BM Depois da separação você voltou para Porto Alegre?
JB– Voltei, com malas e bagagens, carro, tudo, periquito, papagaio.. No mesmo dia em que eu cheguei, eu liguei pra ela. Marcamos uma entrevista e eu comecei a trabalhar com ela. Trabalhei quase um ano como assistente dela, reformando coleções, ajudando nas coleções novas, comecei a fazer prova de roupas para ela, e comecei a fazer os desfiles para os clientes. Os clientes dela que compravam dela me chamavam para os seus desfiles, e aí eu não parei mais.
BM Como foi a tua ida para o exterior? Foi para trabalhar também?
JB– Não, nunca vou para fazer uma coisa, acontece uma história no meio do caminho. Aí fiquei quase um ano em Porto Alegre, e me chamaram para um desfile aqui no Rio, eu estava achando Porto Alegre meio pequeno para mim, já tinha trabalhado tudo para todos.
BM E os filhos, ficavam como?
JB– Sempre comigo. Eu vim pro Rio a trabalho, fui ficando, fui ficando, as crianças estavam de férias em Brasília com o pai, voltaram pro Rio e eu fiquei dois anos trabalhando por aqui. Aí um dia eu estava com um amigo modelo do Planeta dos Homens na época, e ele disse “Pô, porque você não vai trabalhar no Planeta, é o maior sucesso..” E eu: “Imagina”, não sei o quê.. Aí um dia eu disse: Quer saber? Eu vou lá falar com o diretor, o máximo que ele vai me dizer é não. Chovia cântaros, nossa, eu cheguei lá um pinto molhado. Sentei. “Tem hora marcada?” me perguntou a secretária. “Não, mas olha, eu queria falar com o Paulo Araújo”, que era o diretor. Aí depois de duas horas esperando, a secretária sem fazer o menor esforço para eu ser atendida, ele saiu da sala para entregar alguma coisa para ela e olhou assim “Você está me esperando?” “Estou”, eu disse. “Ah, vem cá”. Aí eu entrei, e ah, meu Deus, Deus existe. Aí ele falou “Você está recomendada por quem?” “Por um amigo, que trabalha no teu programa, que é modelo, e é gaúcho também, o Jaime Renato.” Ele falou: “Pô, pode vir semana que vem. A gente vai fazer três programas de experiência, se for legal eu contrato você por um ano.”
BM Era um programa de humor, né?
JB– É, e na época as modelos eram a Ísis (de Oliveira), a Rejane, a Marlene.
BM Você chegou a formar um grupinho, uma panelinha de modelos ?
JB– Carla, Marcela, Monique, todas elas. Aí eu entrei pro Planeta, gravei um programa e ele me contratou por dois anos. Fiquei dois anos trabalhando na Globo, foi ótimo, super legal, trabalhava uma vez por semana, ganhava a maior grana, viajava o Brasil inteiro, por causa das mulheres do Planeta, que eram famosérrimas, e eram chamadas a toda hora para shows, para abertura de eventos, não sei o que mais. Desfilei demais, fotografei, fiz comerciais, aí enchi o saco desse Rio de Janeiro.
BM Por que?
JB– Ah, viviam dizendo que eu estava namorando o fulano, o beltrano, que eu nem conhecia, que não era verdade. Eles queriam um símbolo sexual, entendeu? Eles estavam catando, na época era a Xuxa, Luíza, eu e tinha mais uma outra, a Márcia Porto. Tentaram fazer Xuxa com Pelé, Luíza com não sei quem, eu com o Júlio Iglesias.., sabe? E eu falei “Gente, pelo amor de Deus, me deixem! Eu posso ir 200 vezes nos shows dele, sento na mesa dele, que mandava cordéis de rosas brancas, só mandava rosas brancas, mas não quero que me associem, quer dizer, eu tenho filhos, ex-marido, que era fogo, que ficava no meu pé direto. Eu sempre estava namorando alguém que eu nem sabia quem era, sempre estava numa festa em Belo Horizonte quando eu estava em Porto Alegre, estava saindo num barco na Bahia com não sei quem, quando estava trabalhando em SP, era um rolo, sabe? Aí um dia, depois de dois anos, saiu uma matéria que eu tenho até hoje, na Última Hora, no Reinaldo Loyo que me adorava, graças a Deus, porque era um jornalista super que pegava no pé mesmo de todo mundo, não tinha nada de legal, todo mundo odiava ele, eu amava, e ele me adorava, então estava tudo bem. Aí saiu uma matéria assim: “Jane e seu harém”. E coincidentemente, alguns eu tinha namorado, outros estava em vias de, até um era mais ou menos namoradinho. Foram pro mesmo lugar, no mesmo dia e todo mundo se encontrou, entendeu? Foi uma confusão. Eu acordei, dois dias depois que saiu a matéria, fiquei lendo aquilo e disse: “gente, não é nada disso. Eu não sou nada disso, não estou ganhando nada pra isso, estão me fazendo uma coisa que eu não sou”. Aí eu liguei pro meu pai e disse “pai, o negócio é o seguinte, eu estou a fim de ir lá pro sítio”. Nós temos um sítio em São Sebastião do Caí, a uma hora de Porto Alegre. Aí meu pai falou: “Tudo bem, minha filha, se você quer passar um tempo lá..” Eu disse: “Não, eu vou morar lá”, “Você é louca, como é que você vai morar lá?” “Ah, dá uma garibada lá, manda arrumar um pouquinho, dá uma pintadinha que eu estou indo para lá semana que vem.
BM De mala e cuia?
JB– De mala e cuia, filho, periquito, papagaio, caminhão. Ah, sabe, se eu estivesse fazendo a metade daquilo, tudo bem, mas eu não estava fazendo nada daquilo, entendeu?
BM Essa coisa sempre cai para o lado pejorativo, tipo: sai com todos, não precisa dizer mais nada, subentende-se. É isso?
JB– Exatamente. Se eu não tivesse tido filhos.. Mas o meu ex-marido vivia no meu pé, vivia tentando tirar os meninos de mim. Já é um trabalho, sabe, se aparece uma foto na Playboy, por causa das Mulheres do Planeta.. Eu me perturbava tanto. “Não quero mais, vou morar no mato.” E fui. Os meninos tinham três, quatro anos de idade, não estavam nem no colégio. Fiquei no sítio três anos.
BM Deu uma pausa na vida, né?
JB– Olha, eu acho que eu fui sempre muito feliz na minha vida, em todas as épocas, mesmo com coisas ruins, eu fui muito feliz. Eu sempre aprendi muito, tive muita sorte de conhecer pessoas legais. Mesmo as pessoas que eu encontro até hoje, do meu primeiro casamento, e olha que isso é papo de 20 anos atrás, esse ano eu faria Bodas de Prata se eu ainda estivesse casada com ele. Imagina? Eu tenho cara de quem faz Bodas de Prata? Até hoje eu encontro pessoas daquela época, e me dou super bem , todo mundo faz a maior festa, porque eu acho que conquistei, tive sorte de conhecer coisas bem legais.
BM Você ficou fazendo o que no sítio?
JB– Ah, eu estava pensando em fazer outras coisas, “eu não quero mais ser modelo, eu não nasci pra isso”, eu estava pensando em voltar a estudar, fazer Direito, colocar os meninos no colégio lá, eu tinha 23 anos. Um nenê.
BM Saiu de lá com 25?
JB– Saí com 25 anos, eu fiz 25 anos em Paris. Só que eu não parei de trabalhar, porque todas as amizades que eu tinha feito aqui, todos os contatos, todo mundo me ligava para lá, me chamavam. Então eu vivia viajando, SP, RJ, Salvador, continuou tudo igual, só que eu fazia os trabalhos e voltava pra lá. E lá só saía assim: eu participando de baile beneficente no Clube Aliança, eu no Parque da Bergamota ajudando a montar a barraca do não sei o quê. Aí faziam milhões de matérias, o pessoal da Manchete, Veja, não sei mais o quê, todo mundo ia lá, e: “Oh, o que aconteceu, Jane Bezerra largou tudo?” E eu: “Larguei nada, gente, eu estou aqui, se alguém me chamar, eu vou.” E eu fiquei três anos trabalhando direto, fiz todo o Rio Grande do Sul, Rio, São Paulo, Minas, Bahia, viajei tudo direto”. Aí a minha mãe ficava com os meninos, os meninos iam de férias para Brasília. Foram os três anos mais saudáveis, fiz muitas entrevistas, sabe, o pessoal ia para lá, era difícil às vezes de chegar, porque tinha um pasto assim na frente, que quando chovia ninguém passava, só de barquinho, maior dificuldade. Aí quando chegavam lá “Pô, Jane, onde é que você foi parar!” E eu: “Pô, gente, olha o céu, olha as montanhas, vocês acham que eu preciso de mais alguma coisa?
BM Qual a maior diferença, na sua opinião, de quando você começou há vinte anos, e das meninas que estão iniciando a vida de modelo hoje?
JB– Eu acho que há vinte anos a gente tinha menos desilusões, até porque eu acho que a gente era mais protegida por pai e mãe. O conceito de família era um pouquinho mais complexo, sabe? Até porque a mulher não trabalhava tanto quanto o homem, o esteio que sempre foi a mãe dentro de casa. Mudou um pouco, a coisa ficou mais solta, mas aberta.
BM O que você acha dessa vida de modelo, você acha que é uma vida de ilusão?
JB– Não, eu acho que ela é super real, eu vivi disso 20 anos. Não tem nada de ilusão, eu trabalhei um monte, ralei um monte, não tem nada de glamour, nada de bonito.
BM O que você acha dessa nova geração de modelos, geração Gisele Bünchen? Porque os padrões mudaram, mas o conceito de beleza ficou…
JB– Eu acho tudo normal, cada época vai ser uma, cada uma tem uma cabeça, cada uma vai fazer a sua história, umas vão durar mais, outras vão durar menos. Não vejo nada de errado nas mudanças, acho que elas são naturais. Na minha época foi uma coisa: era eu, Sílvia, Monique, Marcela Polo, Carla Souza Lima, Vicky Schneider, Luma, Ísis, Xuxa, Luíza, mais novas um pouco.
BM Você mantém contato com elas?
JB– Às vezes, muito raramente encontro numa festa. Acho que tudo era mais glamuroso, mais voltado para a beleza feminina, agora acho que é uma coisa…não é que não seja feminina, mas agora é uma coisa meio etérea, não tem que ser tão bonita, tem que ser engraçada, interessante, sabe? Uma coisa meio diferente. Mas eu acho importante que haja mudança, não pode ficar a vida inteira uma só pessoa como sinônimo de beleza.