Martha Medeiros

Você conhece a Martha Medeiros? Não? Tem certeza? Para quem não ligou o nome à pessoa (ou melhor, ao texto), vale uma dica. É comum receber alguns textos dessa escritora gaúcha por mensagens eletrônicas na Internet. Ela, obviamente, não gosta dessa “proliferação” das suas crônicas pela internet. Mas, por outro lado, a rede fez de Martha uma escritora popular, que tem com uma de suas marcas a facilidade de falar coisas do cotidiano, as quais muitas vezes passam despercebidas aos nossos olhos.

Com uma linguagem simples e direta, ou como ela mesma define, “comunicativa” com seu público, Martha tem conquistado muitos fãs. Seu trabalho, entretanto, vai além das páginas da web. Já passou pela poesia, crônicas, romance e literatura infantil. Dois de seus livros foram adaptados para o teatro e ela ganhou duas vezes um importante prêmio de literatura.

Martha começou a vida profissional como redatora de uma agência de publicidade em Porto Alegre, mas aos poucos a literatura foi tomando conta do seu dia-a-dia. Hoje colabora com diversas publicações, entre jornais e revistas, e divide o seu tempo entre as palavras, os cuidados com a casa e com as duas filhas. Em entrevista exclusiva para o Bolsa de Mulher, Martha Medeiros fala da carreira, sucesso, sobre a dificuldade de viver da escrita no Brasil e da época em que deixou o trabalho de lado para acompanhar o então marido no Chile.

Bolsa de Mulher : Você deixou de lado a sua carreira como publicitária para viajar pelo Chile durante oito meses. Nesse tempo, ficou escrevendo poesias. Foi difícil deixar tudo para trás?
Martha Medeiros: Na época eu já trabalhava há muito tempo com propaganda e estava um pouco frustrada com a profissão. Quando meu marido disse que havia recebido uma proposta de trabalho no Chile, achei que seria uma ótima oportunidade para dar um tempo. Fomos para lá por causa dele, não foi uma escolha minha, mas acabou sendo um divisor de águas na minha vida. Quando voltei, comecei a escrever crônicas para jornal.

BM: E sua família, o que achou da decisão?
MM: Não foi bem uma “decisão”. Eu voltei sem saber o que fazer, cheguei inclusive ainda a trabalhar um tempo como freelancer em agências, mas aconteceu de o jornal Zero Hora me convidar para publicar um texto, e depois outro, e mais outro, e assim, circunstancialmente, acabei virando cronista. Minha família apoiou, claro. Era uma nova porta que se abria na minha vida.

BM: É difícil viver da escrita aqui no Brasil? Que dificuldades encontrou a ainda encontra?
MM: Em geral, é difícil viver de direitos autorais, salvo raríssimas exceções, como Paulo Coelho e Luis Fernando Veríssimo. E mesmo eles, com o sucesso que fazem, cada um no seu gênero, mantêm colunas em jornais. Essas colunas conferem estabilidade e são uma vitrine importante para o trabalho que realizamos. Quem não tem este espaço precisa criar outras formas de divulgação ou diversificar sua atividade: escrever para teatro, cinema, tevê, promover saraus, etc. Quem se mexe, e tem talento, lógico, consegue se manter. Difícil é ficar apenas sentado em casa escrevendo e depois esperar o resultado das vendas dos livros.

BM: Um escritor depende da inspiração. Completando a questão anterior, é difícil viver de inspiração?
MM: Faz tempo que troquei a palavra inspiração por motivação. Inspiração é uma idéia meio romântica, parece que você precisa ser “tocada” pelo sublime e só então trabalhar. Não funciona assim. Tenho prazos a cumprir e passo o dia inteiro no computador, inspirada ou não. É claro que tem dias que as palavras fluem com mais facilidade, em outros dias é travação total. Acontece. Mas o exercício é diário.

BM: Você tem colunas semanais em vários jornais e revistas (Martha é cronista dos jornais Zero Hora e O Globo, colaboradora das revistas Claudia e Viagem, ambas da editora Abril, e colunista da revista Outracoisa, editada pelo cantor Lobão). Isto é, faz um trabalho intelectual, mas com prazos industriais. Acha que isso atrapalha a sua produção ou já está adaptada a esta questão?
MM: Acho produtivo ter prazos. Se me deixarem muito solta, acabo privilegiando outros trabalhos mais urgentes e deixando aquele que não tem prazo para o fim da fila. Às vezes cometo a heresia de pensar que eu precisaria de prazos até para escrever poemas e ficção, que são dois gêneros que amo e quero continuar exercendo, mas que acabo sempre deixando pra depois em função de outras atividades. Estes são prazos que eu mesma tenho que me impor, senão não concluo nada.

BM: No seu caso parece muito fácil encontrar temas para os seus textos. É fácil realmente? Como é seu processo de criação? Tem alguma mania ou preferência?
MM: Não tem sido nada fácil, ao contrário. No Brasil cronista dá em árvore (e o fruto é da melhor qualidade, diga-se), então o que não falta é gente escrevendo sobre tudo. Mas tudo mesmo. Como ser original? Como encontrar algum assunto que desperte a atenção? Eu já desisti de ser original, apenas procuro dar meu ponto de vista sobre temas triviais. Tudo pode me servir de “gancho” para uma reflexão: desde uma notícia no telejornal até a frase de um livro. Tenho um caderno onde anoto tudo o que pode vir a se transformar em crônica. Às vezes o caderno não está por perto quando tenho alguma idéia, e aí penso: tudo bem, desta eu não vou esquecer. Mas dez minutos depois já não lembro o que era.

BM: Você costuma falar de coisas do cotidiano e muitas pessoas acham seus textos geniais. Foi difícil desenvolver essa sensibilidade para captar graça nas coisas simples do nosso dia-a-dia? O que mais te inspira?
MM: Sinceramente, meus textos não são geniais… Eles são comunicativos, por isso o interesse do leitor. E esta comunicabilidade não é estudada, vem do meu próprio jeito de ser. A sensibilidade existe por ela mesma, não é arquitetada, está em mim. Talvez a propaganda tenha exercido influência neste meu estilo, propaganda é a arte de seduzir, e acho que mantenho este jogo de sedução com o leitor.