Das estradas, surgem muitas histórias que, mais tarde, podem virar grandes lições de vida. Para as mulheres que encaram a profissão de motorista, nem o estresse, o cansaço, a saudade da família, o risco ou mesmo o preconceito são capazes de diminuir o amor delas pelo ofício. Em 25 de julho, comemora-se o Dia do Motorista, um viva a essas bravas trabalhadoras que manobram as intempéries para chegar a seus destinos com segurança. Parabéns também a quem pilota um carro de passeio e, por que não, uma bicicleta: a coragem para se arriscar pelas vias cada vez mais perigosas também merece aplausos.
Todo dia para cima e para baixo, mas sem bater perna. Elas vivem em trânsito e passam a maior parte do dia sentadas e sozinhas. Taxista na maior cidade do país, Angélica Cruz já consegue driblar o tédio e a introspecção. “A gente sempre tenta criar uma interação com o passageiro, dependendo, claro, da postura que ele adota ao entrar. Se a pessoa entra com uma postura muito dura, às vezes estressada ou atrasada, você precisa saber ter jogo de cintura e tratá-la com educação, independentemente do estado de espírito dela”, diz a profissional. “Mas eu sou muito tagarela. Com uma boa conversa, a viagem sempre fica mais agradável e não é raro fazer amigos no trabalho“, comemora.
Já a caminhoneira Solange Beraldes prefere uma companhia musical para embalar os seus trajetos. “Eu não costumo ficar pensando em muita coisa, não levo problema de casa para o ambiente de trabalho, nem vice-versa. A boleia do meu caminhão é uma terapia: coloco uma musiquinha, alternando às vezes para rádios de notícias para me atualizar, e embarco na minha viagem diária. O meu parabrisa é uma tela de cinema à minha frente”, diz Solange, que realiza entregas no percurso rodoviário entre a capital paulista e Campinas.
Se percorrer as ruas da movimentada São Paulo de carro já é complicado, imagine-se dirigindo um caminhão e com horário marcado para chegar… Vida estressante! Não é o que pensa Neide Araújo, acostumada com a rotina de caminhoneira na cidade. “Eu normalmente viajo com dois ajudantes fixos. Na maior parte do tempo, estamos juntos e nos entendemos bem. Vivemos brincando, conversando, contando histórias, dando risada nas horas vagas”, diverte-se. No entanto, quando o horário comercial termina, o barulho do caminhão fica só na memória. “Não quero nem pegar carro nas minhas horas de folga. Sempre delego a função para qualquer outro da família”, avisa ela.
Para Angélica Cruz, o vaivém não se resume só aos trajetos, mas também ao entra-e-sai de passageiros. Ao mesmo tempo que uma viagem pode lhe proporcionar uma interessante conversa de retrovisor, também pode colocá-la em contato direto com o perigo. “A gente nunca sabe quem vai entrar no nosso carro”, desabafa ela, que costuma usar a sempre bem-vinda intuição feminina para identificar riscos. “Esse sexto sentido nos ajuda a fazer a leitura correta do indivíduo que entrou. Certa vez um jovem se sentou no banco dianteiro e não me olhou nos olhos em nenhum momento. Percebi o perigo e comecei a falar como a minha vida era difícil, para sensibilizá-lo. Logo depois, ele saltou sem explicações. Tenho certeza de que ia tentar me assaltar”, supõe a taxista.
A criminalidade nas estradas também pode assustar as iniciantes. Solange prefere nem pensar no assunto. “Eu prefiro não pensar nisso. A partir do momento em que eu saio de casa, já estou correndo risco. Se o caminhão der algum problema na estrada, ele possui sistema de localização via satélite, aí a empresa sabe onde estou. Isso me dá mais segurança”, diz. Já Angélica, que depende de clientes para faturar, desenvolveu o seu próprio método: “Depois das 19h, eu só pego passageiro no ponto de taxi. De madrugada, então, não paro nem para mulher grávida“.
Feminina, sim!
Na comparação com os homens, elas se destacam na loucura do trânsito pela delicadeza. “A mulher é mais cuidadosa e precavida na direção. Nós temos mais paciência com o trânsito”, compara a taxista. “O homem pega, dá a seta e já vai enfiando o caminhão na frente para cortar o outro. A mulher é mais prudente e passa devagarzinho.”
A vaidade, na visão delas, não tem apenas uma função pessoal, mas também é uma questão de profissionalismo. “Todos admiram o fato de a mulher se importar com a aparência, contrapondo aquela figura convencional do motorista desarrumado”, conta Neide. “Nós somos o cartão de visita da empresa, temos a obrigação de estar bem arrumadas”, complementa Solange, que não sai para trabalhar sem o seu kit beleza: “Tenho sempre comigo uma nécessaire com tudo que uma mulher precisa para emergências. Se houver uma viagem de última hora ou um evento depois do expediente, já estou preparada”.