Chegada do irmãozinho

Para o casal que planeja aumentar a família, a notícia de uma segunda gravidez é sempre motivo de comemoração. Mas a alegria desse acontecimento não deve roubar as atenções ao filho primogênito, que até então desfruta com exclusividade o amor dos pais. Diante da ameaça de invasão do seu território, esta criança enfrenta uma profunda angústia. E vai necessitar de muito mais carinho e cuidados.

Os casais devem estar atentos para esse sofrimento do primeiro filho até mesmo antes da confirmação da vinda de um segundo. A psicóloga e terapeuta de família Márcia Modesto afirma que uma criança preparada para a possibilidade de ter mais irmãos consegue enfrentar mais facilmente a realidade de não ser exclusiva e dona dos pais. Giselle e Marcelo tiveram esse cuidado. Quando ela engravidou, o casal passou a envolver a filha Bruna, então com três anos, em tudo que se relacionasse à vinda do neném. Uma das primeiras medidas foi confiar à menina a tarefa de transmitir à avó a notícia da espera do irmãozinho. Bruna também deu idéias para o enxoval e participou das discussões sobre o nome de Fernanda, hoje com um ano.

Nesta fase de tanta sensibilidade e sofrimento do filho mais velho, é essencial reforçar sua sensação de ‘pertencimento’ em relação ao espaço familiar. Por isso, quando a mãe precisa chamar sua atenção, não deve chamá-lo de feio nem dizer que não gosta mais dele

A criança pede socorro

A ameaça de perda que a criança sofre com a notícia da chegada de um irmão pode fazê-la regredir em áreas geralmente mais complicadas do desenvolvimento. Márcia Modesto afirma que os sinais dessa regressão, como a volta ao uso da chupeta ou ao xixi na fralda, pesadelos, queda no desempenho escolar ou extrema rebeldia, traduzem um verdadeiro pedido de socorro do primogênito aos pais: “Olhem, estou aqui! Não quero perder seu amor”. Essas manifestações costumam ser mais expressivas quando a diferença de idade entre os dois filhos é menor, mas podem surgir em crianças até cerca de dez anos.

A partir dessa faixa etária – graças a outras atividades e ao maior nível de compreensão do filho mais velho, e até à sua expectativa de garantir um companheiro – as dificuldades têm diversos recursos para superação. Em casos mais complicados, um profissional pode ajudar o primogênito a readquirir a segurança perdida com o nascimento do segundo bebê. Há situações curiosas, em que a presença de um irmão – pedido que o primeiro filho costuma fazer – nem é o aspecto mais ameaçador para a criança: no fundo, seu maior receio é o de perder a exclusividade do amor do pai e da mãe. Esta contradição se revela, por exemplo, no comportamento de Eduarda, de quatro anos, que chama sua boneca de irmã, mas recusa-se terminantemente a aceitar que a “irmã” seja filha dos seus pais “de verdade”.

Um novo bebê a caminho

Durante a espera do segundo filho, é importante que os pais procurem reconhecer e tratar, com respeito, a resistência do primogênito em dividi-los com o “intruso” que vai chegar. Esse processo pode ir da simples observação a amorosas conversas com a criança sobre o nascimento de um novo membro da família e os cuidados exigidos pelo neném – como os que lhe são dedicados desde quando era pequenina. Diante de um eventual desinteresse, é importante trazê-la para a realidade: “Olhe, o neném quer sentir sua mãozinha na barriga da mamãe!” ou “Vamos arrumar a gaveta do nosso bebê?”

Márcia Modesto observa: “Nesta fase de tanta sensibilidade e sofrimento do filho mais velho, é essencial reforçar sua sensação de ‘pertencimento’ em relação ao espaço familiar. Por isso, quando a mãe precisa chamar sua atenção, não deve chamá-lo de feio nem dizer que não gosta mais dele. Essas afirmações reforçarão sua insegurança”. O mesmo cuidado deve refletir-se no respeito ao ambiente e nas preferências dele. É melhor evitar grandes mudanças em sua rotina, antes e depois do nascimento do neném – especialmente se as alterações forem justificadas pelas necessidades do segundo filho.

O nascimento do neném

Nesse dia, toda a família está eufórica. Mas é importante não esquecer a continuidade de acolhimento à criança mais velha, que deve estar presente na maternidade, participar, ir ao berçário. Bruna ajudou na decoração do quarto para a primeira visita da irmã recém-nascida à mamãe. Hoje, aos quatro anos, mostra-se responsável por Fernanda e oferece ajuda quando sente que Giselle está atrapalhada com alguma atividade.

Apesar de tantas reações positivas, a menina não escondeu sua insegurança em alguns momentos, como quando presenciou a primeira amamentação de Fernanda no seio da mãe. Confusa, correu logo para o colo de Marcelo, como que pedindo apoio. Estas situações reforçam a necessidade da presença e disponibilidade paterna, especialmente quando o recém-nascido absorve as atenções da mãe. Mas essa garantia não deve permitir que ela se dedique apenas ao neném, porque seu amor continua essencial para o desenvolvimento emocional do filho mais velho.

Alerta para os pais recasados

Todos esses cuidados têm igual ou até mais importância para a criança quando seu pai ou sua mãe se casam outra vez e esperam um bebê com o novo parceiro. O filho da união desfeita – que também sofre com a ameaça de rejeição, desamor e perda de espaço – precisa ser preparado e acolhido para absorver mais mudanças em sua vida. Esse cuidado, indispensável, será possível quando a nova família está agregada, funciona bem e se preocupa com a sensação de pertencimento da criança mais velha de um dos parceiros.