Sob o olhar masculino

Até no dicionário a beleza deixa margem para dúvidas. E se, para o Aurélio, ela é sinônimo de “coisa bela, muito agradável, ou muito gostosa”, para homens e mulheres sua definição vão muito além dessa espécie de análise combinatória. Aliás, de ciência exata, a beleza não tem nada. Pelo contrário, ela é quase a prova máxima de que tudo é relativo. E, ao contrário do que se pensa, num tempo em que a ditadura dos estereótipos estéticos parece ter chegado ao ápice, magras, gordas, fortes, fracas, originais ou turbinadas estão, surpreendentemente, como nunca dividindo a protagonização dos não menos diversos sonhos masculinos.

Alguns olhares masculinos sobre a beleza da mulher nos fazem acreditar que padrões só foram inventados para serem desobedecidos. É o caso do advogado Bernardo Cunha. Para ele, não há nada mais perfeito do que a própria imperfeição bem dosada. “A beleza da mulher perfeitinha é meramente plástica. Só é boa de olhar na TV, na revista, não para ter. Não tem atração, não tem calor, não tem sensualidade. Não parece verdadeiro”, diz. Bernardo acredita que a graça do corpo de uma mulher está numa cicatriz, numa gordurinha que trai a suposta exatidão das suas formas. “Gosto daquela batata da perna meio mole, boa de apertar. Mas, lógico, não pode exagerar nos defetinhos. Gosto de conhecer uma mulher em forma e ir descobrindo essas pequenas coisas aos poucos”, conta.

Outras vezes, a beleza feminina acaba servindo mais para alimentar a já pouco fértil imaginação dos rapazes. O produtor cultural Pedro Motta, por exemplo, louco por orientais, mal chegou perto de uma delas, mas ainda sonha – mesmo que só isso – com esse momento, principalmente quando vê televisão. “Aquela menina do Big Brother, a Sabrina, me deixa maluco, acho ela linda. Mas é um desejo que está só na minha cabeça, não sei por porquê não o coloco em prática. Nunca rolou de eu ficar com uma mulher desse tipo. Não sei nem como é beijar na boca de uma mulher dessas. Não saio por aí feito um andróide caçador de japonesas. Talvez porque esse tipo só me satisfaça na minha cabeça”, teoriza.

A maioria dos homens, entretanto, prefere ter visões mais abrangentes. É nessas horas que muitas mulheres se surpreendem. “Eu acho que bonita é a mulher que sabe se fazer assim. Por exemplo, acho ridículo uma mulher mais gordinha com roupa justa pra realçar os excessos. Mas uma gordinha bem tratada, principalmente aquelas mais taradinhas, não desprezo de jeito nenhum. Ainda mais porque elas são carinhosas, são gostosas de dar a pegada”, revela o administrador de empresas Luiz Felipe Gonçalo, sem medo de sofrer possíveis retaliações. “Quando saio e fico com uma mulher desse tipo, algumas amigas caem em cima. Não sei se é inveja, incompreensão, mas elas não aceitam que eu prefira uma gordinha a uma morenaça popozuda”, reclama ele.

“A maior exigência com relação à beleza feminina vem mesmo do próprio universo das mulheres”, afirma o psicoterapeuta corporal Dárcio Valente. Segundo ele, são elas que, se espelhando nas outras, ditam as mudanças dos padrões físicos, ainda que sempre sobre o crivo da preferência masculina. “As mulheres se arrumam para o olho feminino. Mas há um fator de ponderação que é o gosto dos homens. Uma mulher pode até achar outra linda, mas só se espelha nela se percebe que aquele tipo obtém sucesso no meio masculino”, acrescenta. Dárcio comenta que é dessa forma que surgem os padrões estéticos. Eles são válidos até o momento em que quebram a individualidade e, de tão comuns, se tornam banais.

Um bom exemplo disso são as loiras, que depois de anos garantindo o sustento dos fabricantes de descolorantes, parecem já não se abalar com novas raízes aparentes. “Se você me perguntasse o meu tipo de mulher há uns dez anos, eu ia te dizer que eram as loiras. Eu era tarado, só catava loira. Agora, não, perdeu a graça, acho que até vulgarizou. Hoje em dia, tenho até preconceito”, confessa o engenheiro Diego Santana. “Meu gosto mudou, prefiro uma morena, bem bronzeada com cabelo grande. Adoro cabelo comprido de mulher caindo na minha cara”, revela. O mesmo vale para os excessos. Bernardo Cunha, que se confessou fã de uma barriguinha, não descarta a importância de um corpo enxuto. Mas acusa a marombagem estar roubando a feminilidade das mulheres. “Não acho legal aquele tipo Feiticeira, com bração, pernão. Ela ficou com formas masculinas, sem suavidade. Não me atrai, acho feio até”, diz ele.

Dárcio Valente acredita que a mulher bonita é aquela que tem consciência de si mesma e não vê isso como um defeito. “A mulher que se aceita sabe valorizar o que tem de melhor e até converter os suas supostas imperfeições físicas em vantagens, em charme”, conclui ele. Parafraseando Vinícius de Morais, as feias que nos desculpem, mas auto-estima é fundamental.