Antigamente, muito antigamente, a cozinha era um lugar esquisito. Relegada exclusiva e machistamente às serviçais ou às pobres esposas, era considerada uma área de serviço da casa, um ambiente desconfortável de trabalho duro e havia até quem mal passasse pela sua porta, mesmo dentro da própria casa. Mas, como foi dito, bota tempo nisso. Hoje, a cozinha é um lugar democrático onde a família inteira entra com o maior prazer. Inclusive a criançada que, desde cedo, gosta de meter literamente a mão na massa, transformando o lugar num playground verdadeiramente divertido, educativo e delicioso, em todos os sentidos.
João Pedro Corrêa tem oito anos e é um craque da pizza, um pizzaiolo, como ele gosta de encher a boca para dizer. A intimidade com a cozinha vem de muito pequeno, pelo gosto geral da família por colheres de pau, tabuleiros, farinhas e fogões. “A cozinha é o lugar da casa onde a família se encontra. A gente gosta de reunir os amigos lá, fazer festa. E tudo aquilo é mesmo muito atraente para uma criança, não deixa de ser um espaço de desenvolvimento da criatividade, da sociabilidade e da independência”, comenta a mãe de João, a maquiadora Maria Angélica. O rapazinho gosta tanto da brincadeira que comprou com a própria mesada um avental do Menino Maluquinho. “Veste até para fazer um sanduíche”, conta ela.
Valoriza a autonomia, o saber se virar sozinho no que diz respeito à alimentação, à sobrevivência.
Seu irmão, tio do menino, que mora com eles, é um dos maiores incentivadores do pequeno cozinheiro. “Eu também vivo na cozinha preparando coisas e ele sempre pede pra vir me ajudar. Já tem até os momentos que são dele, como quebrar ovo por exemplo, que ele acha uma coisa incrível. A sujeirada é inevitável, mas a diversão é tanta que nem aborrece. E faço questão absoluta de que ele participe também desse momento da limpeza e arrumação depois de tudo. Lavo a louça e ele seca. É ótimo, ele se sente muito atuante. E realmente ele tem algum talento pra coisa. Recheia a pizza na medida certa e seu miojo de microondas, que ele prepara com total autonomia, é imbatível”, garante o jornalista Pedro Vasco.
Essa é uma das muitas palavras-chaves da experiência infantil na cozinha: autonomia. A psicoterapeuta infantil Camila Doral endossa e valoriza a presença das crianças no lugar da casa onde a comida é preparada. “É um estímulo que, desde que devidamente supervisionado por um adulto em função dos riscos que o lugar oferece, como fogo e objetos cortantes, por exemplo, é extremamente positivo por diversas razões. Primeiro porque a criança se sente atuante no processo familiar e doméstico. Segundo, porque é um espaço que oferece diversas situações de desenvolvimento criativo e motor e terceiro porque valoriza a autonomia, o saber se virar sozinho no que diz respeito à alimentação, à sobrevivência”, diz ela.





