Original ou recauchutada?

Você já deve ter ouvido alguém dizer que hoje em dia só não fica bonita quem não quer ou não tem dinheiro. A afirmativa, em parte, é verdadeira. Em parte… porque o que é belo para um, muitas vezes não é para outro. E nessa onda de lipos, silicones e corpos malhados, a opinião dos homens ainda se divide na hora de desenhar o novo perfil da mulher bonita. Isso significa que depois de se submeter a uma recauchutagem geral, você poderia acabar frustrada por não ser assediada na primeira esquina. Afinal, quem garante que eles gostam de tocar um peito siliconado ou que os músculos que passaram a substituir as curvas realmente despertam a libido masculina?

Para o personal trainer Eduardo Torres, 26 anos, as cirurgias estéticas não passam de uma agressão – completamente desnecessária – ao organismo. “Qualquer pessoa pode conseguir excelentes mudanças através de exercícios físicos. O problema é que sempre prevalece a lei do menor esforço e há quem prefira pagar R$ 5 mil em uma lipoaspiração a pagar um personal trainer e se dedicar para alcançar um objetivo. Além disso, eu acho que as pessoas se preocupam demais com a aparência… a minha noiva, por exemplo, vive reclamando do peito dela. Diz que acha horrível e que está decidida em colocar silicone. A gente discute toda hora por causa disso, porque, em primeiro lugar, eu não vejo nada de errado com o peito dela e, em segundo, porque o que me interessa é o que está dentro da cabeça e do coração dela“, afirma.

A preocupação com a aparência, aliás, não é nenhuma novidade. Desde o início dos anos 80 o culto ao corpo cresce vertiginosamente e as facilidades que a medicina vêm proporcionando contribuem ainda mais para essa busca obsessiva pela perfeição. Mas tudo tem um limite. O gerente de vendas Júlio Guedes, 25 anos, garante que não tem nada contra as mulheres que modelam o próprio corpo, mas faz questão de lembrar que o exagero pode pôr tudo a perder. “Não há razão pra ficar reclamando da vida se a pessoa está insatisfeita com o próprio corpo e tem grana pra mudar o que incomoda. Eu, particularmente, adoro peito grande. A minha grande preocupação era se a mulher siliconada perdia a sensibilidade nos seios… até o dia em que tirei a prova. E a única diferença que vi é que o peito é mais duro, mais rígido, o que por sinal é muito interessante. O problema é quando se perde a noção do limite, em qualquer aspecto que seja. Aí fica artificial demais e a feminilidade vai embora. É o caso de mulheres musculosas demais que acabam ficando brutas…o que eu quero é uma mulher e não um Robocop”, exagera.

Mas as transformações não se resumem a cirurgias e implantes. Maquiagem, tinta para os cabelos e escovas para alisar as madeixas são apenas alguns artifícios do dia-a-dia feminino. “Eu não entendo o porquê da obsessão de boa parte das mulheres por mexer em tudo, da ponta da orelha à unha do pé. Cabelos pintados, escovados e com a presilha da moda, unhas multicoloridas, seios transformados em dirigíveis, plásticas por todos os lados, tamancos de meio metro de altura e cores berrantes, bronzeamento artificial, supermúsculos… É tão bonito você olhar para uma mulher com o cabelo natural que Deus lhe deu, corpo bem torneado sem excessos – e nem faltas, é claro! -, roupas discretas que as valorizem sem precisar vulgarizá-las. Por que essa mania?! Se eu quisesse uma criatura de beleza construída, iria a uma sex shop e compraria uma boneca inflável“, comenta o jornalista Guilherme Reis, 22 anos.

Talvez seja exatamente esse o caso da recém-eleita Miss Brasil 2001, a gaúcha Juliana Borges. Depois de passar por 19 cirurgias plásticas, a moçoila causou polêmica pela legitimidade de sua beleza. O advogado Rodrigo Cardoso, 27 anos, se diz indignado com o resultado do concurso. “Achei ridículo que ela se orgulhasse de tantas plásticas. Aquilo ali não é a mulher natural, ela foi remodelada para ganhar uma competição. Eu não tenho nada contra o implante de silicone, agora, queixinho assim, narizinho assado, toxina botulínica… tudo junto eu acho que descaracteriza a mulher e ela acaba se tornando um andróide. Mas infelizmente, nós estamos na era da mulher perfeita, onde a beleza conta mais do que a inteligência e as pessoas fazem de tudo para atingir essa pseudo-perfeição. Eu sou muito mais as mulheres naturais”, revela.

Segundo a avaliação do professor de educação física Alexandre Rodrigues, 34 anos, as intervenções foram tantas que a vencedora do concurso ficou parecendo uma boneca de cera. “Ela quase se transformou em um travesti. Tudo o que é muito artificial acaba ficando feio e eu, sinceramente, não gosto de mulher turbinada. O silicone, por exemplo, eu acho muito esquisito, porque é uma coisa que colocam dentro da mulher, é uma coisa absolutamente artificial. Já no caso de uma lipoaspiração, eu não vejo nada demais. O problema, na minha opinião, é colocar alguma coisa externa, artificial, dentro do próprio corpo. Além do mais, eu gosto de peito pequeno. O silicone me dá nervoso, eu não tenho tesão nenhum por aquilo… acho até que sou capaz de brochar diante de um”, admite.

Mas há quem goste. O cartunista Leandro Castello Branco, 20 anos, é um deles. Leandro acredita que as mulheres têm o direito de usar o que quiserem para satisfazer o desejo de se sentir bem com elas mesmas. “Próteses de silicones, ultra-malhações, medicamentos, simpatia e reza braba são apenas recursos que as mulheres usam pra conseguir o corpo dos seus sonhos… e dos sonhos dos outros também. Se as deixa felizes, cumprem sua função”, analisa. O publicitário David Epstein, 24 anos, concorda: ” Claro que mulher tem que ser turbinada, peituda, popozuda e glamurosa! “.

Já o comerciante Carlos Afonso, 45 anos, lembra que beleza não é tudo e que de nada adianta desfilar formas de deusa se o cérebro se mantém atrofiado. “Não tenho nada contra a construção da beleza. Pelo contrário, até acho que uma mulher que constrói a sua imagem deve ser bem interessante porque, provavelmente, tem a auto-estima elevada, se cuida, está sempre massageando o próprio ego… Mas eu acho que, acima de tudo, ela precisa de alguns pré-requisitos básicos como inteligência e bom-humor. Tendo esses pré-requisitos, a beleza só tem a somar. Agora, se a mulher for chata, burra e mau-humorada não adianta tentar se transformar achando que vai ser mais cobiçada ou mais atraente por isso, porque não vai”, sentencia.

Seja como for, o padrão de beleza vem se alterando de tal forma ao longo dos anos que até fica difícil definir o que seria a beleza natural de uma mulher. Durante o Renascimento, as “cheinhas” representavam o ideal estético da sociedade. Mais recentemente, o estereótipo de modelo-magrela foi sucesso nas capas de revistas. Já os seios fartos – que há 20 anos eram vistos como um problema – hoje se tornaram sonho de consumo de muitas mulheres. “Beleza natural é a da índia, com aquele peito muxibento, a barriga saliente e a bunda batendo quase no joelho. Isso é que é beleza natural. E eu sou incapaz de ter uma ereção olhando para uma beleza desse tipo”, radicaliza o publicitário Carlos Silveira, 59 anos. “Eu acho que a mulher tem que se cuidar, se arrumar para encontrar com o namorado, botar um perfume, pintar os cabelos… Aliás, acho que o homem também tem que se preocupar de igual maneira, vendo se as unhas estão bem cuidadas, se o cabelo está penteado, etc. Eu e minha mulher disfarçamos a necessidade de encarar as intervenções cirúrgicas fazendo ginástica – o que é muito bom para a nossa saúde – mas quando os exercícios físicos não derem mais resultado, tanto eu quanto ela vamos encarar uma lipoaspiração, ou o que for necessário, sem nenhum constrangimento. Desde que não comprometa nossa saúde, é claro”, complementa.

As mudanças conquistadas através de suor e persistência ainda são as que mais agradam à comunidade masculina. O webdesigner Brunno Gens, 24 anos, defende a idéia de que a “faca” deveria ser o último recurso. ” Existem muitas formas da mulher esculpir seu corpo: malhando, emagrecendo aos poucos… enfim, acho que nem sempre o que é mais fácil é melhor“, comenta. A verdade é que quem opta por esse caminho, leva como brinde uma vida mais saudável e garante uma beleza a longo prazo que nem todas as cirurgias são capazes de oferecer. “O corpo construído dentro de uma academia é completamente diferente, porque a beleza estética é uma conseqüência da busca por uma vida melhor. A pessoa que está malhando fortalece músculos, ossos e ainda conquista uma vida mais ativa”, acrescenta o personal Eduardo Torres.

Na base do bisturi ou da perseverança, satisfação ao ver a própria imagem refletida no espelho é o que todo mundo quer. O resultado final, além de bom para os olhos, ainda funciona como combustível para a auto-estima. Não adianta porém se transformar numa deusa de plástico e assustar os pobres “humanos” à sua volta. Afinal, beleza tem que ser um atrativo e não um repelente.