Vai, confessa. Conta pra gente que, pelo menos uma vez na vida, você teve – ou viu alguém ter – um acesso de frescurite aguda. Por qualquer motivo, por mais besta que fosse a situação. É, tem dias em que a gente acorda com a macaca, não está a fim de se submeter a qualquer coisa e dá chilique. Ou então tem o hábito de se comportar de maneira estranha, simplesmente porque isso já faz parte da sua personalidade. As manifestações dessa síndrome são as mais variadas: desde não aceitar, de jeito nenhum, usar aquele talher que tem uma mínima sujeirinha, até querer acordar sempre linda, maravilhosa, penteada, cheirosa e sem bafo ao lado do seu amor. Tudo bem, todo mundo tem direito de escolher o que quer fazer, mas tem gente que exagera um pouco na dose.
Tem gente que sabe que está fazendo algo meio esdrúxulo, mas não está nem aí. É o caso da estudante Érica Russo, que tem por hábito fazer aquilo mesmo que citamos no parágrafo acima: acordar sempre impecável na cama do namorado, com quem está há um ano. “Normalmente fico assustadora quando acordo. A cara incha, fica toda marcada, o cabelo todo desgrenhado. Se eu já não gosto muito da minha imagem no espelho de manhã cedo, imagina se eu vou obrigar meu namorado a ver isso! Sempre levanto da cama algum tempo antes de ele acordar e dou um jeitinho no meu visual. Lavo o rosto, penteio o cabelo e escovo bem os dentes. Às vezes eu até pego no sono de novo, mas pelo menos não estou tão horrível quando acordo em seguida”, conta ela. Haja disposição, hein?!
Variando sobre o mesmo tema, entramos em um assunto pra lá de polêmico: fazer ou não fazer o famoso “número dois” na casa do cavalheiro? “Tive uma amiga que ficou com tanta vontade, mas tanta vontade, que pediu licença, pegou o elevador e foi a uma lanchonete na rua do cara para usar o banheiro. É muita frescura, é um absurdo querer que o cara pense que a gente é de porcelana, que não é humana. Se ele estiver na sua casa, na mesma situação, você tem alguma dúvida se ele vai ou não usar o banheiro? Claro que vai”, alfineta a arquiteta Caroline Sampaio. Já Érica discorda. “Não acho elegante. Menos ainda em casos de emergência”, protesta.
Por falar em elegância, ou a falta dela, que tal trocar os talheres do restaurante pelos seus próprios, trazidos de casa? A professora de inglês Claudia Lucena chegou ao ponto de fazer isso. “Me recuso a comer em restaurantes que tenham talher sujo. Além disso, não gosto nem de imaginar se eles lavam mesmo ou não, quem foi que os usou pela última vez… Como minha família adora freqüentar uns restaurantes de higiene meio duvidosa, prefiro levar meus talheres”, diz ela, que enfrenta a gozação da família sempre que puxa o garfo de dentro da bolsa. Mas e o copo, não tem problema? “Nenhum, eu não bebo nada durante as refeições”, rebate Claudia.
A hora de comer também revela os frescos de plantão. A própria Claudia confessa que às vezes cheira e dá uma boa olhada no alimento, antes de consumir. Se ela descobre que não foi feito na hora ou no mesmo dia, prefere passar fome. “Fiquei assim depois que tive uma bela intoxicação alimentar. O problema se foi, mas o hábito ficou”, justifica.
Bem, já vimos que a Frescolândia é habitada por todo tipo de gente. E o que dizer, então, de quem quase desinfeta um canudo que foi usado pelo amigo que pediu um golinho do refrigerante? Ou quem desiste de comer após o colega dar uma mordidinha para experimentar o sanduíche? E quem se recusa a sair por dois segundos na chuva, senão vai molhar o cabelo? A arquiteta Caroline tem uma teoria. “O que essas pessoas têm é medo de correr risco. Querem mais é se proteger de uma coisa que nem elas mesmas sabem o que é”, cutuca.
Enquanto essas frescuras não passam de peculiaridades no comportamento de cada um, tudo bem. Afinal, ninguém mais está saindo prejudicado – a não ser o próprio fresco. Só que, de acordo com a psicóloga Vera Soumar, existe um limite para esse tipo de conduta. “Existem o hábito e o vício. O hábito é um condicionamento, você pode optar em fazer determinada ação e não sofre se decidir por não fazê-la. Já o vício está ligado à dependência física ou psíquica e a pessoa pode ter até crises se sentir falta dele”, diz ela. Ou seja: se a frescura é apenas um comportamento isolado, então não tem problema. O perigoso é ela se tornar um vício e acabar paralisando a pessoa. “Se alguém deixa de comer algo, ir a algum lugar ou deixar de fazer qualquer coisa que gostaria e sofre por isso, deve ficar atento. Esse fato pode estar sendo encarado como frescura, mas na verdade está gerando angústias e frustrações. Essa pessoa vai precisar de ajuda profissional”, alerta a psicóloga.
Outro problema que ela enxerga está no comportamento relatado por Érica, que deseja estar sempre linda ao acordar ao lado do eleito. “Mulheres que agem assim, querendo parecer sempre perfeitas, estão vivendo em função do outro e perdendo sua autonomia. Acabam viciando na imagem que o companheiro tem delas, que não é a realidade. O tempo passa, os dois embarcam em uma relação utópica, até que vem a cobrança: ou ele se cansa da perfeição ou ela começa a cobrar, mesmo que inconscientemente, tudo o que fez por ele, inclusive a perda de sua identidade”, assinala Vera Soumar. Para ela, é bom ficar de olho: um comportamento que começa como uma brincadeira pode se transformar uma mania negativa. E aí, o que era apenas uma frescurinha de nada pode se tornar um grande incômodo. Já pensou?





