tempo e como lidar com ele. Em dez capítulos, que abordam do momento das refeições ao sexo – passando pelo tempo dedicado aos filhos –, Honoré mostra como fomos sugados pela pressa, sem perceber.
Mas não pense que tentar fazer o dia render é fácil. A pressa tem seu preço, e se manifesta através de úlceras, gastrites, alergias, acessos de fúria, acidentes de carro e até enfartes. Quem paga a conta? Nossa saúde. A psicóloga clínica Silvana Martani sabe bem como a pressa atrapalha. “Falta de tempo é a queixa de todo mundo. A necessidade de conseguir um padrão de vida um pouco melhor deu essa emendada nas tarefas diárias. Isso aconteceu nos últimos vinte anos. A acelerada não foi voluntária, mas circunstancial. Empenho foi traduzido em horas de trabalho, o que não é verdade. Sair tarde do trabalho era sinônimo de dedicação”, lamenta Silvana.
As conseqüências são perigosas. “A falta de qualidade de vida prejudica a pessoa física e emocionalmente. Ela perde o equilíbrio e o estresse é só um dos resultados. Acredito que o segredo esteja em encontrar um limite. Limite traz qualidade de vida. Assim você entende que pode fazer tudo o que precisa, dentro das condições possíveis. Acordou atrasado? Sente e tome o café. Já está atrasado mesmo! É a coisa mais normal do mundo”, afirma a psicóloga.
Os excessos de nosso tempo
As refeições são rápidas (os fast foods estão aí para provar), o sexo se resume às rapidinhas, a consulta médica tem hora marcada para terminar e vendemos nossas férias no trabalho. Tudo isso parece provar que tempo é dinheiro. Mas o que fazer quando a pressa nos obriga a desacelerar? Em 1990, Kamei Shuji, um jovem corretor que se orgulhava de trabalhar 90 horas por semana, morreu de ataque cardíaco. Tinha 26 anos e inaugurou o termo karoshi, criado para designar a morte por excesso de trabalho. Só no Japão, em 2001, foram 143 vítimas da doença do excesso de trabalho.
Mas não precisamos buscar exemplos do outro lado do mundo. Os excessos estão logo aí: a vizinha estressada, uma amiga nervosa, ou o marido preocupado. Rosângela Ramos é mais uma dividida dentre as muitas funções que as mulheres desempenham. Aos 35 anos, é casada, tem três filhos, e nem um minuto de descanso. O resultado? Estafa física e gastrite, diagnosticados pelo médico.
Das cinco da manhã, quando acorda, até a meia-noite, quando finalmente consegue dormir, ela não pára. Tudo para conciliar trabalho, estudos, filhos, marido e, agora, uma neta. “Tem dias em que me levanto muito cansada. Passo meia hora debaixo do chuveiro, tentando relaxar”, conta Rosângela, que tem uma rotina exaustiva. “De manhã preparo o café da manhã, coloco roupa na máquina, e deixo pronto o almoço das crianças. Saio de casa às 6h10min para chegar no trabalho às 7h30min”, conta. O trajeto, cronometrado, inclui dois ônibus e uma caminhada de meia hora.
Responsável pela limpeza em uma empresa carioca, Rosângela ainda encontra forças para, em pleno horário de almoço, fazer exercícios. “Corro na ciclovia do bairro. Preciso emagrecer”, comenta. Às 16 horas, quando sai do trabalho, o dia está longe de terminar. “Vou para casa fazer o jantar, lavar a louça e, às 19 horas, estudar”. Aluna empenhada, só sai do colégio duas horas mais tarde. Pensa que acabou? Nada disso! “Tiro uns vinte minutinhos para visitar minha neta, que mora com a filha mais velha”, conta. Antes de dormir, ainda encara a cozinha com o marido, que vende tortas. Descanso? O que é isso?
Cansou só de ler? Imagine como Rosângela não deve se sentir! “Quando finalmente deito, me sinto morta. Quero descansar, me dedicar mais aos filhos. Tem vezes em que dá vontade de largar tudo e ser só mãe. A sorte é que meu marido me ajuda: lava louça, roupa, faz faxina, tudo!”, diz. Quando sofreu de estafa, Rosângela achou que não fosse agüentar. “Me sentia muito mal, cansada só de andar. O médico me mandou descansar, mas aí eu me pergunto: como? Pra relaxar, preciso esquecer de tudo e de todos, e me dedicar a mim. Não tenho tido tempo nem para fazer a unha!”, desabafa Rosângela.
Para diminuir o ritmo, só mesmo contando com uma boa conta bancária… ou um marido abastado. É o caso da advogada Belita Calcado, que trabalhou durante doze anos no departamento jurídico de uma grande empresa. O processo de desaceleramento começou quando nasceu a primeira filha. “Tirei licença-maternidade, que acabei emendando com as férias acumuladas. Nisso, foram seis meses em casa. Depois, recebi licença sem vencimento, completando um ano em casa”, recorda Belita, que retornou ao batente, onde ficou por mais quatro anos. “Foi complicado. Meu marido trabalhava muito. Não podíamos cuidar de nossa filha, que ficava na creche. Meu trabalho era estressante demais, além de que o salário não compensava. Não tinha tempo pra nada. As audiências da empresa começavam às 7h30min. Um dia fui tirar a caneta do bolso do blazer e veio uma chupeta. Imagine! Depois de cinco ou seis audiências no mesmo dia, ia para a empresa. Almoçava o que desse, geralmente um sanduíche. Foi só meu marido começar a ganhar mais, que pedi para ser demitida. Estava exaurida”, recorda.
Hoje, Belita é mãe de duas meninas e se orgulha da dedicação que pode lhes dar. “Sou motorista particular. A função começa às seis horas, quando levo a primeira para o colégio, e inclui ballet, inglês, festas. Também posso ajudar com os estudos e passar mais tempo com elas”, diz. Além disso, faz o que toda mulher tem vontade de fazer, mas não tem tempo para realizar: “Inglês, informática, ginástica e, agora, francês”, enumera a advogada, satisfeita com a vida que leva. Sorte a sua, Belita! E se alguém disser que não gostaria de poder ir com mais calma, sem tantas preocupações na cabeça, pode ter certeza: inveja pura!