Currículo é tudo a mesma coisa. Formação acadêmica, idiomas, experiência profissional, até que, lá embaixo, como quem não quer nada, cismamos em tascar nossas preferências. DJ nas horas vagas, escalada aos finais de semana, professor na comunidade local ou apaixonado por cães. Quando escrevemos no meio de um documento formal informações tão pessoais, deixamos escapar um pouquinho de nós. E é exatamente esse pouquinho que pode falar mais alto no desempate por uma vaga, e nos fazer conquistar aquele sonhado emprego.
Pós-graduação, curso de inglês, extensão, espanhol fluente. Ufa! As exigências são tantas, que, para se manter no mercado, acabamos nos esquecendo do que temos além de toda a instrução. Os hobbies acabam resumidos aos finais de semana – isso quando sobra tempo –, e aquele curso de pintura que você tanto queria fazer acaba ficando para depois. Apesar do pouco tempo reservado para o lazer, são esses poucos momentos que nos possibilitam tocarmos os problemas cotidianos com disposição e eficiência. Sabe aquele cara que trabalha dez horas por dia, é lindo, casado, e tem três filhos fofíssimos? Faz triatlo! A secretária que está sempre de bom humor, e, mesmo recebendo fora após fora, consegue manter a compostura? Faz aulas de canto. Muito mais do que um momento de prazer, as letras miúdas dos currículos nos ajudam a manter a sanidade, a saúde, e um clima pacífico no ambiente de trabalho.
A jornalista Tatiana Queiroz sempre se interessou por música. DJ há dez anos, Tatiana acaba de ser chamada para escrever em uma revista musical, e sabe o quanto sua experiência influenciou na disputa pela vaga. “Já na entrevista, me disseram que era ótimo eu ser DJ, mesmo nunca tendo escrito sobre o assunto. Minha intimidade com o universo musical foi fundamental na seleção. Mas, mesmo em outras situações, percebia uma receptividade maior das pessoas”, recorda Tatiana. A reação é parecida com o sorriso que todos abrem quando, em uma viagem ao exterior, dizemos que somos brasileiros. “É um diferencial. Nem sempre coloco esta informação no currículo, mas, se me chamam para uma entrevista, acabo comentando”, conta a jornalista.
A Catho, uma das maiores empresas de RH do país, é responsável pela seleção de funcionários para milhares de clientes. Luisa Chomuni, consultora do grupo, explica como é feita a escolha dos candidatos. “Numa primeira análise, avaliamos a formação, o idioma, e a experiência profissional. Passada essa etapa, temos a entrevista. É neste momento que os hobbies ganham espaço, e podemos avaliar se a pessoa se adaptará à vaga”, diz Luisa, que dá dicas sobre o perfil desejado. “Procuramos candidatos comunicativos e arrojados. Além disso, algumas empresas dão preferência a profissionais que não fumem, e pratiquem exercícios. Ninguém quer contratar alguém que viva doente”, esclarece.
E as vantagens não são apenas para os freqüentadores de academia. Se você é chegado em esportes radicais, ainda melhor! “Atividades como asa-delta e escalada mostram que a pessoa é capaz de quebrar os próprios recordes, enfrentar medos e encarar desafios. Fora que qualquer atividade física, radical ou não, aumenta a auto-estima e melhora a qualidade de vida”, lista a consultora.
Economista por formação, empreendedor por vocação, e aventureiro por paixão, Leonardo Mello sempre reservou um bom espaço para os extracurriculares na hora de preparar seu currículo. Sócio de uma distribuidora de marcas esportivas, há alguns anos, Leonardo vem passando pela difícil tarefa de selecionar funcionários para sua empresa. O economista, que inicialmente se baseava na formação acadêmica dos candidatos, passou a levar em consideração outros fatores. “Quando preciso contratar, procuro pessoas que tenham um perfil que se adapte à ideologia da empresa. Sempre gostei de mergulho, trekking, viagens e fotografia, e lidando com marcas esportivas, o ideal é trabalhar com pessoas que tenham intimidade com o assunto”, explica.
Na última seleção, Leonardo e seus sócios chegaram a recorrer ao orkut, prática atualmente adotada por inúmeras empresas, a fim de obter mais detalhes sobre a personalidade dos candidatos. “Pergunto o que a pessoa gosta de fazer e presto atenção na roupa. A escolha vai depender do tipo de pessoa com a qual queremos conviver na empresa. Sempre vou dar preferência a alguém saudável, que não fume, e tenha uma boa energia. Como existem mais candidatos do que vagas, podemos nos dar ao luxo de escolher esses detalhes”, diz.
Se a disputa está acirrada, este é apenas mais um motivo para começarmos a prestar atenção e dedicarmos tempo às nossas paixões. Mesmo que seu futuro empregador não chegue a saber como é maravilhosa a criação de bromélias que você mantêm no jardim, ele certamente perceberá a felicidade estampada no seu rosto.