Os testes genéticos para análise do DNA nos permitirão conhecer os detalhes da constituição genética de cada pessoa. Essa nova fronteira do conhecimento, vislumbrada em sua face positiva, sem dúvida abrirá perspectivas para prevenção e tratamento de doenças. Todavia, em que pese os inegáveis avanços, não há como deixar de refletir quanto aos aspectos negativos agregados ao seu bojo.
Assim, parece ao menos ilustrativo apresentar ao leitor algumas possíveis situações concretas a enfrentar, especialmente no que tange à realização de testes genéticos em pessoas clinicamente normais. A possibilidade de identificar casais de risco, constatando mutações patogênicas assintomáticas pode, por exemplo, prevenir o nascimento de novos afetados, o que seria um grande avanço, em se tratando de doenças graves e sem tratamento. Por outro lado, planejar a prole e evitar determinados nascimentos abriria inúmeras outras questões muito controvertidas.
O conhecimento científico pode e deve ser empregado em direção da proteção do ser humano
Esta é uma questão existencial inafastável e sempre atual nas reflexões humanas: a face positiva e negativa do conhecimento, assim como a irrecuperabilidade do desconhecimento. Parece inexorável que o ser humano tenha que sofrer, hoje, sofrimentos novos que no passado nunca foi compelido a sofrer (simplesmente porque desconhecia), como, por exemplo, as seqüelas decorrentes do conhecimento de uma doença que terá no futuro, especialmente se inexistir tratamento eficaz, e, mais especialmente ainda se for jovem. Como lidar com esta informação nova?
Será que esta nova medicina preditiva (que prediz situações futuras) que emerge não está a exigir uma capacidade acima do suportável? É claro que não há uma resposta única! Se traduzida na possibilidade de evitar a transmissão de doenças, tal informação será benéfica. Para algumas pessoas, entretanto, tal informação poderá carrear uma carga de sofrimento quase insuportável. Frente a todos esses aspectos ambivalentes, já se sustenta, no plano jurídico, o direito de ignorar o resultados desses testes genéticos preditivos, contexto em que nos parece oportuna a reflexão sobre “o não saber” (como contingência) e “o não querer saber” (como ato de vontade).
Outra questão diz respeito ao diagnóstico pré-natal, uma espécie de teste genético utilizado para diagnosticar enfermidades no feto antes do seu nascimento. Há quem se posicione no sentido de que o norte orientador do diagnóstico pré-natal é a sua realização apenas em benefício do embrião, não admitindo testes para discriminar o embrião (ou o feto), por ser portador de patologia genética. Relativamente ao diagnóstico positivo de patologia genética antes do nascimento, menciona-se a possibilidade atual de prevenir a ambigüidade genital em meninas recém-nascidas, evitando futuras cirurgias corretivas, evitando erros de registro civil e confusões do gênero, isso através de tratamento não invasivo: o fornecimento medicamentos à gestante (e conseqüentemente ao feto).
Isso tudo demonstra que seria um retrocesso pretender estancar o avanço da ciência, já que o conhecimento científico pode e deve ser empregado em direção da proteção do ser humano. Indubitavelmente, este é o fundamento norteador da inesgotável questão a ser debatida, qual seja, estabelecer os limites para aplicação dos conhecimentos científicos adquiridos.