Enfim, só

Morar sozinho não tem preço, é bom demais, uma Brastemp, melhor do que ganhar aposta, melhor até do que massagem no pé. Sinônimo de independência e da passagem para o mundo adulto, sair da casa dos pais e ser dono do próprio nariz é realmente uma experiência e tanto. O que muita gente não sabe é que ter seu próprio lar é doce, mas não é mole, não: dá uma trabalheira danada. Por isso, não fique você pensando que morar sozinho é só oba-oba ou, como diria o orkut, party every night. Morar sozinho demanda grana e, mais do que isso, responsabilidades redobradas. Até aprender a acender o fogão, lavar a roupa, decorar o dia de pagar as contas, iiiih, vai ter muito abacaxi para você descascar – e, junto com ele, um enorme e enriquecedor amadurecimento pessoal. O Bolsa conversou com algumas pessoas que passaram por essa experiência e contaram pra gente qual foi sua maior descoberta na hora de deixar a casa dos pais e montar acampamento na sua própria casa.

Um dos fatores que mais pesam no momento de morar sozinho é a grana: não é baratinho, pelo contrário, tem muita conta pra pagar. O economista Felipe Machado, de 27 anos, conta como foram os primeiros meses no seu próprio lar, doce lar – nem tão doce assim. “Com o dinheiro apertado, fui morar num cubículo, eram 25 apartamentos por andar! Deitado na cama, eu abria os braços e tocava na pia da cozinha! Não tinha grana e muitas vezes tinha que jantar biscoito de chocolate. Acordava com barulho e sol na cara… Mas mesmo assim, foi um período muito feliz da minha vida: eu não devia satisfação a ninguém, não era obrigado a falar com ninguém e a sensação de liberdade é impagável”, lembra o economista, que preferia enfrentar a pindaíba a viver no conforto da casa dos pais, com TV a cabo e ar-condicionado ligado toda noite. “Eu não tinha espaço na casa dos meus pais, queria liberdade e fui atrás dela. Para se ter uma idéia do que ir morar sozinho significou pra mim, foi lá no cubículo que dei uma guinada profissional, revi meus valores e meus objetivos”, afirma Felipe, defendendo a experiência como algo fundamental na vida de todos nós. “Mulher tem isso de só sair da casa dos pais pra se casar. Isso tá errado! Os casamentos dariam mais certo se as meninas já morassem sozinhas antes do altar. O maior aprendizado é saber se virar sozinho e se sentir bem consigo mesmo”, teoriza.

O maior obstáculo ao morar sozinha pode ser a quantidade de pepinos na cozinha, na área de serviço. Adeus casa arrumada, comida da mamãe e roupa lavada. Se você não lavar, minha amiga, vai ficar suja. Que o diga a produtora Roseane Leal, que passou maus bocados até ficar em paz com sua própria casinha. “Minha maior descoberta ao morar sozinha foi perceber que a casa precisa de uma rotina pra funcionar. Alguém tem que lavar a louça, alguém tem que trocar o papel higiênico e esse alguém sou eu! Senão ninguém faz!”, conclui Roseane, confessando que gosta de certas tarefas domésticas e não suporta outras. “Amo colocar roupa na máquina de lavar, mas detesto tirar e estender no varal. Então, às vezes eu botava a roupa e, quando a máquina parava, ficava horas pensando: ai, que droga, agora tenho que estender. E ia deixando, deixando.. Até que percebi que se deixar muito tempo a roupa fede e aí tem que lavar de novo. Ou seja: não adianta protelar, tem que ir lá estender. E pior: quando estiver seca, tem dobrar e passar”, exemplifica a produtora, que vira-e-mexe sai de casa vestindo uma roupa direto da boca do leão.

A administradora Tatiana C. foi morar sozinha quando ainda era muito nova e aprendeu muita coisa desde então. “Acho que existem duas situações diferentes quando uma adolescente vai morar sozinha: uma, quando ela tem que se bancar, trabalhar para se manter, fazer tudo na casa etc, e outra, quando o pai ainda subsidia. No meu caso, eu recebia mesada para complementar meu salário e pagava uma empregada duas vezes na semana para arrumar a casa, lavar a roupa, passar, fazer comida”, explica Tatiana que não se considerava ainda uma dona de casa, mesmo tendo suas preocupações como pagar as contas e fazer mercado. Tudo mudou quando ela foi morar fora do país e teve que se virar para dar conta de todos os afazeres do lar. “Não sabia nem fazer arroz! Aprendi a cozinhar, passar roupa, lavar… E vi que é tudo muito fácil e até relaxante…”, conta a administradora, garantindo que a sensação de liberdade é incrível. “Antes eu era dependente da empregada, mesmo não gostando muito dela, vendo que ela não limpava a casa direito, eu ficava com ela. Hoje em dia, eu nunca continuaria com a empregada”, diz. Para Tati, a maior dificuldade de deixar o endereço dos pais não é comandar uma casa e sim estar sozinha o tempo todo. “Eu tive que aprender a tomar decisões sozinha, aprender a lidar comigo mesma e ser responsável. Difícil é chegar em casa e ter que se encarar, não ter com quem dividir as coisas e trocar idéias”, revela.

Segundo a terapeuta Patrícia Madruga, morar sozinho ou morar em outro país é uma experiência muito válida para o amadurecimento de cada um. “O mais importante é a autonomia, a pessoa que mora sozinha tem uma liberdade e um amadurecimento que dificilmente teria dentro da casa dos pais”, afirma ela, sem omitir que também há uma lado ruim dessa história. “A grana diminui, tem o cansaço por fazer as tarefas de casa e às vezes bate a solidão. Você sabe que se deixar o chinelo no meio da sala, ninguém vai tirar. Quando estiver sentindo falta de companhia, uma opção é fazer uma visita à casa dos pais, ou então chamar os amigos para uma reuniãozinha”, dá a dica, ressaltando que nessa hora a gente valoriza ainda mais a família, a nossa mamãezinha querida que sempre fez tudo pra gente. “Com o distanciamento, a relação com os pais muda – e pra melhor”, afirma. Sobre o aspecto financeiro, Patrícia afirma que o jovem já vai morar sozinho com a mentalidade feita e grana no bolso para não passar susto. “Hoje, as pessoas até demoram mais do que poderiam para sair de casa. Acontece de esquecer de pagar a conta, mas isso faz parte do processo”, finaliza.