Ah! A poesia. Foi ela que uniu o casal Leonardo Mendes e Daniela Vargas. Ele, assíduo freqüentador de rodas de leitura e ela, amiga de uma dona de livraria no Rio de Janeiro, se conheceram entre versos de Carlos Drummond de Andrade e análises de textos de Clarice Lispector. A paixão surgiu através de belas palavras declamadas por Leonardo e o resultado foi o casamento que, depois da benção do padre, teve direito a juras de amor eterno, ou melhor, de amor infinito, enquanto durar a história… O casal é um dos exemplos de gente que admira a literatura versada e se encontra para apreciar sonetos e rimas. A poesia, definitivamente, voltou a ocupar o imaginário das pessoas e conquista, a cada dia, mais admiradores.
De mudança para o Espírito Santo, o casal já decidiu reeditar na nova cidade os saraus de música e poesia que fazem em casa. Já é sagrado o encontro que reúne cerca de 15 pessoas uma vez por mês. E eles querem aumentar a freqüência. “É muito gostoso. Cada um traz pelo menos um texto para declamar e enquanto escutamos jazz. Às vezes, algum convidado toca um instrumento e todo mundo canta junto”, conta Daniela, 27 anos. No começo os amigos estranhavam o programa, mas agora já viraram fãs e mais adeptos estão surgindo. “Todos estão acostumados a ir a um restaurante, sentar, comer e pronto. Ou, então, ir a uma boate e escutar aquela barulheira. Não deixamos de fazer isso, apenas propomos algo diferente. Isso força os convidados a abrir um livro e escolher um poema. Para algumas pessoas, só isso já é uma novidade”, afirma Leonardo, 38 anos, leitor voraz de Cecília Meireles.
Para todos os gostos
Além das livrarias e das rodas de leituras, a poesia invadiu as telas e os palcos. Foi lançado um documentário sobre a história do poeta Expedito, um lavrador negro, que migrou do sudeste para o Pará, na década de 70, em busca de trabalho. Porém, o trabalhador se engajou na luta social e política e se tornou um mártir. “Expedito em busca de outros nortes”, de Beto Novaes e Aída Marques, traz o cantor Chico Buarque declamando as premiadas poesias do lavrador, que teve como cenário os embates entre fazendeiros e trabalhadores da região do Rio Araguaia.
Hoje a gente vive numa terra de ninguém. A poesia retrata o outro lado. Nenhuma pessoa consegue viver se não tiver um lirismo em contraposição a isso tudo
No teatro, a poesia é retratada através das histórias de Cora Coralina (1889-1985). Admirada por Drummond, esta poetisa goiana lançou seu primeiro livro somente aos 76 anos e só foi fazer sucesso treze anos depois. A vida de Ana Lins do Guimarães Peixoto Bretãs, seu nome de batismo, é recheada de encontros e desencontros contados na peça “Cora Coralina, Coração Encarnado”, em cartaz no Centro Cultural da Justiça Federal, no Rio de Janeiro. Através do encadeamento dos textos e poemas de Cora, a peça mostra a biografia desta mulher que desde nova queria se dedicar à literatura e não esmoreceu frente às adversidades.
“O melhor da Cora é que ela é múltipla. A vida toda dela é impressionante. Era alegre, esperta, engraçada e uma mulher à frente do seu tempo. Num mundo em que só se preza a juventude, ela conseguiu ser reconhecida aos 89 anos. Isso toca as pessoas”, afirma Renata Roriz, produtora e uma das três atrizes da peça. Questionada sobre o papel da linguagem poética nos dias de hoje, a atriz é direta. “Hoje a gente vive numa terra de ninguém. A poesia retrata o outro lado. Nenhuma pessoa consegue viver se não tiver um lirismo em contraposição a isso tudo”, opina.
Rede de versos
Até a internet é recheada de poesia. Além das páginas especializadas e grupos de discussão, o Orkut, site de relacionamentos da rede, possui mais de mil comunidades ligadas ao tema. Algumas bem divertidas, como “Vagabundo não, eu sou poeta”, e outras dedicadas a grandes nomes da poesia nacional e internacional. Admiradora da poetisa portuguesa Florbela Espanca, Luíza Meneses, 26 anos, é participante de várias comunidades. E ela afirma que o estilo está cada vez mais popular. “No começo, as pessoas acabam se aproximando da poesia por causa da temática amorosa, mas depois descobrem outros assuntos e autores e se interessam mais. Já fui a muitos saraus marcados por meio da internet e, por incrível que pareça, a maioria é formada por jovens de 30 anos em média”, conta a mineira.