Após perder a filha por um tumor, ela transformou a dor em ajuda a outras crianças

por | dez 9, 2019 | Comportamento

Todas as quartas-feiras da fonoaudióloga Joyce Setti são reservadas para uma causa muito especial: ela é coordenadora do voluntariado da casa Casa Ronald McDonald, em São Paulo. O lugar serve de moradia para famílias de crianças com câncer que estão se tratando no hospital do GRAAC (Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer)

Ela começou a dedicar seu tempo à casa depois que a filha, Heloisa Setti, morreu prestes a completar 10 anos. Passados 13 anos do momento mais trágico de sua vida, Joyce conta como conseguiu transformar a dor da perda da filha em força para ajudar outras crianças.

História de Joyce e Heloisa

Desde criança, Joyce sabia que, quando crescesse, queria trabalhar com gente. Nunca teve vontade de trabalhar em áreas administrativas ou que não envolvessem contato humano. Por isso, optou pela área da saúde e se tornou fonoaudióloga.

Ela teve três filhos: dois homens, Gustavo e Fábio, e Heloisa, a do meio, que nasceu em 1996.

Em 2005, quando tinha oito anos, a pequena foi passear com a mãe e voltou indisposta e com dificuldades para andar. Pela manhã, não conseguia mexer as pernas.

Os exames apontaram um tumor intramedular. Foi feita uma cirurgia para retirada e uma biópsia da massa. O resultado apontou que não se tratava de um câncer. Por ter sido uma operação invasiva, Heloisa ficou um tempo sem conseguir movimentar as pernas. Em pouco tempo, porém, ela já estava de volta às atividades normais.

“No ano seguinte ela teve uma recidiva na área cervical. Fez outra cirurgia, perdeu o movimento do pescoço para baixo. A recuperação foi mais mais complicada, mas ela conseguiu”, conta Joyce.

Em outubro do mesmo ano o tumor reapareceu, só que, dessa vez, no cérebro. Ela morreu no mesmo mês. “Apesar de não ser um tumor maligno, era muito agressivo e invasivo. Ela partiu no dia 8 de outubro, dia do meu aniversário. Ia fazer dez anos no dia 20”, conta a mãe.

“Ninguém te prepara para isso. Ninguém te fala dessa possibilidade. Pela natureza os mais velhos vão primeiro, você não imagina que uma filha de quase dez anos, sempre saudável, vai partir assim”, diz.

Voluntariado na Casa Ronald

Depois da morte de Heloisa, Joyce disse que se viu entre duas opções: “Ou você se fecha nesse sofrimento e leva sua família junto ou pega essa dor e transforma em ação”. Ela foi pelo segundo caminho, também como uma maneira de aliviar a própria tristeza.

O começo da vida de voluntária da fonoaudióloga foi tímido. “Decidi doar uma parte das coisas da minha filha para a Casa de Ronald. Foi paixão à primeira vista, mas, por cerca de oito anos, não fazia o voluntariado efetivamente”. Ela às vezes ia até o local para brincar com as crianças e levar doações, até que, um dia, decidiu tratar essa ajuda com mais seriedade.

Sua função era brincar com as crianças na brinquedoteca, até que ela virou coordenadora do voluntariado. “É muito tocante perceber que com o meu movimento e com a minha história eu consegui cativar outras pessoas que quisessem trabalhar de forma indireta ou direta no voluntário”.

O trabalho nem sempre é fácil. Muitas vezes, as histórias das crianças com quem convive lembram a trajetória de Heloisa. “É muito difícil pra mim, porque volto 12 anos atrás e aquilo parece que sangra tudo novamente. Alguns dias são mais difíceis, mas é tão bom chegar na casa e ver as crianças gritando no portão ‘tia Joyce’”.

A fonoaudióloga afirma que o primeiro passo para se tornar voluntário é ter vontade. Depois, é só ir atrás de uma causa que toque o coração: ”Você precisa procurar locais que tenham alguma relação afetiva com o seu propósito”.

Joyce dá um exemplo: “Não adianta você ficar extremamente tocado com a situação da Casa Ronald a ponto de não conseguir agir. Precisa pontuar até que ponto esse lado emocional vai ser positivo e te levar para frente no trabalho ou te paralisar”.

No caso dela, a dor da perda foi a força que a levou para a frente: “Ser voluntária me faz muito melhor do que se eu ficasse na minha bolha porque a minha filha foi embora”.

Trabalho voluntário