Grupo Corpo no Municipal

De 25 a 29 de agosto, o  Grupo Corpo, que conta com o apoio da Petrobras desde 2000, está de volta ao Rio de Janeiro com seu 35º espetáculo,  “Sem Mim”, que leva ao palco do  Theatro Municipal, as dores dos amores perdidos e a alegria dos resgatados a partir de sete cantigas medievais do poeta galego-português Martín Codax. Com coreografia de Rodrigo Pederneiras, cenografia e iluminação de Paulo Pederneiras e figurinos de Freusa Zechmeister, a apresentação da companhia mineira traz um balé fluido inspirado na beleza do mar da cidade de Vigo, na Galícia, onde as meninas do século XIII entoavam seus lamentos.

O consagrado compositor viguês Carlos Núñez, estudioso dos rastros da música medieval galega na tradição popular brasileira, e o paulista José Miguel Wisnik são os responsáveis pela trilha que remonta ao cancioneiro da Idade Média, cujas partituras, após décadas desaparecidas, foram encontradas em 1913 pelo livreiro espanhol Pedro Vindel e publicadas em tiragem de apenas dez exemplares no ano seguinte. As músicas ganharam vozes consagradas da MPB, como Milton Nascimento, Chico Buarque, Mônica Salmaso, Ná Ozzetti, Rita Ribeiro e Jussara Silveira. “As canções demoraram mais de um ano entre a criação, preparação, produção e gravação. Depois da trilha, o espetáculo levou mais quatro meses de trabalhos intensos”, lembra Pederneiras.

O vaivém das ondas do mar, alternando fúria e mansidão, chegadas e partidas, beleza e temor inspiram a coreografia. “A intenção foi dar vida aos lamentos femininos”, resume ele. O maior desafio durante a concepção de ” Sem Mim”, segundo o coreógrafo, foi o de transformar o repertório de Codax, que somava apenas 17 minutos, em um espetáculo de 47. “A ideia é fazer essa ponte entre o medieval e o contemporâneo. Às trilhas originais foram incorporadas diversas influências do nosso cancioneiro, como as vozes da música popular brasileira e instrumentos como a viola caipira e a percussão. A pegada popular do arranjo de José Miguel e Carlos Núñez foi o diferencial nesta releitura”, explica ele.

Raiz profunda na brasilidade

As canções tratam de amores perdidos: são naturais como um diálogo entre mãe e filha e atuais como uma conversa entre amigas sobre o último encontro e a perda do grande amor. O mar funciona como interlocutor. “Foi ele quem levou o amor embora e só ele poderia trazer de volta. É quem une e separa”, explica Pederneiras, que buscou um artifício para representar o mar sem se entregar ao habitual: “A movimentação se baseou nas ondulações do corpo de cada bailarino. Preferi não usar os braços para fugir do óbvio”.

O cenário contribui para reforçar o efeito. No decorrer do espetáculo, transforma-se continuamente em representações de paisagens e elementos distintos, como mar, montanhas, nuvens, barco, rede de pesca, alvorada. “É um recorte de paisagem que se move. Em determinado momento é um mar, em outro, é uma nuvem, ora é uma montanha. Todos nos baseamos no mar como inspiração e não somente em recriá-lo”, frisa.

A narrativa de Codax permite que Pederneiras faça uma divisão clara entre os papéis masculino e feminino no palco. “Os homens nunca estão presentes. Por isso, decidimos trabalhar em blocos que criassem uma grande separação entre eles e as mulheres. É neste vazio que surge o ‘sem mim’”, justifica.

O figurino ressalta os corpos desnudos com tatuagens. “São as chamadas segunda pele. Uma malha de tela muito fina no tom da pele, sobre as quais cada bailarino tem seu desenho próprio. Todos parecem estar nus com corpos repletos de tatuagens, um traço comum entre os navegadores na época”, conta o coreógrafo.

Depois da temporada carioca, o Grupo Corpo deixa o solo brasileiro para se apresentar nas cidades francesas de Lyon, Chamberry, Toulouse e Narbonne. Entre 10 e 13 de novembro, eles levam “Sem Mim” para Brasília.