Viciados em trabalho > Dias de workaholic

Ao terminar meus estudos de MBA na Inglaterra, há cerca de 5 anos, recebi uma proposta para trabalhar em um banco de investimento na City de Londres. Trabalhei lá por quase 2 anos, uma experiência bastante enriquecedora para mim, que serviu para complementar os estudos recém-concluídos. Entretanto, como é sabido, em bancos de investimento as pessoas trabalham normalmente longas horas e tendem a se tornar workaholics naturalmente. O meu caso não foi exceção à regra e, em particular, como eu trabalhava em uma área que funcionava por projetos, não tinha hora definida para sair do escritório.

Lembro-me que toda semana precisava preencher um formulário (os outros colegas também tinham que fazer o mesmo) especificando quantas horas iria dedicar durante a semana aos projetos com os quais estava envolvido, projeto por projeto. Esse formulário era então submetido à chefia e dizia-se, à boca pequena, que havia um ranqueamento entre os diversos funcionários para saber quem trabalhava mais. Obviamente esse procedimento nunca foi confirmado. Sei que os meus formulários nunca apontavam carga semanal inferior a 65 horas, e com alguma freqüência, era convocado para ir ao escritório nos finais de semana.

Em um determinada fase do trabalho, jantava no escritório quase todas as noites. O ritual se repetia: por volta das 18h30, chegava ao escritório uma secretária do turno da noite, cuja função principal era solicitar o pedido de jantar de quem fosse trabalhar até mais tarde. Ela distribuía os menus de diversos restaurantes (italianos, japoneses, indianos etc.) aos workaholics de plantão e recebia os pedidos de jantar até às 19h30, quando então fazia as encomendas. O regabofe chegava às 20h30 e ela então recebia as quentinhas e as distribuía entre os comensais. Quanto a mim, experimentei quase todos os pratos de todos os restaurantes, para dar um indicativo de quantas vezes tive que trabalhar até mais tarde. No limite, cheguei a sair do escritório às 6 da manhã, após varar a madrugada trabalhando, para estar de volta às 9h, apenas 3 horas depois. E não foram poucas as vezes que saía depois da meia-noite.

A decisão pela mudança decorreu de diversos fatores, e não foi propriamente relacionada à insatisfação com o volume de trabalho. Decidi voltar ao país porque havia saído daqui com vínculo profissional a uma instituição, na forma de uma licença, que estava se esgotando ao final de quatro anos vivendo em Londres. E também por razões pessoais, achava que era a hora de retornar.

Hoje trabalho em uma instituição pública e minha rotina permite planejar melhor o meu tempo, pois, salvo raras exceções, tenho um horário regular para sair do escritório diariamente. Com isso, pratico atividades tão diversas como degustação de vinhos, estudo de piano clássico, aulas de tango, freqüento jantares harmonizados, rodas de samba e faço caminhadas diárias, entre outras. E me sinto bastante feliz com essa vida.

Penso que, acima de tudo, vida é equilíbrio. Muito embora saiba que em determinados momentos temos que devotar dedicação especial a uma determinada finalidade em detrimento de outras, seja o trabalho, a família ou a formação educacional. Creio que nunca devemos esquecer que nossa saúde física e mental, além de nossa felicidade, depende acima de tudo do equilíbrio entre os diversos elementos importantes, pois cada uma deles enriquece os demais e contribui assim para potencializar as nossas vidas.

Guilherme, que não quis revelar seu sobrenome, é economista