Uma das estratégias possíveis para analisar as desigualdades entre homens e mulheres são os números fornecidos por pesquisas e levantamentos. O Dicionário Feminino da Infâmia*, obra publicada pela Fiocruz para guiar o cuidado de mulheres vítima de violência, reuniu dados estatísticos sobre o espaço por nós ocupado nos seguintes campos: saúde, contracepção, violência, trabalho, educação e participação política. Eles nos permitem ter uma boa ideia do lugar que a mulher ocupa na sociedade.
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Participação política
Apesar de ter uma presidenta mulher, o Brasil ocupa a 118ª posição mundial no ranking de participação feminina em cargos eletivos.
No ano de 2012, houve 2.025 candidatas a prefeituras, sendo que 665 foram eleitas. Isso representa 12% do total de prefeitos eleitos. O número era de 9% em 2008.
Em 2010, 543 mulheres foram eleitas deputadas estaduais – representando 23% do total – e 45 se tornaram deputadas federais – 8% de todos os deputados federais. Ainda em 2010, foram 10 senadoras (14,8% do todo) e duas governadoras estaduais.
Trabalho
Participação no mercado de trabalho
Entre os anos de 2002 e 2011, o número de mulheres formalmente empregadas no mercado de trabalho passou de 11,4 milhões para 19,2 milhões. Apesar do aumento, o contingente de mulheres trabalhando ainda é menor do que o de homens.
Salário das mulheres X salário dos homens
No ano de 2011, as mulheres recebiam, em média, o equivalente a 72% do salário do homem. Também é mais comum que as mulheres fiquem restritas a áreas específicas do mercado de trabalho, enquanto os homens têm mais liberdade para se disseminar por todas elas.
Jornada de trabalho
Também em 2011, elas trabalhavam em média 39,2 horas semanais enquanto eles trabalhavam 43,4 horas por semana.
Trabalho não remunerado
Nesse grupo estão inclusas tarefas como cuidar da casa, dos filhos, de pessoas doentes ou idosos.
De acordo com o IBGE, a probabilidade de que o homem exerça atividades domésticas durante a semana é de 49,7%, totalizando um tempo de 3 horas e 17 minutos dedicados a essas tarefas.
Entre as mulheres, a probabilidade é de 92,9%, totalizando 4 horas e 35 minutos de dedicação ao lar.
De acordo com os pesquisadores Aguiar e Suyama, citados no dicionário da Fiocruz, caso a mulher trabalhe fora, essa probabilidade cai para 81%. No caso do homem, a probabilidade cai para 28,1%.
Educação
Apesar de receberem salários menores pelos mesmos postos de trabalho, as mulheres são mais instruídas que os homens. De acordo com o Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2009, as mulheres com idade entre 20 e 24 anos haviam estudado cerca de 10 anos, enquanto os homens na mesma faixa etária haviam estudado 9,3 anos.
Violência
O Brasil é o sétimo país do mundo em taxas de homicídio contra mulheres. Em sua maioria, esses crimes são cometidos pelo marido, parceiro ou ex-parceiro com armas de fogo (49%), facas (26%) ou outros meios (25%).
Agressão sexual
Dos casos de agressão sexual registrados em hospitais públicos no ano de 2011, 20% foram praticados pelo pai ou padrasto da vítima e 15,4% por companheiro ou ex-companheiro.
Contracepção
Se antes as gravidezes eram controladas por regras rígidas estabelecidas pela família ou pela religião, com o tempo e com a maior liberdade sexual, as mulheres passaram a ser donas da própria fertilidade e a usar métodos contraceptivos modernos.
Por outro lado, é possível afirmar que a responsabilidade sobre a prevenção da gravidez ficou prioritariamente com as mulheres, apesar de o homem também estar, por motivos óbvios, envolvido nesse processo.
Pílulas anticoncepcionais e do dia seguinte, cujas cargas hormonais e seus impactos na saúde têm sido muito questionados, são apenas algumas opções de métodos contraceptivos femininos. Entram nessa lista também o DIU, a laqueadura, as tabelinhas, o diafragma entre outros. Ao passo que, para o homem, as possibilidades para evitar filhos se resumem principalmente à camisinha e à vasectomia.
De acordo com pesquisa do Ministério da Saúde/Datasus e Dieese, 22% das mulheres usam pílula, 21% são esterilizadas, 3% têm cônjuges esterilizados, 12% usa camisinhas e 7% usa outros métodos.
Saúde
Tempo de vida
A expectativa de vida das mulheres é maior que a dos homens: elas vivem em média 77,3 anos enquanto eles vivem 69,7. Segundo um estudo publicado no jornal científico Journal of Women’s Health, as mulheres de fato tendem a viver mais, mas em piores condições.
Isso acontece porque elas têm mais problemas ósseos, musculares e depressão, resultando em incapacidade física. Os autores dessa pesquisa relacionam esse quadro às duplas jornadas – trabalhando dentro e fora de casa -, que são mais desgastantes. Há ainda outros estudos que relacionam a depressão à viuvez, decorrente da maior longevidade feminina.
Mortalidade materna
Esse dado diz respeito ao número de mortes de mulheres durante a gestação ou até 42 dias após o parto. De acordo com dados do Ministério da Saúde, o número caiu de 141 para 68 óbitos em cada 100.000 entre os anos de 1990 a 2010.
A queda de mais de 50% revela um avanço importante nos cuidados com a saúde da mulher e da gestante, mas não faz com que a mortalidade materna deixe de ser um problema de saúde pública que merece muita atenção.
Vale notar que a morte secundária a aborto inseguro, uma realidade enfrentada principalmente pelas mulheres mais pobres que está entre as principais causas de morte da mãe, poderia ser evitada com políticas públicas mais eficazes para o controle de natalidade, voltadas tanto para mulheres como para homens.
Além dele, são motivos de morte materna sangramento após o parto, infecções, hipertensão e doenças do aparelho circulatório.
Doenças femininas
O aborto é a quinta maior causa de morbidade, atrás apenas de doenças respiratórias, derrames, infartos e problemas circulatórios. Em 13o lugar está a violência, comumente cometida pelo parceiro ou pelo ex-parceiro.
Essas duas alterações da saúde feminina estão intimamente relacionadas à posição da mulher na sociedade. Enquanto o aborto inseguro decorre de cuidados de saúde precários, marcados não apenas por uma redução dos direitos reprodutivos como também pela falta de orientação, a violência é uma clara submissão imposta pelo homem.
*Fonte: Fleury-Teixeira, E.; Meneghel, S. Dicionário Feminino da Infâmia: acolhimento e diagnóstico de mulheres em situação de violência. Fiocruz: 2015.