Roubar a idéia de um colega, aceitar presentes em troca de favores, sonegar informações importantes para a empresa, correr atrás de seus objetivos sem respeitar as pessoas, fazer caixa dois, usar softwares piratas. Esses simples exemplos do cotidiano empresarial são encarados, muitas vezes, como naturais. No entanto, representam condutas de falta de ética. E hoje, mais do que nunca, é importante estar atento a esses pequenos deslizes para que a sua imagem não fique manchada no mercado. Ser ético é muito mais do que ser honesto. Valores como transparência, companheirismo e respeito, fazem parte de uma conduta ética empresarial que precisa ser vivida, não apenas com seus colegas de trabalho, mas com fornecedores, clientes, meio ambiente, comunidade, acionistas e principalmente, com você.
Existe um conceito sobre ética que é calcado na filosofia, mais precisamente em Aristóteles, o primeiro filósofo a falar sobre o tema. A consultora de empresas Suely Pavan explica a teoria desse precursor. “Ética, conceitualmente, significa uma reflexão sobre a moral existente, visando o bem-estar e a felicidade de todos. O bem segundo ele, é uma virtude. Para um indivíduo viver melhor, é impossível faze-lo sem que todos ao seu redor também estejam”, explica. Portanto, para Suely, a ética pressupõe um respeito pelo ser humano, por suas diferenças, sem que jamais ocorram desigualdades. Parece simples, porém na prática não é, já que para exercê-la é necessário discussão, clareamento de idéias e conceitos e, principalmente, compromisso.
Conceituar é fácil e muita gente já escreveu livros e mais livros sobre ética. O mais difícil é colocar em prática todos esses conceitos. O professor da USP Carlos Goldenberg faz muitas palestras sobre o tema, pois é necessário que a ética seja sempre discutida, para garantir a sobrevivência das empresas. Ele explica o que é ser ético com uma metáfora bastante esclarecedora, que divide os profissionais do mundo empresarial em dois tipos antagônicos: o mosca e o abelha. O primeiro, apesar de “tecnicamente evoluído”, leva a caca de um lugar para o outro, quase sempre dando a sua contribuição pessoal. Também, com o seu veneno natural, é capaz de comprometer e adoecer uma estrutura maior e muito mais evoluída que a sua própria. Como se não bastasse, não existe coletivo de moscas. Elas se juntam somente para se alimentarem dos restos. Por outro lado, o abelha, sempre promove uma transformação no seu dia-a-dia, colhendo o pólen e entregando o mel. Sabe também que a gotinha de mel produzida, não será capaz de alimentar ninguém, o que nos leva à principal característica desse tipo de profissional: ele precisa e sabe viver em comunidade, a colmeia-empresa. Assim como observamos na própria natureza, e apesar de haver muito mel em uma colmeia, onde há abelhas, não há moscas. “Ou seja, em um ambiente eticamente constituído, haverá pouca ocorrência de profissionais não éticos. Lembro que um professor pode ensinar a ética, mas não consegue ensinar ninguém a ser ético”, conclui Carlos.
O ideal seria que todas as empresas tivessem seu Código de Ética claro para seus funcionários, o que no Brasil ainda é um privilégio das grandes ou das multinacionais. Fernando Braga é CEO e tem o privilégio de administrar calcado num código transparente, elaborado em conjunto com a matriz americana e tropicalizado para a nossa sociedade. “Aqui na empresa é um documento onde missão, visão, valores e condutas são detalhados. Ele é distribuído a todo funcionário que entra e tem que assinar uma página destacável após a leitura. Parece um caderninho de umas 20 a 30 páginas”, esclarece. Mas ele garante que esse é um tema que precisa ser reforçado sempre, afinal, nem todo mundo lê os manuais e bulas da vida. Quem o infringe normalmente é advertido ou punido dependendo da infração. E Fernando realmente fica de olho nisso. “Sempre tive um comportamento ético, por isso cheguei onde estou. Sou meio xiita com conduta, em todos os campos”, assegura. Para ele, falta respeito interpessoal na sua equipe, o que também é falta de ética.
Essa falta é comum no dia-a-dia. São exemplos banais de atitudes cometidas quase diariamente: avançar sinais, parar na faixa de pedestre, mentirinhas para justificar faltas no trabalho, colar em provas e por aí vai. E por ser tão corriqueiro, empresas pequenas também sofrem com esse mal. Afinal, não podemos esquecer que por trás da pessoa jurídica, sempre há uma física com conceitos e valores formados, ou melhor, deformados. “Conheço meu ex-sócio há 10 anos e sempre fomos muito amigos. Ele é engenheiro eletricista e estava parado. Dei 50% da minha empresa de alpinismo industrial para ele cuidar da parte de instalação de pára-raios. No final do ano passado, ele quis mudar o nosso escritório para junto da empresa do pai, alegando redução de custos, e meses depois largou a sociedade. Ele simplesmente ligou para todos os meus clientes falando que minha empresa estava falida e que ele iria cuidar de tudo. Inclusive colocou anúncio da minha empresa com o telefone dele”, conta Marco Vidon, que ficou superchocado com a traição e garante que precisou de muita paciência e tempo para esclarecer toda a história e manter sua imagem limpa no mercado.
Acima dos valores de uma empresa estão as regras de uma sociedade. “Um profissional ético é aquele que tem responsabilidade social e se conforma com a moral dominante. Esse sujeito não vai trabalhar em uma empresa eticamente incorreta, como também vai contrapô-la, pois ele tem uma perspectiva altruísta e sempre pensa nos interesses coletivos”, afirma o professor da USP Robert Henry Srour, autor do livro Ética Empresarial. Ele ensina que para ser um profissional e um cidadão com condutas corretas é necessário ter a percepção dos outros e saber que cada ação gera uma reação. Portanto, é preciso fazer questionamentos do tipo: a quem beneficio ou prejudico com minhas ações? Estou sendo leal a quem? E a resposta correta deve ser sempre a maioria. “A sociedade é maior que a empresa. Defender e trabalhar num lugar que contamina quimicamente o meio ambiente, mas que não quer gastar com estações de tratamento, preferindo contaminar várias pessoas, não é ético”, orienta.
Como já diz o ditado: se conselho fosse bom, era vendido e não dado, mas umas dicas são sempre bem-vindas se a intenção é ajudar o progresso profissional das pessoas. Carlos Goldenberg faz três recomendações. “A primeira é que procurem se aperfeiçoar constantemente sobre o tema. A segunda é identificar o perfil ético das empresas em que pretendem trabalhar. Uma boa escolha inicial quase sempre dará ao profissional condições fantásticas de evolução pessoal e social. A terceira, para aqueles que já estão trabalhando, não tentem modificar sozinhos qualquer aberração do ponto de vista da ética empresarial. Quase sempre é uma atitude estéril e, em muitos casos, suicida”, aconselha.
Como a disputa por vagas está cada vez mais acirrada, as atitudes para conseguí-las nem sempre são confiáveis. Por isso, cada vez mais, os critérios de seleção estão apurados. “Costumamos fazer entrevistas e temos grande interesse em saber como as pessoas conquistaram suas posições, de que forma chegaram lá, quais as atitudes que utilizaram para se destacar e, dessa forma, conseguimos perceber a índole, o caráter e os valores de cada um. Além de checar as referências nas empresas antigas, junto aos chefes e colegas”, explica Sílvio Camba, diretor da empresa de consultoria e recolocação Contacto. Ele garante que o mercado está mais atento a isso em todos os setores, pois a cada dia surgem CPIs pelo Brasil, onde a ética está sempre em voga.
É difícil falar de ética, porque são crenças, valores e normas basicamente ideológicas. “Com toda a sinceridade, creio que é muito difícil ser ético em qualquer país do mundo. Na essência, a ética é uma sofisticação intelectual e, convenhamos, o mundo de hoje ainda está muito longe disso”, declara o prof. Carlos. Não existe uma receita universal, há muitas culturas espalhadas pelo mundo. É apenas uma questão de escolher que caminho seguir com a consciência tranqüila de que não se estar fazendo mal a ninguém.