Nobel de medicina sugere que comer de 3 em 3 horas NÃO ajuda em nada na dieta

Não faltam teorias no imenso leque de opções de dietas. Mas, uma delas tornou-se quase verdade absoluta de uns tempos pra cá: comer de três em três horas ajuda a emagrecer.

Vai dizer que você nunca adotou essa máxima para perder uns quilinhos? Há, inclusive, quem programe o despertador para conseguir se lembrar de que é hora de comer.

Apesar de o hábito ser firmemente defendido por nutricionistas ao redor de todo o mundo, há quem questione.

Yoshinori Ohsumi é biologista celular e Nobel de Medicina de 2016, além de ser pesquisador da Universidade de Tóquio. Este homem gerou um novo debate ao estudar detalhadamente um processo natural do nosso corpo e descobrir que precisamos fazer pausas longas entre uma refeição e outra.

Entenda o que a descoberta de Ohsumi muda na sua dieta.

Autofagia: o que é?

Há no corpo humano um mecanismo conhecido no campo da ciência como ‘autofagia’, que opera como se fosse um ‘controle de qualidade’ do nosso organismo. O tal processo permite a reciclagem de nossas células degradadas, eliminando proteínas e organelas (que ajudam as células a funcionar) para, depois, renová-las.

O termo autofagia vem do grego: significa ‘comer a si mesmo’ e já era conhecido na ciência desde os anos 1960. O objetivo de Ohsumi com o estudo era, portanto, descobrir como esse processo funcionava.

Para isso, ele separou as células em vacúolos – pequeno espaço cheio de líquido que pode ser detectado com um microscópio de luz branca – e realizou um processo em que deixou a célula ‘com fome’, de forma semelhante a como nosso organismo reage quando ficamos longos períodos sem comer.

Então, o pesquisador percebeu que a degradação das células gerava outra ação. “Após 30 minutos de fome, muitas vesículas apareceram e se acumularam no vacúolo”, explicou Ohsumi em entrevista ao Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos.

Este foi o ponto de partida para que Ohsumi repetisse, no início dos anos 1990, o processo com leveduras, que são fungos formados apenas com uma célula.

Ao perceber que o mesmo processo acontecia em uma única célula, descobriu que a autofagia realiza importantes funções fisiológicas.

Para a célula chegar à autofagia, precisa estar degradada. E essa degradação é estimulada por intervalos maiores de jejum.

Segundo Daniel Klionsky, outro estudioso da área da Universidade de Michigan, trata-se de “um mecanismo natural, regulado e destrutivo que as células têm para desmontar componentes desnecessários ou disfuncionais”.

O que essa descoberta muda na sua dieta

Rodrigo Polesso, especialista em nutrição otimizada pela Universidade Estadual de San Diego (EUA), explicou ao Vix que essas pesquisas reforçam a importância de que devemos adotar a autofagia como prática, ou seja, aceitar o fato de que nosso corpo precisa de mais tempo para processar o alimento. “Até poucas décadas atrás, a população costumava se alimentar 3 vezes ao dia: café, almoço e janta”, criticou.

“A autofagia acontece principalmente quando nosso corpo está em estado de jejum. Logo, podemos entender que os grandes benefícios desse mecanismo serão muito reduzidos e limitados caso estejamos nos alimentando continuamente, como de 2 em 2h ou 3 em 3h”, explica Polesso.

“Isso significa que o jejum é uma estratégia que permite que os benefícios da autofagia aconteçam da melhor forma possível”, completa.

Polesso alerta que temos que praticar mais o jejum intermitente, que pode acontecer de forma involuntária – por exemplo, do tempo em que comemos à noite, descansamos a refeição, vamos dormir, acordamos e nos preparamos para tomar café. “Isso propicia jejum automático de pelo menos 12h, ao menos uma vez ao dia”, conclui.

Comer de 3 em 3 horas: por que essa pode não ser uma boa ideia?

Há tempos a teoria de que devemos comer de instante em instante é contestada. Em 1997, um estudo francês publicado no Instituto Nacional de Saúde dos EUA chegou à conclusão que comer frequentemente não favorecia o metabolismo, muito menos o emagrecimento.

“Não existe nenhuma evidência de que a perda de peso em uma dieta hipocalórica seja alterada devido à frequência das refeições”, escreveram os pesquisadores.

Mesmo quando se observou com mais cuidado a relação de comer periodicamente com emagrecimento, a conclusão não foi muito diferente. Pesquisadores australianos publicaram em 2009 uma nova revisão desses conceitos, apontando que, em vez de perder peso, comer de 3 em 3h poderia provocar justamente o contrário: “As limitadas evidências disponíveis sugerem que não existe nenhuma associação entre a frequência das refeições e o peso ou saúde, tanto em relação ao emagrecimento quanto à manutenção de peso, ainda com uma possível associação inversa entre frequência e gordura”.

“Hoje, as pessoas comem bem mais, seguindo em média 5 refeições ao dia, e estão mais gordas e doentes do que nunca”, diz Polesso. Só nos últimos 30 anos o índice de obesidade dobrou no mundo todo, segundo levantamento da publicação especializada em medicina The Lancet.

Autofagia contra doenças

Além de apresentar benefícios para a dieta, a autofagia também oferece diversos ganhos para a saúde. O estudo de Ohsumi mostrou como esse processo pode combater os malefícios do envelhecimento e ainda ajudar na cura do mal de Parkinson e diabetes tipo 2.

“Autofagia pode rapidamente fornecer combustível para energia e renovação de componentes celulares, sendo, portanto, essencial para resposta à fome e outros tipos de estresse”, explica a comitiva de médicos que integrou o Nobel.

O mecanismo também atua para eliminar bactérias intracelulares e diversos tipos de vírus do nosso organismo.

Polêmicas e benefícios do jejum