Loucos por séries > Séries X novelas

Para Daiane Baddini, revisora, o mundo das séries é muito mais sarcástico, irônico, irreverente, glamouroso, provocante e non-sense do que as novelas jamais serão. “As novelas são feitas para o grande público e, por isso, se prendem a tramas básicas para agradar a todos. As séries, por outro lado, podem se focar em um só segmento, o que dá a elas muito mais liberdade”, explica Daiane, que passa boas horas assistindo aos programas. “Quando chego em casa, e também nos finais de semana, minha primeira opção de entretenimento são os canais de séries. Atualmente, vejo muito Weeds, House, Psych, Brothers & Sisters, The Hills e Grey’s Anatomy“, conta.

O comentarista de televisão Bruno Carvalho costuma dizer que as séries são uma evolução das novelas e tendem a preencher cada vez mais o espaço da teledramaturgia na telinha. “Basta ver que, por exemplo, a exibição de Lost ou 24 Horas na TV Globo aumenta sensivelmente a audiência dos finais de noite durante as férias do Jô Soares e a TV Record anda conseguindo ótimos índices com Heroes e CSI Miami“, afirma. “Mas não é sempre que precisamos importar produções: no Brasil, também temos ótimos exemplos de séries de sucesso, como Mandrake, A Grande Família, Os Normais e a eterna Sai de Baixo“, lembra.

Antonio Carlos Mattos, professor de cinema da Puc-Rio, define as séries como pílulas de prazer em intervalos de alguns dias. “A televisão acostumou as pessoas com a rapidez, com o dinamismo, típicos, também, do nosso tempo. Num filme antigo, por exemplo, o plano costuma durar 11 segundos. Hoje, os filmes têm planos de apenas três segundos, porque precisam ter muita movimentação, muita ação. E é por isso que elas fazem sucesso, porque são rápidas”, revela. Para se ter uma idéia, em apenas uma temporada, ou seja, entre 12 e 22 episódios, o tema é introduzido, explorado, cria-se um clímax e temos um desfecho. “Além disso, há a linguagem do dia-a-dia, como as novelas. Mas a diferença é que estas estão mais para vulgares enquanto as séries despontam com suas tramas densas e textos inteligentes”, compara o professor.

Para todos os gostos

O que mais atrai Davi Garcia, do Dude! We are Lost!, ao mundo das séries é justamente a variedade e a qualidade dos temas. “Temos um médico ranzinza, grosseirão, mas infinitamente inteligente, que resolve casos clínicos bizarros ( House), um serial killer que segue um restrito código de conduta e só faz de criminosos suas vítimas ( Dexter), e Lost, com todo seu complexo jogo de mistérios, mas que fala de temas inerentes a todos nós, como autoconhecimento, sobrevivência, redenção etc. É quase impossível ver esses temas em folhetins nacionais”, garante.

Segundo o psicólogo Paulo Ceccarelli, o fascínio também pode ser explicado da seguinte forma: “Elas, assim como as telenovelas, representam momentos em que a pessoa sai do mundo real e esquece os conflitos pessoais, o que é muito importante, já que precisamos ter as nossas fantasias”, explica Paulo Roberto, que diz que o único problema é quando o universo da utopia começa a suplantar o real.

De fato, as pessoas se identificam bastante com as tramas e se permitem imaginar, pelo menos durante o episódio, na pele dos personagens, o que torna as séries ainda mais apaixonantes, porque nos deixam experimentar o gostinho de coisas que nunca fizemos ou vivemos. Quem acompanha qualquer série ganha um filho, uma mãe, um irmão, sofre junto, vê o crescimento, briga quando algo dá errado, se emociona, fica feliz, torce, se sente órfão quando acaba. “Não existe programa que crie um vínculo tão forte e verdadeiro com nós”, garante Krisnamara Alencar.

Ela encontrou seus dois primeiros amores em Gilmore Gilrs e Dawson’s Creek, que foram as séries mais marcantes em sua vida, porque a acompanharam na adolescência. “Me identificava com o dia-a-dia dos personagens, com os medos, dúvidas, paixões…”, lembra a moça, que, hoje, não consegue se imaginar sem séries. “Existe essa possibilidade? Se existe, quero que ela fique bem longe de mim!”, brinca Krisnamara, que passa pelo menos duas horas por dia e a madrugada do final de semana assistindo a séries como Nip/Tuck, Bones, Gossip Girl, Tell me you love me e Moonlight, sem contar os momentos ‘retrospectiva’ em que assiste a temporadas de séries que já acabaram, como Arquivo-X.

Passado e futuro

Foi essa ficção, aliás, que fez Davi Garcia, do Dude! We are Lost!, entrar de cabeça no mundo das séries, nutrindo toda a sua paixão por elas. Ele assiste a duas ou três séries por dia, entre elas Chuck, Journeyman, Cane, The Office e Pushing Daisies. Já Juliana Ramanzini, companheira de Davi no blog sobre Lost, começou a assistir séries quando era bem pequena. Ela acompanhava o avô assistindo a Casal 20, Dallas e Chips. Depois, foi a vez de Barrados no Baile, que marcou sua adolescência, Melrose, entre outras. “Com a TV à cabo, foi inevitável entrar de cabeça nesse mundo e com a Internet, então, foi o paraíso poder assistir aos episódios assim que eram lançados”, anima-se Juliana, que também assiste de duas a três séries por dia, como Medium, The Big Bang Theory, Two and a Half Men, Supernatural e Damages, fazendo uma minimaratona aos sábados. Lost, no entanto, é a única pela qual Juliana perde o sono.

Já para Gilberto Guerra, administrador de empresas, as séries mais marcantes foram, além de Arquivo-X, Buffy e Angel. “Elas influenciaram até minha forma de me vestir naquela época e me incentivaram a estudar inglês, pois sempre gostei do som original”, conta. Hoje, ele assiste, em média, uma hora e meia de séries por dia, o que equivale a 100% de seu tempo em frente à TV, já que dificilmente assiste a outros programas. “Sem as séries, minha vida provavelmente não teria televisão”, afirma Gilberto, que acompanha religiosamente, e por ordem de preferência, Lost, 24 Horas, Heroes, Prision Break, Smallville, Supernatural e The Shield, entre outras. “Gosto dos seriados com histórias que dificilmente aconteceriam na vida real”, diz.

Na linha retrô, Vitor Pinheiro, um apaixonado por séries e desenhos animados antigos, fundou o site Séries e Desenhos para compartilhar os programas que já não existem mais com os fãs igualmente saudosistas. “Lembro perfeitamente do meu primeiro seriado: Nacional Kid. Eu tinha uns 5 anos de idade e achava aquele super-herói o máximo! Porém, os que mais deixam saudade são os clássicos japoneses Ultraman e Ultraseven, que eu assistia com o meu irmão”, relembra Vitor. “Minha resposta para a paixão pelas séries está nas trilhas sonoras. Como não ligar o tema de Hawaii 5.0, por exemplo, ao ótimo seriado que passou aqui no Brasil nos anos 70?”, diverte-se. Pelo menos três vezes por semana, Vitor dorme de madrugada vendo episódios de séries antigas e também de novas, como Law & Order. “Minha esposa fica até tarde também. Quem acorda primeiro do sono desconfortável no sofá chama o outro para ir dormir no quarto”, ri.

Entre séries estrangeiras e brasileiras, a atriz Cristiane Urbinatti, assim como muitos outros fãs, prefere as estrangeiras. “No Brasil, acho que ainda falta muita ousadia nos roteiros e um investimento maior na qualidade das produções. Mas acredito que algumas emissoras estão percebendo como esse mercado está crescendo e que existe público interessado”, avalia. Os (futuros) loucos por séries, é claro, agradecem!