Seda e veludo

Fora “quentões” e “quentinhos”, não posso imaginar que não falemos do conhaque, uma bebida para tempos frios e até quentes.

Conhaque é um termo genérico: significa um destilado feito de vinho, sendo o Cognac, ao norte de Bordeaux, e o Armagnac, da Gasconha, no sudoeste francês, suas formas mais nobres. Se o termo em português remete à região produtora mais famosa, Cognac, em inglês o equivalente é brandy, derivado do holandês brandywijn, literalmente “vinho queimado (destilado)”.

Alguns dos mais prestigiosos nomes colocam em barril destilados que são pelo menos dezenas de anos mais velhos do que o mínimo imposto

A Holanda, em fins do século XVI, era a maior potência comercial do mundo, e o vinho era indispensável para as necessidades dos marinheiros de sua grande frota de veleiros. Os barcos holandeses vinham até o porto de Charente (o distrito onde está localizada a região de Cognac, na costa do Atlântico) atrás dos famosos vinhos de “Champagne” e de “Borderies” (a região de Cognac é dividida em seis sub-regiões: Grande Champagne, Petite Champagne, Borderies, Fine Bois, Bom Bois e Bois Ordinaires, sendo que os melhores cognacs vêm das duas primeiras). A partir do século XVII, os holandeses destilavam esse vinho em seu país. Ou seja, para fazer o tal “vinho queimado”, o brandy, pois isso importaria em menor carga para os navios, custos mais baixos e a bebida mais estável e resistente às viagens. O brandy era diluído em água e assim bebido como se fosse vinho.

Depois, verificaram que esse mesmo brandy, tradicionalmente guardado em barris de carvalho, melhorava substancialmente com o tempo e era extremamente delicioso se bebido puro. E assim nasceu o mais apreciado dos destilados de vinho, o “cognac”.

Já se destilava vinho em Cognac desde o século XIV, com a introdução dos alambiques e as técnicas que envolviam seu uso a partir do que os franceses aprenderam com os mouros na Espanha. O grande segredo, fora o solo, o clima etc., é que a bebida é destilada duas vezes, o que aconteceu por puro acidente. Segundo uma das várias lendas, um nobre francês, Jacques de la Croix Maron, em 1620, achou na adega de seu castelo um barril de “vinho queimado”, produzido por um camponês. Provou, mas o considerou grosseiro demais para o seu aristocrático paladar. Ordenou, então, que se produzisse uma segunda destilação, e os sabores e aromas de fruta que dela resultaram deliciaram o nobre senhor. Pudera, a primeira destilação ainda guarda impurezas várias, que serão eliminadas na segunda. Outra descoberta aqui é que se verificou que, quanto mais tempo em barris, a bebida melhorava exponencialmente.

Por séculos, várias cepas foram utilizada para produzir o cognac. A principal delas hoje é a Ugni blanc, mais conhecida como a Trebbiano, uma das mais antigas variedades da Itália. Outras cepas são utilizadas, como a Folle blanche e a Colombard, todas elas cultivadas naqueles sub-distritos, que formam um anel em torno da cidade de Cognac.

Após a segunda destilação, temos um cognac com 70% de álcool. Porém, anos de maturação em barris de carvalho farão com que grande parte desse álcool se evapore (fala-se que esse conteúdo vaporoso é “a parte dos anjos”). Dependendo da quantidade evaporada, os produtores adicionam água ou destilados mais fracos de modo que o teor final alcoólico se fixe em 40%, que é a norma, o mínimo permitido.

Categorias. A bebida é categorizada de acordo com a sua idade, o que está indicado em seus rótulos:

– VS ou “very special” (muito especial): Significa que a bebida ficou pelo menos dois anos em barris.

– VSOP ou “very superior old pale”: Indica que, pelo menos, ficou embarrilada por quatro anos. É também chamado de Réserve.

– XO (ou “extra old”), Napoléon, Impérial, Hors d’âge, Vieille Réserve: Todos esses termos indicam uma bebida que, no mínimo, maturou seis anos e meio em barril.

Contudo, a maioria está bem acima do mínimo imposto pela lei. Alguns dos mais prestigiosos nomes colocam em barril destilados que são pelo menos dezenas de anos mais velhos do que o mínimo imposto.