“Eu fiquei fascinada ao ver, aos 15 anos, uma apresentação de circo. Lindo demais! Quis tentar fazer algo tão bonito assim. Só não sabia se teria capacidade para tanto”, diz a estudante de cenografia Fernanda Magalhães, 23 anos. Envolvida com o circo desde então, há dois anos ela tem ido com freqüência às aulas de acrobacia aérea do Teatro de Anônimo. E garante que muita coisa mudou a partir dessa decisão.
Fernanda conta que no início foi atraída apenas pela beleza dos movimentos, mas que com o decorrer aulas percebeu como o circo poderia ser importante em outros setores de sua vida. “Eu era muito tímida quando entrei no Anônimo. E o grupo chegou a ser uma terapia em determinado momento. Atualmente, vejo que mudei não só meu corpo, como também a minha forma de me relacionar”, afirma. Encontrar as pessoas que gosta, fazer os movimentos e se alongar passou a ser para Fernanda algo muito distante de obrigação. “Vejo o Anônimo como uma família. Fiz muitas amizades lá”.
Lá não tem aquele clima marombeiro, de se preocupar em pagar algum mico em relação ao corpo. As pessoas são interessantes, sabe? E a gente até torce pelos micos!
No fim das contas, trabalhar perna, braços, barriga foi conseqüência para a estudante que, hoje, possui a parte superior bem desenvolvida. “Dá uma definida nas costas, nos braços. Tem gente que não gosta, mas eu adoro! Lá no Anônimo costumamos brincar ‘olha o meu bração’. É um orgulho ver essas mudanças físicas após tanto esforço”, afirma. Não que ela tenha deixado de correr ou andar de bicicleta. Isso ela continua fazendo devido à dificuldade de emagrecer. Academia é que ela não agüenta mesmo.
“No circo existe a interação entre as pessoas e o lado lúdico, além dos exercícios corporais. É um espaço de autoconhecimento.”, explica Maria Angélica Gomes, trapezista, e uma das fundadoras do Grupo Teatro Anônimo. Ao lado de sua dupla Regina Oliveira, há nove anos ela ensina técnicas circenses para alunos de acrobacias aéreas que não necessariamente querem se profissionalizar. Na verdade, a maioria deles não quer. “É uma grande brincadeira séria”, afirma sem palhaçada!
As aulas seguem o seguinte cronograma: aquecimento e exercícios educativos, em que os futuros acrobatas adquirem resistência, fortalecem o músculo e ganham intimidade com o aparelho. Esticar as pernas com controle, soltar a musculatura das costas e abdominais são algumas atividades realizadas enquanto se está pendurado, antes da realização de um número. De acordo com Angélica, essa preparação se torna necessária para que se consiga improvisar em cima do aparelho. Os exercícios educativos não deixam o corpo condicionado a uma seqüência de movimentos. “O ideal é o equilíbrio entre a técnica e a criação”, diz ela.
Angélica explica que qualquer um pode fazer circo. Por isso, nem pense em dar uma desculpa do tipo “sou todo duro para exercícios físicos”, caso algum dia seja convidado por um conhecido. Respeitar os limites de cada um e valorizar as diferenças faz parte da filosofia do grupo. As características são desenvolvidas de acordo com o potencial individual dos alunos. Um pode ser mais flexível, outro pode ter mais força e ainda há aquele que sabe se expressar muito bem cenicamente. Não há restrições para idades ou sexos, apesar das mulheres procurarem mais o circo do que os homens. Em outras palavras, basta ter vontade e dedicação. O único alerta que Angélica não deixa de fazer é o seguinte: “É normal encontrar depois de um tempo, pessoas em conflito se devem seguir a carreira circense. Por mais que não tenham entrado no grupo com esse propósito. É algo apaixonante”.
Foi o que aconteceu com Maibi Rodrigues, publicitária, 30 anos. “Já pensei em me profissionalizar, sim. O problema é que para isso acontecer agora teria que correr atrás de um tempo perdido. Tenho outras prioridades, no momento”, explica. Maibi tem dupla fixa no Anônimo, faz pesquisas para montar as coreografias e vai a fundo no assunto acrobacia aérea. “Eu não falto às aulas de jeito nenhum. Foi a descoberta da minha vida”.
A publicitária fez quatro anos de ginástica olímpica quando mais nova. Como não conseguiu voltar depois de um tempo, partiu para as academias. Só não obteve sucesso. Começou e parou de malhar várias vezes, e achava que o problema era com ela. “Para mim, eu que não conseguia cuidar do meu corpo. Minha auto-estima era péssima”, relata. Até que um dia o marido sugeriu a idéia “circo”. Era o que faltava. “Lá não tem aquele clima marombeiro, de se preocupar em pagar algum mico em relação ao corpo. As pessoas são interessantes, sabe? E a gente até torce pelos micos! Sempre tem alguém fazendo uma palhaçada. E não é aquela coisa mecânica. Eu preciso ter foco durante minhas acrobacias porque senão eu caio!”, explica. Maibi diz que a cada aula descobre um novo movimento, outro limite de seu corpo e que o circo lhe dá a certeza de estar sempre buscando algo. Ah sim, o corpo? “Está do jeito que eu queria”.