A ligação entre pais e filhos tem um quê de inexplicável. Principalmente no caso da mãe, que carrega sua cria na barriga durante nove meses, dividindo com ela sua alimentação, sua saúde e mesmo seus sentimentos. Dizem que tudo que a mulher grávida sente, o bebê percebe e sente também. E depois que nasce, parece que essa forte relação permanece sob a forma de pressentimento materno. Mas não sejamos injustos com os paizões de plantão: eles também – e às vezes até mais – são supersensíveis ao que se passa com os filhos. Se alguma coisa de ruim acontece com os rebentos, se estão tristes ou somente ligeiramente cabisbaixos, mesmo que tentem esconder, não demora para que os pais percebam. E aí, uma vez capitada a energia negativa, pai e mãe passam a sofrer junto. Pelo menos é assim com a maioria deles. Filho na fossa é sinônimo de coração apertado. O que difere entre uma família e outra é a forma dos pais agirem diante dessa situação. O Bolsa colocou esse tema em pauta para que você descubra qual a melhor maneira de lidar com os filhos quando eles estão pra baixo, dando o suporte necessário sem prejudicá-los.
Cada exemplar de pai e mãe faz um estilo diferente quando o assunto é confortar seus “pequenos” – que já podem estar pra lá de grandinhos. Uns se contentam em oferecer um colo, ouvem com atenção o que o filho ou filha tem a falar e, no máximo, dão conselhos. Outros se sentem capazes de achar a solução para os problemas da criança ou jovem e, em alguns casos, até vão tirar satisfações com os “culpados” pela dor de sua cria. Há ainda o tipo de pais que ficam tão preocupados ao ver seu rebento sofrendo, que chegam a se desesperar. “Minha mãe fica muito mal quando me vê triste, ela chora e tudo. Uma vez ela até passou mal”, conta a estudante Tatiane Portilho, de 23 anos, lembrando da época em que estava deprimida por causa de uma briga com um ex-namorado. “Nesse dia, eu estava na varanda, superpensativa, de repente meu padrasto veio e pediu para eu entrar para conversar com a minha mãe, porque ela estava aos prantos e se sentindo mal. Tivemos até que deitá-la e dar calmante”, lembra Tatiane, que, hoje em dia, evita demonstrar quando está triste. “Procuro logo o colo das minhas amigas, porque se for conversar com a minha mãe, é capaz de ela ficar pior que eu”, acredita a estudante.
Não precisa ser gênio para concluir que o colo dos pais que se desesperam não são os melhores para encostar a cabeça e chorar. Segundo a psicanalista Priscila Faria Gaspar, ao terem essa postura, os pais não conseguem dar o apoio necessário. “Seria o mesmo que a mãe chorar junto ao bebê ao invés de pegá-lo no colo e acalmá-lo. É muito importante ouvir o que o filho tem a dizer e estar aberto a isso”, alerta a psicanalista, lembrando que, muitas vezes, tudo o que ele precisa é de um colo confortador e não de soluções para os seus problemas.
É muito comum, aliás, o pai ou a mãe se achar capaz de dar fim à tristeza de seus descendentes. Bolam, então, planos mirabolantes – sem muito sucesso, claro… “Quando a namorada do meu irmão terminou com ele, meu pai se intrometeu e foi na casa da menina tentar convencê-la de voltar”, revela a jornalista Camila Bastos, contando que o término do namoro mexeu tanto com o irmão, que até hoje ele fica mal quando pensa ou ouve falar nela. “Ele ficou superdeprimido, chorava à beça. Mas mereceu, porque aprontava todas com a menina, mentia, viajava sozinho, traía. E ela toda boazinha. Até o dia que ela se cansou, talvez tenha conhecido outra pessoa. Aí meu irmão viu que realmente gostava dela e fez de tudo para ela voltar, mas não adiantou. Não seria o meu pai que ia fazer a menina mudar de idéia”, diz Camila, lembrando que o pai fez tudo por debaixo dos panos, sem ninguém da família saber. “Só fomos saber que ele tinha ido à casa dela muito mais tarde. Meu irmão ficou pê-da-vida, achou o maior mico. Até a minha avó criticou meu pai, disse: ‘que idéia!’. Todo mundo achou ridículo ele ir lá e dizer “volta com o meu filho’”, comenta.
Segundo a psicanalista Priscila Gaspar, todo mundo, seja criança ou adulto, necessita de ombros amigos para chorar suas mágoas. E é normal que os pais, supostamente responsáveis por proteger suas crias, fiquem chateados se estas, pelo motivo que seja, entram numa fossa. Só que é preciso que eles saibam distinguir os sentimentos deles dos do filho. “Por mais que amemos muito alguém, esse alguém é outro. Mesmo que tenha nascido de nós, ele tem sua própria vida e nós não somos responsáveis pela sua felicidade”, frisa Priscila, lembrando que é muito comum os pais se culparem pela infelicidade daquele que colocaram no mundo. “O pai ou mãe que vai atrás da pessoa que prejudicou seu rebento, para tirar satisfações ou para achar a solução, está misturando a sua imagem com a do filho, tomando os sentimentos dele para si e atuando em seu lugar. Sente a rejeição que o filho sofreu, como sendo contra ele, como se lhe dissessem que o que ele produziu não é bom. Essa confusão de papéis não é saudável para a família, muito menos para o jovem ou mesmo para a criança”, adverte a psicanalista.
Já deu para perceber que para lidar da melhor maneira possível com o momento de tristeza dos filhos é preciso ter equilíbrio e paciência, né? Alguns podem confundir essa postura com desamor. Mas, pelo contrário, entender que aquele momento de dor precisa ser vivido pelo outro significa amar demais. “O meu filho tinha uma dificuldade social no colégio imensa. Tinha poucos amigos, se sentia rejeitado, não conseguia me dar um beijo na porta do colégio, por vergonha. Eu morria de pena, mas via que não podia fazer muita coisa. E aí ele, e não eu, deu uma resposta a essa dificuldade. Se transformou num excelente aluno, passando a ser admirado pelos colegas e professores”, conta a dentista Maria Tereza Assumpção, que acredita não existir uma forma de evitar as dores dos filhos. O negócio é se inteirar do que está se passando e incentivá-los a lutar. “De resto, não há o que o tempo não cure. Acredito que o pior sofrimento é sofrer sozinho. Na medida que alguém se importa, é solidário e te dá colo, a dor fica menos insuportável. Os filhos aprendem desde pequenos que a vida é dura. Eu acho que os pais têm que ter uma confiança muito grande neles, confiança nos recursos que eles têm para encaminharem os seus problemas”, sugere Maria Tereza.
Realmente, uma das coisas que devemos ensinar, desde cedo, às nossas crianças é que a vida é feita de altos e baixos. “Aceitar isso é fundamental”, decreta Priscila Gaspar. A criança ou jovem que nega essa realidade tem uma dificuldade imensa de suportar frustrações. “Muitos jovens entram em depressão profunda frente a uma decepção amorosa ou ao fracasso escolar porque não desenvolveram a tolerância à frustração, que é algo básico para o ser humano. E o motivo de isso acontecer, muitas vezes, se deve ao fato de os pais fazerem sempre as vontades dos filhos, que, consequentemente, não conseguem ouvir ‘não’ para nada”, esclarece Priscila. Tem momentos em que não se pode fazer papel de amigo. Para certas situações, o filho terá mesmo que contar com seus companheiros de faixa etária. “Os papéis precisam ser limitados. Não tem nada de cruel nisso. Deve-se transmitir amor e segurança, mas sem esquecer da autoridade e do respeito. Sabendo colocar limites, a relação dará fruto a pessoas melhores e mais felizes”, aposta Priscila Gaspar.