Cobra, amiga, cobra!

Blim-blom. Toca a campainha. “Se for cobrador, diz que não estou!” A vida é cheia de cobranças. E não estamos falando só das contas de água, luz ou telefone. Se já não bastassem essas, ainda temos que prestar conta das nossas escolhas emocionais, profissionais, sexuais, afetivas, financeiras e tudo mais que vivem perguntando pra gente. É mole? Se está solteira, rola cobrança para arranjar um paquera. Se fisgou um namorado, começa a cobrança pela a data do casamento. Se subiu ao altar, vem logo a pergunta: “quando é que vem o primeiro filho”? Se está gorda, tem que emagrecer. Se está magra, parece tão fraquinha, tem que se alimentar melhor…  Ufa! O pior é que essa cobrança toda parte de gente querida, principalmente, das amigas que, mesmo sem querer, cobram um bocado da gente. E aí? Trata-se de um sinal de carinho e preocupação ou isso é mesmo uma grande encheção de saco?

Muitas vezes, a intenção não é má, mas as amigas nos enchem os ouvidos de cobranças, ainda mais quando tem homem envolvido. Aconteceu com a publicitária Marisa B., que viu sua melhor amizade abalada depois que ganhou uma aliança do namorado/noivo. “Fiquei superfeliz e fui contar a novidade pra minha amiga. Mas a reação dela foi estranha, parece que ela não ficou contente por mim e só conseguia pensar que ela queria se casar também”, conta a publicitária, que a cada encontro com a amiga ouve as mesmas perguntas sobre os preparativos para o casório. “Eu e meu namorado não temos pressa, porque queremos juntar uma grana antes. Mas ela não entende isso e fica me cobrando detalhes, pergunta como vai ser o vestido, se vai ter lua-de-mel… Um saco”, diz a constrangida Marisa, desconfiada de que a amiga puxa o papo pra ver se o próprio namorado se manca e a pede em casamento também.

Pensa que é só casar que resolve? Nada! A bióloga Viviane Cardoso conta que só muda o conteúdo da pergunta, mas o caráter de cobrança continua firme e forte. “Estou casada há dois anos, eu e meu marido estamos os dois na casa dos inta. Aí já viu: minhas amigas fazem a maior pressão para vir logo um bebê”, relata a bióloga, que já tem uma resposta na ponta da língua: bota a culpa na pós-graduação e só depois que acabar vai poder pensar no assunto. “Mesmo assim elas não dão descanso, alertam sobre a minha idade. Pior é que nem estou tão certa assim de que quero ser mãe. Às vezes, dá vontade de perguntar por que elas mesmos não providenciam um filho e param de me pressionar”, diz ela.

Além das cobranças emocionais, tome cobrança profissional também. Que o diga a jornalista recém-contratada Fernanda R. “No início, foi bacana. Todo mundo me dando os parabéns por ter sido contratada por um grande jornal. Mas agora o quadro mudou. Me perguntam o tempo inteiro quando é que minhas matérias vão sair assinadas, quando vão estar na capa e por aí vai. Eu tento explicar que não é assim, que temos que dar tempo ao tempo, que não se consegue tudo de uma vez só. Mas é só me encontrar de novo que as cobranças caem em cima de mim, com o peso de um piano de calda”, reclama Fernanda, que tenta distinguir quem está realmente interessado por gostar dela, ou quem tem outros interesses próprios por trás. “Tento ser paciente com os amigos mais próximos. Mas, na verdade, eles é que tem que ser mais pacientes comigo e esperar o meu tempo de me impor no trabalho. Com tanta cobrança, fico mais insegura”, desaba.

Segundo a psicanalista Priscila de Faria Gaspar, é comum haver cobrança de um bom desempenho emocional e profissional entre amigas. O problema é que, quando uma delas finalmente atinge os objetivos almejados, vem aquela dor de cotovelo. “O ser humano é ambíguo. Por mais que torça pela felicidade do amigo, pode ao mesmo tempo sentir uma pontada de ciúme, até inveja ou raiva”, explica a psicanalista, ressaltando que, inconscientemente, tantas perguntas sobre a vida do outro podem significar falta de realização própria e, portanto, uma projeção de desejos e frustrações na amiga. Para Priscila, a cobrança pode ter um aspecto positivo, sim, quando serve para puxar a responsabilidade do outro, fazer a pessoa crescer e amadurecer. “Esse tipo de cobrança é típica de pai e mãe, que têm um papel de autoridade. Numa amizade, cobranças e expectativas irreais podem acabar prejudicando quem é mais insegura, fazendo com que a amiga se sinta incapaz”, afirma.

Mas e aí? Aquela nossa amiga nos enche de cobranças, pergunta tudo sobre tudo, mas… Ela tem suas qualidades! Tem jeito de dar um chega pra lá nela sem botar um ponto final na amizade? “Uma alternativa é devolver na mesma hora a pergunta que a amiga fizer. Ou questionar o motivo pelo qual a amiga quer tanto tocar nesse assunto. Sem agredir, mas com o intuito de gerar uma pequena reflexão”, sugere Priscila. Então, tá combinado: na próxima cobrança que vier, sobre casamento, filho, salário, peso na balança… é a amiga mesmo que vai ter que responder!