Para quem enxerga, o futebol para cegos parece impossível de acontecer. Mas ele é real e os olhos dos atletas paralímpicos, na realidade, são os ouvidos. Nascido na década de 1980, a modalidade segue quase todas as mesmas regras e definições do futebol de salão tradicional.
“A gente percebe o gol pelo barulho da rede”, conta Ricardo Alves, 27, o camisa 10 da seleção brasileira de futebol de cinco. “A gente tem percepção até do lugar onde foi o gol, tudo pelo som”, diz ele em entrevista para a TV Globo. Ricardinho perdeu a visão aos oito anos e começou a jogar com 15. Hoje é considerado o melhor jogador da categoria do mundo.

Futebol de cegos
“Não é que eles têm uma habilidade maior. É um treinamento maior”, explica Elisabeth de Matos , professora de Escola de Educação Física e Esportes da Universidade de São Paulo (USP) e ex-diretora de classificação do Comitê Paralímpico Brasileiro.
“Eles tem uma forma peculiar de tocar a bola. Tem poucos passes de longa distância e costumam manter a bola entre os pés. Fazem bastante transferências curtas entre o pé direito e esquerdo, mas tudo isso a uma velocidade alta”, conta ela. E a preparação física é praticamente a mesma. Treino de jogadas ensaiadas, táticas de ataque e defesa.
Durante os jogos, as trombadas existem e acabam acontecendo mais encontrões do que em um jogo comum, mas eles são menos propositais, diz Elisabeth. Mas existem algumas regras para tentar evitar os choques como, por exemplo, falar a palavra espanhol “voy”, quando vão pegar a bola. Recebem falta se desrespeitam a orientação.
“E outra: para eles, não é interessante fazer falta. Jogo corrido é melhor. O jogo justo é mais interessante. O futebol deles é de uma forma muito mais séria, porque eles querem provar o potencial. Não querem ganhar por ganhar”, aponta.

História do futebol de cegos
Os primeiros registros do esporte falam de jogos realizados com latas, porque, com o barulho, era mais fácil identificar onde a “bola” estava.
Apesar do Comitê Paralímpico Internacional só reconhecer o primeiro campeonato entre clubes de 1986, na Espanha, o Brasil já tinha realizado uma Copa em 1984, em São Paulo.
A seleção brasileira se consagrou campeã da América do Sul já na primeira Copa reconhecida, em Assunção, em 1997. O primeiro mundial foi o de 1998, que aconteceu na capital paulista, também consagrou o Brasil como ouro.
Futebol Paralímpico
A categoria do futebol de cinco entrou nas Paralimpíadas em Atenas, em 2004, e mais uma vez, o Brasil foi campeão. O primeiro lugar também veio nos Jogos Paralímpicos de Pequim, em 2008, e de Londres, em 2012, o que faz do Brasil o único campeão da modalidade até hoje.
Como se joga?

São cinco jogadores: um goleiro com visão e 4 jogadores de linha com cegueira total, que usam vendas para igualar as condições, já que alguns conseguem enxergar vultos e tirar vantagem. O jogo tem duração de dois tempos de 25 minutos.
Além dos atletas, existe o “chamador”, uma pessoa que fica atrás do gol adversário para orientar sobre a direção, quantidade de marcadores, posição da defesa adversária, possibilidades de jogadas, entre outras informações.
A quadra tem o mesmo comprimento (40×20) da de futsal, mas possui uma banda lateral e placas de madeira de um metro e meio de altura, para deixar a bola sair apenas por cima dela. Às vezes é praticado em quadras de gramas sintéticas, como nos Jogos Paralímpicos.
O ambiente precisa ser silencioso, uma vez que os sons da bola, que possui guizos (tipo chocalhos), é o que guia os jogadores. A torcida pode, sim, se manifestar, mas apenas quando a bola estiver fora de jogo, segundo o site da CBDV ( Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais).
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