Maior entreposto de alimentos da América Latina recupera por mês 150 toneladas de comida que iria para o lixo

O Banco de Alimentos da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, a Ceagesp, é como se fosse uma “segunda chance” àqueles alimentos que seriam jogados fora por não serem comercializados. Com as doações dos produtores e feirantes, o Banco separa “o joio do trigo” – e destina 150 toneladas por mês do que ainda é consumível a 200 entidades assistenciais cadastradas, que alimentam, por sua vez, 100 mil pessoas (sendo 3 refeições no dia) na Grande São Paulo.

“É considerado lixo o que estragou, caiu no chão, foi contaminado pela água da chuva, de enchente ou queimou no sol”, detalha o coordenador de Sustentabilidade da Ceagesp, Jae Young Ahn.

O que já chega ao Banco nestas condições se torna adubo orgânico por meio de compostagem realizada por empresa terceirizada. A Ceagesp promove ainda a reciclagem do material de embrulho e transporte dos alimentos, como palha, madeira, ferro e papelão.

Triagem dos alimentos

“No Banco de Alimentos, fazemos a triagem dos alimentos que vêm em caixas. Como dizemos, é para separar o que é bom do que é ruim, porque sempre tem uma maçã podre”.

Mesmo com esta destinação oficial, muita comida que seria desperdiçada acaba sendo recolhida por pessoas comuns, que circulam pelo espaço à procura de sobras e doações diretas dos comerciantes.

O coordenador de Sustentabilidade comenta que esta prática acontece “não só na Ceagesp, mas em portas de restaurante, feira livre e supermercados”. “É o retrato de desemprego do Brasil”, definiu, em entrevista ao Vix.

A recomendação aos produtores e atacadistas permissionários da empresa, porém, é que e a contribuição seja feita diretamente para o Banco de Alimentos.

Por que não é vendido? 

De acordo com o coordenador de Sustentabilidade, esse processo de aproveitamento dos produtos está relacionado ao período de maturação das frutas, legumes e verduras. Só entram nesse esquema os alimentos que não aguentariam muito mais tempo na área de comercialização.

Acompanhe o exemplo dos “5 dias do mamão”, com explicações de Jae:

Por onde essa fruta andou 

Quando a mercadoria é importada, a viagem até a Ceagesp é ainda mais demorada, por conta das dificuldades de logística e integração do sistema de transporte brasileiro. O exemplo a seguir, apesar de pontual, como nos explicou Jae, mostra outra etapa em que acontece desperdício.

“De 800 caixas de mexerica que chegaram da Espanha pelo Porto de Santos, litoral de São Paulo, só 500 foram aproveitadas para a venda, por problemas de liberação da carga. Então, o importador preferiu destinar para doação ao Banco de Alimentos. Apesar de não sabermos onde ocorreu o atraso, sabemos que o container desce em Santos, vai para o caminhão, que precisa subir a serra e, se necessário, passar por rodízio”, explica. “Tudo isso porque não temos rodovias que suportem caminhões de carga alta e ferrovias para escoar a mercadoria diretamente”.

“Cerca de 70% da mercadoria da Ceagesp vêm por transporte rodoviário. Nós somos o terceiro maior mercado, atrás de Paris e Estados Unidos. Mas, não temos interligação dos meios de transporte”.

Atrasos no desembarque no navio e na liberação da mercadoria, paralisação de caminhoneiros nas rodovias de acesso, entre outros fatores, podem complicar ainda mais o tempo de entrega do produto. “Mesmo que esteja em um container refrigerado, se ele ficar úmido, pode mofar e estragar também”.

Uma coisa é certa: quanto mais tempo a fruta fica na caixa, maiores são as chances de ela estragar. E no setor dos produtos perecíveis, nenhuma máxima se encaixa melhor do que “tempo é dinheiro”.

Para onde vai: ONG faz aproveitamento total de alimentos

A ONG Árvore Viva, que fica no Parque Esmeralda, em Barueri, é uma das entidades beneficentes que recebem doação do Banco de Alimentos e fazem o aproveitamento total dos alimentos. Ou seja, talos, folhas e outras partes não convencionais são usados para consumo e incluídos em receitas mais sustentáveis.

De acordo com a estudante de Nutrição Rosemary Cristina Silva, que atua na área de alimentação da instituição, frutas que já não têm condições de serem consumidas in natura viram sucos nutritivos; a casca da batata, depois de limpa, pode ser mantida e feita na panela de fritura sem óleo e casca de banana pode ser um recheio saboroso para um pão ou bolo.

“Servimos tudo que esteja nos padrões de segurança alimentar. Também ensinamos para as crianças, que muitas vezes estão em situação de extrema necessidade, e os pais sobre a importância de não desperdiçar o alimento em casa”.

Na entidade, são assistidos 40 crianças e adolescentes de 6 a 17 anos que assistem a aulas de artesanato, violão, piano, reforço escolar, entre outras atividades. “Além de consumir na unidade, eles levam para a casa alguns dos alimentos”, detalha a presidente da ONG, Glaucia Melo Lins da Silva. O atendimento é dividido em dois turnos e é oferecida uma refeição para cada turma.

Caminho da sobra: O que jogamos fora também tem outra destinação