Bolsa de Mulher – Como você escolheu Arquitetura?
Bel Lobo – Eu tinha me inscrito no vestibular pra Psicologia, porque a Dinha, minha tia, é psicóloga e ela fazia uns jogos com a gente que eu adorava quando era criança, então, na falta de opção, eu achava que ia gostar de fazer psicologia. Até porque a gente é meio maluco, e quando a gente é meio maluco quer fazer psicologia. (Risos). Eu já tava inscrita, mas aí eu conheci uma amiga no colégio, lá em Belém – o pai dela era militar também -, a Neca. Ela desenhava, a mãe dela tinha feito Arquitetura, e ela começou a ir lá em casa e a e começamos a desenhar. Aí eu descobri que eu desenhava, nunca tinha desenhado na minha vida.
BM ? Quantos anos você tinha?
BL – Dezessete anos. Descobri que eu tinha facilidade pra desenhar e adorei, aí eu comecei a conversar com a mãe dela sobre Arquitetura e fiquei super interessada. Mudei a inscrição do vestibular no último dia.
BM – Eu achava que você sempre tivesse decidido fazer Arquitetura.
BL – Eu não sabia nem da existência, não tinha muita noção. Resolvi mudar na última hora e passei super bem.
BM – Você fez a faculdade aqui no Rio ou lá em Belém?
BL – Comecei lá, tirei segundo lugar na Faculdade de Belém do Pará.
BM – Segundo lugar no ranking geral?
BL – É. Depois a gente veio pro Rio porque o papai foi transferido…
BM – Seu pai é coronel?
BL – É, e aí eu fui direto pro Fundão e fiquei até meio decepcionada. Eu achava que a faculdade de lá era mais séria. Eu me lembro que assim que eu cheguei tinham uns trabalhos que eles passavam e eu achava que tinha que desenvolver, então eu pegava uns livros em inglês e francês, pedia pra traduzir, pra escrever sobre aquela matéria. Que nada, o resto do pessoal pegava o livro que a professora indicava e copiava! Eu me lembro que eu fiquei tão decepcionada: “Gente, isso é o Fundão? Lá em Belém do Pará era mais consistente do que aqui”.
BM – Quantos períodos você fez lá?
BL – Só o primeiro, o resto foi no Fundão. Foi lá que eu conheci o Bob (o marido), mas só comecei a namorar ele depois que eu saí da faculdade, antes eu era só amiga dele.
BM – Assim que você se formou você conseguiu trabalho, ou não?
BL – Não, eu tava pra me formar e estava construindo um atelier em Santa Teresa com dois amigos, a Claudinha e o Marcelo, e não tinha dinheiro. O dinheiro que eu tinha pra comprar o terreno e começar a construir foi da Batalha dos Astros, aquele programa na Globo.
BM – Que programa é esse?
BL – Era um programa que tinha na Globo que eu fui representando a faculdade pra responder perguntas de conhecimento geral. Fui eu, a Dóris e o Fernando a primeira vez, depois o Marcelo Carneiro foi junto. Era pra responder perguntas sobre novelas, tipo um jogo da velha, tinha a Dercy Gonçalves, o Ronnie Von, o Miéle. O Miéle que apresentava na época. Me lembro que na coxia eu falei que quando eu era pequenininha era apaixonada pelo Ronnie Von e não deu outra: falaram no ar que eu era apaixonada por ele. Que vexame! Com esse programa a gente ganhou um monte de carros, bicicletas. Só eu ganhei seis bicicletas, um monte de brinde. Eu vendi, dei um milhão de coisas. Aí eu ganhei um dinheirinho e com isso a gente começou a construir o atelier.
BM – Você já estava envolvida com música?
BL – Acho que já tava no coral, no Coro Come. Na época não tinha muito estágio e eu já tava muito envolvida com o coral, viajando muito, então não podia pegar estágio muito certinho e eu precisava de dinheiro pra terminar o atelier. O Marcelo e a Claudinha tinham grana porque os pais bancavam, mas eu não, tinha que trabalhar mesmo. Eu passei um dia em frente da Richards e pensei, vou trabalhar de vendedora, me candidatei e fiquei lá até acabar o atelier.
BM – E você vendia bem?
BL – Não conseguia vender nada! O que eu gostava mesmo era de ficar mexendo nas luminárias, ajeitando móvel, fazendo display. Eu não conseguia empurrar pro cliente. Quando eu não gostava, não gostava mesmo, não conseguia ficar “ai leva esse cintinho”, eu ficava na minha. Adorava conversar com os clientes. Cheguei até a ser subgerente porque eu tinha uma certa liderança, mas depois eu disse: “não quero ser subgerente, não, é muita responsabilidade. Quero ser vendedora, ganhar o dinheiro do atelier e depois ir embora”. Logo quando eu tava saindo, me chamaram pra trabalhar na área. Foi o Ronaldo Saraiva, arquiteto que fazia loja e abriu uma pra vender os móveis dele.
BM – Como ele soube de você?
BL – Uma amiga minha que trabalha com ele. Como viu que eu era arquiteta e trabalhava em loja, achou que eu era ideal, mas eu não era. Não sabia vender. Fiquei um tempo lá, mas uma outra amiga, vendedora da Richards, me avisou que a cunhada dela estava procurando uma sócia e perguntou se eu não queria ser sócia dela. Era a Lia Siqueira. Eu nem conhecia ela. Fui lá, sentei e olhei um projeto de uma casa pra gente fazer. A gente fez junto, foi super gostoso, ela estava começando, e fechamos sociedade. Ela já tinha mais estrada, mas tava montando o escritório ainda.
BM – Ela é mais velha que você?
BM – Engraçado que ela só estourou agora.
BL – Foi depois do Casa Cor, mas ela é boa pra caramba. Aí ela foi indo mais pro design e eu queria continuar na linha da Arquitetura, mesmo. Nessa época o Ricardo, da Richards tinha me convidado pra fazer uma loja dele.
BM – Você manteve a amizade com ele?
BL – Não, lembraram de mim. Precisaram de uma arquiteta pra botar lá dentro e lembraram. Na época eu ainda tava na Lia e me chamaram, mas eu ofereci o Bob.
BM – Vocês ainda eram só amigos?
BL – A gente já tava namorando, pensando em casar. Eu já tava grávida do João.
BM – Quantos anos vocês namoraram?
BL – Pouquíssimo, a gente namorava e terminava e o que segurou foi o João.
BM – Fala mais sobre essa história de vocês. Eram amigos e de repente o que aconteceu?
BL – Eu já tinha uma atração por ele desde a primeira vez que eu vi.
BM – E ele não te dava bola?
BL – Dava, mas eu tinha namorado. Então na época que o Ricardo chamou, eu ofereci o Bob, mas o Ricardo não quis. Depois, quando a gente saiu dali, eu liguei de volta pro Ricardo pra saber se ele ainda queria e ele disse que sim, mas eu avisei: tô grávida. Tinha acabado de saber. Ele disse tá bom. Fui, mas eu tinha que fazer Iguatemi em São Paulo, Fashion Mall…
BM – E você encarou?
BL – Fui pra Richard, comecei a fazer as lojas e o Ricardo quis que eu fosse com ele pra Nova York e eu já estava com sete meses de gravidez. Ele queria que eu fosse ver uma lojas. Eu fui. Lá, quase na volta, eu tropecei e fiquei a noite inteira sentindo contração, quando voltei pro Rio, tive descolamento de placenta e tive que antecipar o parto do João. Depois que ele nasceu eu ainda fiquei um tempão no hospital por causa disso, porque teve um milhão de problemas.
BM – Você teve problemas?
BL – Não, o João. Assim que eu saí do hospital, ligaram: “Oi, tudo bem? Como vai o neném? e o projeto?” Aí eu comecei a fazer o projeto de novo do Iguatemi e do Fashion Mall e o Bob entrou junto pra trabalhar com a gente. Tinham umas reuniões na casa do Ricardo porque eu tava na casa da minha mãe porque o João tinha que ficar lá pra pegar sol, acabou que a gente voltou pra casa e eu desesperada. João chorava de um lado e eu chorava do outro. Eu não dormia mais, não tinha leite, ele chorava e um dia eu falei pro Bob que ia sair da Richard. O Bob disse: “Tá maluca!”. Eu respondi: “É meu primeiro filho e eu mal olho pra ele. Meu primeiro filho nasceu de sete meses, tive que desalojar ele e vou largar o emprego. Eu tenho que cuidar do meu filho porque eu nem dei boas-vindas pra ele”. Aí eu fui lá pra Richard, falei, o Ricardo ficou uma fera comigo, a Sandra entendeu na hora.
BM – A Sandra é quem?
BL – A ex-mulher dele. Mãe, né, entendeu completamente e falou que não tava entendendo o que eu ainda estava fazendo lá. O Ricardo não gostou e respondi que o Bob estava lá e ficava no meu lugar. E ficou, está há 12 anos lá com muita competência porque eu não teria mantido aquele emprego. Ainda bem que o Bob ficou. Eu voltei e comecei a fazer lojinhas.
BM – Foi quando você fez seu escritório na casa de Laranjeiras?
BL – Não, isso foi bem depois. Eu comecei a trabalhar pingado, fazendo lojinhas, apartamentos e depois foi aumentando a intensidade. Quando o Antônio nasceu eu fui trabalhar na Mesbla.
BM – Antonio é mais novo quantos anos?
BL – Três anos. A Mesbla me convidou pra fazer umas lojas novas pra eles. O Marcelo, que era meu sócio na época, quis ir. Ele dizia que o sonho dele era ter fundo de garantia, décimo-terceiro e férias. Eu falava que não era meu sonho, mas eu não queria ficar sozinha e decidi ir. O Antonio tinha dois meses e lá fui eu. Fiquei um tempo lá, mas era muito chato o emprego, aí a Mesbla começou a fazer água, saiu um barco, eu saí junto, remontei meu escritório e voltei a fazer loja. Eu tô sempre na loja.
BM – Essa fixação em loja era porque você gostava ou acabavam te chamando só pra isso?
BL – Não me chamavam só pra isso. Mas eu gosto mais mesmo. Cada vez pintando mais, montei aquele escritoriozinho lá em casa e, quando tava com muito trabalho, chamava os amigos pra dividir os projetos. Depois comecei a achar que não estava dando muito certo e decidi contratar outro arquiteto, mas não deu. Era dentro da minha casa…fornecedor indo lá, marceneiro… e eu pensei que tinha que sair dali.
BM – Você foi pra onde?
BL – Eu fui pra um escritório em Ipanema, na Maria Quitéria e fiquei lá uns cinco, quatro anos. Primeiro aluguei uma salinha, depois troquei de salinha, e de ano em ano fui expandindo. Mas aí eu resolvi ficar mais perto das crianças e a gente achou essa casa aqui no Cosme Velho onde eu montei o escritório.