Ela imita tudo o que você faz, veste e pensa. Perambula por aí tomando emprestado, sem autorização, seu visual e ainda arruma um jeito de se conectar aos seus relacionamentos, familiares e amorosos. Quem é essa? A amiga-clone!
Descendo pelo elevador de seu prédio, resolvida a sair para dar uma volta na praia, a redatora Ana Paula Souza mal imaginava o que a esperava lá embaixo, na portaria. Ao abrir a porta do elevador, deu de cara com sua amiga Ana, sua xará e seu clone. “Ela estava indo me visitar, vestida igualzinha a mim. A roupa era a mesma que eu estava usando naquela hora, a tiara no cabelo era a mesma, até o cadarço do tênis, daqueles fluorescentes, era igual!”, relembra. O susto foi tão grande, segundo a redatora, que ambas exclamaram juntas: “Ana?!”, tornando a situação ainda mais bizarra. Essa história é apenas uma entre tantas que povoam as lembranças de quem já teve as chamadas amigas-clone, que adoram imitar, se vestir e adotar a maneira de falar ou agir de alguém. E olha que elas são mais comuns do que se imagina.
A estudante Regina Villela conheceu seu clone na escola primária, conviveu com ele durante anos, mas só percebeu que estava ganhando uma cópia aos dezesseis anos de idade, quando resolveu radicalizar o visual. “Cortei o cabelo bem curtinho e lá foi ela. Fiz o segundo furo na orelha, e lá foi ela de novo. Sempre me copiava. O que mais me surpreendeu foi quando a tal cópia não autenticada, que sempre foi contra eu fazer inglês e falava mal da escola onde eu estudava, um dia foi aprender o idioma em outro lugar”, afirma. Anos depois, ambas se tornaram professoras de inglês e hoje a amiga-clone é diretora exatamente da escola onde Regina estudava. E agora fala maravilhas dela. A estudante ainda não se viu livre de outros exemplares da espécie. “Volta e meia me aparece um, desde uma maluca que queria puxar meu tapete no trabalho, até outra que queria levar o meu ficante, mas desistiu do cara quando eu também desisti”, comenta.
Uma brincadeira de adolescência talvez tenha atraído um clone para a vida da jornalista Juliana Gomes. Combinava com uma amiga de ir à escola, durante o segundo grau, usando roupas idênticas, por pura diversão. “Usávamos tudo igual: blusa, calça e sapato. Parecíamos um par de jarros, mas era divertido, porque foi a forma que encontramos de demonstrar identidade”, avalia. Anos mais tarde, na faculdade, o destino se encarregou de apresentar a Juliana seu novo clone não-oficial. “Ela era minha única amiga na turma, então ficamos muito próximas. De repente, ela começou a querer mandar no meu jeito, criticando minhas roupas e dizendo que eu deveria me vestir melhor. Falava, na maior cara-de-pau, que as botinhas que eu usava tinham cara de ortopédicas”, diz. Como Juliana não dava a menor bola às críticas, a amiga passou a se vestir de maneira idêntica, usando, inclusive, as botinhas que chamava de ortopédicas. Não bastassem as roupas, começou uma certa competição por notas de trabalhos e até pela atenção de amigos e parentes de Juliana. “Me irritava profundamente a forma como ela se aproximava das pessoas à minha volta e de tudo o que era meu. Isso durou dois anos. No fim das contas, cansei, deixei-a de lado e resolvi me aproximar de outras pessoas na faculdade. Ela não me fazia bem”, conclui.
Por que acontece essa vontade de copiar o outro? O que passa pela cabeça de quem resolve se comportar como outra pessoa? De acordo com a psicóloga Thelma Mazer, cada situação é única e não se pode generalizar. “A imitação faz parte do processo de diferenciação, que é quando a pessoa está na fase de descobrir sua própria individualidade, no início da idade adulta. Nesse período, ela vai criando sua própria vida, suas responsabilidades, mas há quem tenha dificuldade em passar por ele. Depende muito das experiências que cada um já teve na vida”, explica. Então, ao encontrar alguém que lhe pareça mais competente ou bem-sucedida, a pessoa pode elegê-la como um modelo a ser seguido.
Foi o que aconteceu com a estudante Adriane Silva, que ficou encantada com uma colega de um curso de desenho. “Ela era tão diferente, extrovertida e carismática, que fazia um sucesso tremendo na escola”, diz. O jeito meio hippie de se vestir, os vários anéis em todos os dedos das mãos, a moda que ela inventava, as atitudes e até a linha de pensamento fascinavam Adriane, que passou a comprar tudo – inclusive um anel em forma de cobra, bem chamativo – igual ao que a colega possuía. A garota percebeu a mudança, mas não comentou nada. “Fiz tudo aquilo sem perceber, por pura admiração. Eu queria ser popular como ela, mas sentia que nunca seríamos iguais”, reflete. A amizade murchou quando Adriane saiu do curso.
Apesar da irritação, as meninas clonadas não têm muita paciência de chamar a amiga para uma conversa. Ana Paula passou a achar graça. “Parecia um disco riscado: eu fazia e ela repetia. Acho que ela só queria chamar a atenção”, filosofa. Juliana avaliou os prós e contras de uma conversa e concluiu que não valia a pena, pois não estava muito a fim de manter a amizade. Somente Regina reclamou e ouviu da amiga que não havia problema algum. “Acabei deixando essa história pra lá”, confessa. Para a psicóloga Thelma Mazer, quem vive uma situação como essa precisa parar para pensar. “É importante avaliar o que faz a pessoa manter essa amizade, se ela traz algum benefício”, diz. “No começo pode ser interessante observar que há uma pessoa que nos admira, mas depois de um tempo esse comportamento irrita e sufoca”.
Clonagem, felizmente, tem vida curta. Uma das partes acaba se cansando, dando tchau à outra e seguindo sua vida. Mesmo assim, quem passa pela experiência quer distância de um repeteco. “Acho o fim! Gosto de ser diferente, então agora fico longe de gente assim”, diz Regina. Mesmo Adriane admite que não faria de novo. “Um dia acaba o encanto e você vê que a pessoa não é mais especial do que você. Hoje relembro tudo o que fiz e acho um horror, que ridículo! Dou muita risada”. Pelo sim, pelo não, fiquem alerta: a clonagem humana ainda está proibida.