Seja fazendo a brincadeira do copo escondida da mãe, ou aprendendo a jogar o baralho de tarô que veio de brinde numa revista esotérica, toda menina cresce cercada pela curiosidade do místico. Quem nunca desejou antecipar o futuro, e saber pela cigana se ele estava a fim de você? Essa inquietação faz parte da infância e adolescência de mulheres que, como todas nós, adorariam ter algumas dicas e, quem sabe até uma ajudinha, para alcançar seus objetivos. O esoterismo sobrevive em pleno século XXI através da leitura de cartas, jogos de runas, macumbas, magias, feitiços, simpatias e mandingas das mais variadas. Esses rituais sempre foram expressões da sensibilidade feminina, em busca de sua verdade interior. Se eles funcionam ou não, isso vai depender da crença de cada uma em seu próprio poder. E antecipando a celebração deste dia tão feminino, fomos atrás de mulheres que carregam em si um pouquinho de magia, e nos ensinaram como fazer do dia das bruxas uma grande celebração de nossa sexualidade.
Bruxa pós-moderna
Perseguidas durante a inquisição, elas acabaram queimadas na fogueira. Mas este passado violento, marcado pela ignorância da época medieval, evoluiu para uma visão bem-humorada da bruxaria. Se a bruxa de outrora era representada com cabelos espetados e nariz pontudo com direito a verruga, sua mais recente expressão se resume a bela e loura Nicole Kidman. A atriz, escolhida para interpretar a protagonista do filme Feiticeira – refilmagem do clássico dos anos 80 – , comprova o carisma que essa figura transmite.
Mas afinal de onde surgiu a bruxaria? As bruxas nada mais eram do que mulheres que se utilizavam dos recursos da natureza, principalmente ervas, para curar pessoas. Por morarem na floresta, tinham acesso às plantas, e acabaram aprendendo seus poderes medicinais. Muitos acreditam que tenham sido as precursoras dos alquimistas e médicos. Apesar de existir há muitos anos, foi na Idade Média que a bruxaria começou a ser vista com maus olhos pela Igreja Católica. Por não aceitar a crença wicca, a Igreja criou a inquisição, dando início à caça às bruxas. Com a perseguição, essas mulheres esconderam suas receitas, que passaram a ser transmitidas oralmente, de mãe para filha.
Apesar de distante, este passado sobrevive em rituais ensinados em cursos mundo afora. Em São Paulo, um dos mais procurados é o do Imagick, que oferece apenas no mês de outubro o curso “O Despertar da Bruxa”. Zelinda Orlandi Hypolito, fundadora do Imagick, é quem está à frente dos ensinamentos, reservados para mulheres. “Toda mulher pode ser uma bruxa. Apenas acordamos as pessoas para seus poderes natos. Ser bruxa é lidar com a natureza, e fazer com que ela faça o que você deseja. Uma bruxa conhece, cuida, se integra e respeita a natureza. Tudo parte da utilização dos quatro elementos – água, terra, fogo e ar. No curso, desenvolvemos nosso lado feminino. A bruxa é quem dá a vida, traz a luz”, esclarece.
O assunto desperta o interesse de mulheres de todas as idades, crenças e nacionalidades. A estudante de designer Camilla Fernandes é uma das que despertou para seu lado bruxo, e estuda com afinco a Wicca. “Minha mãe sempre me falou muito da importância em se respeitar a mãe natureza. Tive uma forte ligação com os elementos”, diz ela, que tem 21 anos de idade e cinco de ensinamentos. Apesar de não se considerar uma bruxa, Camilla admite já ter usufruído de seus poderes. “Não gosto de chamar de feitiço, porque o que fazemos não é enfeitiçar. Mas, acreditando e utilizando a força da natureza e seus elementos, podemos alcançar coisas boas. Quando tinha 17 anos, fiz um ritual para que aparecesse a pessoa certa para mim. Logo depois, conheci um homem que viria a ser meu marido. Começamos a namorar no dia 31 de outubro, há exatos quatro anos, numa noite linda de lua cheia. Acredita nisso?”, recorda a aprendiz. Pelo andar da carruagem, a estudante tem dom para a coisa. Consciente de sua capacidade, Camilla adverte para as mais afoitas: “Ser bruxa é ter conhecimento, e o mais importante é saber que tudo o que a bruxa faz para os outros, seja bom ou ruim, volta para si multiplicado por três. Não faço nada para prejudicar ninguém, mas existe na bruxaria tanto a magia branca quanto a negra”.
Para entrar no clima do dia 31, não é necessário fazer curso, se iniciar, nem fazer feitiço. A bruxaria se expressa de muitas formas, inclusive através de dons. A designer Rosana Perez, 29 anos, apesar de ter nascido em uma família católica – com direito a batizado e primeira comunhão –, sempre teve um pezinho no místico. “O assunto me fascinava, mas foi há seis anos, quando comecei a comprar livros, que levei o tarô a sério. Gosto da perspectiva que o tarô passa, da vida como um ciclo. Comprei o baralho e comecei jogando para mim mesma. O interessante é que as cartas não te dão uma única resposta. A avaliação varia de acordo com a sensibilidade de quem lê. Foi quando eu resolvi que era hora de aprender o baralho cigano, que é mais direto, e mundano. Ele não enrola, vai direto ao ponto”, diferencia. Foi após conquistar segurança em suas interpretações que Rosana começou a jogar para terceiros. Na hora de contar o que há por trás das cartas, todo o cuidado é pouco – principalmente entre amigas. “Já previ coisas ruins com o baralho cigano. Não omito, mas tomo o cuidado de não deixar a pessoa impressionada. Todo mundo fica com medo quando vê a carta da morte, mas ela simboliza apenas um desfecho, o final de alguma coisa na sua vida. E com todo final, vem um recomeço”, explica.
Uma das previsões que mais a marcou foi sobre seu atual namorado. “Passei seis meses vendo que apareceria um homem valente e de bom coração na minha vida. Era a descrição perfeita do meu namorado. Quando nos conhecemos, bastou o relacionamento desandar para aparecer a carta de conflito”, conta. Apesar de ajudarem a enxergar os fatos, elas não evitam problemas. O importante é saber utilizar a informação da melhor maneira. Em outra situação, Rosana jogou a pedido de uma amiga. “Primeiro joguei o tarô, e quando ela perguntou sobre o relacionamento, vi que as coisas não estavam bem, mas iriam melhorar. Só que fiquei com uma dúvida na cabeça, e resolvi jogar o baralho cigano”, conta Rosana. Batata! A melhora, diferentemente do que sua amiga poderia ter concluído, seria com outro. “Com o baralho cigano posso ser mais direta. Perguntei se ela iria conhecer uma nova pessoa, e não deu outra. Até a carta do anel, que representa a união, saiu. Vem casamento por aí!”, prevê a designer.
O dia das bruxas nada mais é do que o dia dos Finados, só que comemorado dois dias antes, devido a uma defasagem entre os calendários profano e católico. A data é um ritual de passagem, no qual os portões dos mundos se abrem, e os mortos se encontram com os vivos. Este encontro serve para os vivos se desprenderem do contato com os mortos, e resolverem suas pendências. Na próxima segunda-feira, aproveite o dia das bruxas para fazer uma das simpatias que selecionamos para nossas leitoras.