Em geral, as crianças têm medo do bicho-papão, do lobo mau, da bruxa e do homem do saco porque os próprios pais usam esses recursos para acabar, momentaneamente, com um comportamento ruim dos filhos. Não é difícil encontrar por aí um adulto que costume dizer para a criança: “Pare de chorar, senão o homem do saco vem te buscar!” ou “Se você não comer tudo, o lobo mau vai te pegar!” Na hora pode até funcionar, mas o ideal, segundo as especialistas, é apontar à criança as reais conseqüências do seu comportamento.
Caso os temores já existam na criança, a dica é reconhecer e validar os sentimentos dela. Se ela tem medo do Papai Noel, por exemplo, uma boa idéia é apresentá-lo de maneira positiva, como um velhinho bondoso, que traz presentes para as crianças. Outra saída é ler, junto com a criança, alguns livros sobre medos infantis, como “Barulhinhos do Silêncio” (de Sonia Salerno Forjaz), “Tico e os Lobos Maus” (de Valeri Gorbachev) e “Quem Tem Medo de Monstro?” (de Ruth Rocha). Se, ainda assim, o medo persistir ou provocar limitações intensas no cotidiano, é necessário procurar ajuda psicológica.
A hora da verdade
A descoberta de que esses seres não existem pode ocorrer naturalmente por volta dos seis ou sete anos – quando a criança já começa a desenvolver novas formas de pensamento e a questionar a realidade – ou quando os pais ou um irmão mais velho resolvem contar a ela a verdade. “À medida que o pensamento muda e a criança vai ganhando experiência de vida, esses mitos vão caindo aos poucos. Claro que a criança se decepciona, porque durante muito tempo ela viveu sob aquele pensamento mágico, achando que os personagens faziam sentido”, afirma Rossana Manso. A tristeza, segundo Ana Camila, acontece porque se descobre que a realidade é bem menos divertida. “Isso é inevitável e necessário para o amadurecimento. Os pais devem explicar que a história do Coelhinho da Páscoa, por exemplo, servia para que ela pudesse compreender facilmente o evento em questão. Agora que a criança cresceu, eles podem explicar o real significado da Páscoa”, observa a psicóloga.
Mas a queda dos mitos varia muito de criança para criança e da cultura onde ela vive. Muitas crianças são arrancadas da primeira infância mais cedo e já começam, bem novinhas, a ter contato com a realidade – que, para algumas, pode ser muito dura. Outro oposto é o caso das crianças superprotegidas, que acabam demorando um pouco mais para lidar com isso, correndo o risco de infantilização. “Por volta dos sete anos, é necessário que a criança comece a desenvolver a capacidade de abstração e mais intensamente a concentração e a atenção, pois iniciará o período de alfabetização. A fantasia precisa dar lugar ao interesse intelectual, à concretude das coisas”, indica Ana Camila.
O papel dos pais
Conviver com uma criança em idade de acreditar em mitos pode ser divertido e enriquecedor. Sem incentivar ou restringir demais a criação da fantasia, os pais podem participar e estimular a imaginação do filho com pequenas atitudes: valorizar a crença infantil, como esconder a cesta da Páscoa ou deixar o presente embaixo da árvore de Natal, por exemplo; questionar aspectos da fantasia da criança, como: “Por onde o coelhinho vem para entregar os ovos de Páscoa?”, “Como você acha que é a casa do Papai Noel?”; ou, simplesmente, responder às dúvidas da criança quanto à existência destes personagens. “É importante sempre lembrar que a criança sente prazer em vivenciar o mundo imaginário, pois esta etapa é muito saudável para seu desenvolvimento posterior”, diz Luziane.
Para a Ana Camila, uma boa idéia é usar esses mitos para conversar com a criança sobre assuntos importantes, dando noções da realidade. “No caso do Papai Noel ou outros personagens que apareçam em datas ou eventos religiosos, é importante que a família dê o significado deles à criança, de acordo com a sua crença”, afirma. Já para Rossana Manso, da Escola Americana, o melhor mesmo é incentivar a brincadeira, a leitura, o contato com contos de fadas e folclores. “A idade de brincar é muito importante. É interessante que ela tenha a chance de ver peças de teatro ou brincar com esses personagens. Os mitos são histórias que trazem ensinamentos que ultrapassam gerações. Como a criança absorve com muita facilidade lições de caráter e valores, essa fase de fantasia faz muito bem para ela. Cabe aos pais estimular esse lado mágico até que ela aprenda a diferenciar as coisas. Viver essa etapa é muito bom, é natural e faz parte do mundo dela”, ensina.