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Chegando na metade da faculdade de Direito, Isabella Savaget percebeu que teria que fazer uma escolha que mudaria (e muito!) os rumos da sua carreira profissional. Por conta de uma paralisia cerebral causada pela falta de oxigenação em seu nascimento, a estudante viu na área jurídica uma forma de lutar e defender a causa PCD ( Pessoa com Deficiência). “Pensava que estudar as leis era o caminho para debater e trazer melhorias para a causa. Mas, ao ver que a gente depende muito de níveis acima e de todo um processo burocrático, comecei a ficar frustrada, até entrar em um estágio e entender que precisava mudar de caminho”, relembra ela.
O episódio mencionado acima foi quando, durante seu estágio, ela foi proibida de postar seus conteúdos nas redes sociais, pois estava atrelando a imagem do escritório à sua imagem e sua opinião. “Defender a causa PCD faz parte de mim. Então, naquele momento, eu vi que o Direito não iria me dar tanto alcance e que ficaria, muitas vezes, presa ao sistema. Por isso, no começo de 2022, troquei de curso e fui para Comunicação Social, pois meu Instagram começou a ser visto e passei a fazer conteúdos informativos e reflexivos”, conta Isabella.
Fisioterapia e vínculo com a dança
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Hoje, com 20 anos e morando no Rio de Janeiro, Isabella conta que precisou adaptar suas sessões de fisioterapia e fonoaudiologia, que faz desde criança, para sua rotina no novo curso. A paralisia cerebral acabou afetando sua parte motora, gerando dificuldade na marcha, fala e equilíbrio, mas, com os tratamentos, ela diz que conseguiu muita autonomia e independência; e que precisa de ajuda em poucas situações.
Apaixonada por dança, algo que posta com frequência em seu perfil no Instagram, a estudante de comunicação relembra que foi por meio da música que conseguiu dar seus primeiros passos. “Percebi a minha deficiência com uns sete, oito anos de idade, quando meus amigos da escola iam para o ballet, futebol, e eu ia para a fisioterapia. Porém, todos esses anos de cuidado me fizeram criar um vínculo lindo com a equipe que cuida de mim. Tanto que, sabendo que eu gostava muito de funk, as fisioterapeutas começaram a colocar o ritmo pra tocar e, aos poucos, fui dando meus primeiros passos. Hoje, com o apoio, desço até o chão”, brinca ela, que confessa ter sido sempre uma pessoa questionadora.
“Durante as sessões, que já fiz de todos os tratamentos que você possa imaginar, eu perguntava o motivo de cada coisa e acho que esse tenha sido um possível começo para minha comunicação. No entanto, em alguns momentos, claro, sentia a necessidade de pertencimento a algum grupo”, aponta ela.
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Saúde mental da pessoa com deficiência
Infelizmente, segundo avalia Isabella, esse pertencimento veio por meio de um distúrbio alimentar, que não foi diagnosticado com tanta rapidez como em outros casos. “Na minha adolescência, por exemplo, eu tive anorexia nervosa, e os médicos, pelo menos na minha experiência, meio que não acreditavam que uma pessoa como eu, com paralisia, pudesse ter um distúrbio como aquele. Era como se eu tivesse que escolher o meu problema. Essa é a minha opinião, depois de muitas reflexões”.
“Acho que até hoje é um pouco assim. Grande parte da sociedade não pensa na saúde mental das pessoas com deficiência, como se a gente não pudesse sofrer de depressão, ansiedade e outras doenças relacionadas à saúde mental. Com o transtorno alimentar, eu recebi um tratamento tardio, por demora no diagnóstico. Então, a sociedade precisa também tirar esse preconceito de lado e tratar a gente como seres humanos, cada um com sua unicidade”.
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Direitos das pessoas com deficiência
É na plataforma, com mais 200 mil seguidores, que ela faz questão de criar conteúdos que descompliquem e desmistifiquem a vida de uma pessoa com deficiência e quem interage com ela. “Ao meu ver, conhecimento e informação são as chaves para combater o capacitismo e o preconceito. E a pessoa com deficiência tem isso de sobra para compartilhar, mas a sociedade precisa estar aberta. Às vezes, eu falo que a gente não morde, pode se aproximar e conversar com a gente”, diz Isabella.
Para ela, fazer a sociedade entender e dialogar são processos que ainda estão longe da evolução ideal, porém, com mais vozes ativas, como a comediante Lorrane Silva, também conhecida como Pequena Lo, o caminho está se abrindo aos poucos. “Nosso papel é mostrar nossa realidade, para que sejamos vistos, ouvidos e atendidos. Uma impressão que eu tenho é que outros grupos de diversidade, como o LGBTQIAP+, raciais e religiosos aparecem primeiro e os de deficiência estão tão lá atrás. Parece que nós não estamos nos grupos de inclusão, sabe?”, explica ela, que toca no ponto das cotas e da acessibilidade em eventos.
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Convidada para muitos eventos, Isabella revela que, em muitos deles, ela não consegue se locomover direito e passa por muitas dificuldades, sem contar a falta de cotas dentro das empresas, para contratar e até manter o funcionário capacitado para trabalhar. “Eu repito, a deficiência é só uma das características de uma pessoa. Muitas empresas fazem palestras de diversidade, mas onde estão as pessoas com deficiência? Eventos chamam PCD, mas não pensam na logística e nem no conforto dos convidados. Se perguntassem quais as necessidades, tudo seria muito mais inclusivo”, propõe.
No futuro, a estudante deseja que a sociedade entenda que a inclusão de PCD seja uma obrigação e não um ‘favor’, pois, para ela, essa é a sensação. “Fazer um ambiente acessível está na lei, mas parece que as pessoas se sentem fazendo favores. Porém, é o mínimo que a gente precisa. Espero que, quando terminar meu curso, as coisas tenham melhorado e que meus conteúdos motivem as pessoas não pela minha deficiência, mas mais pelas histórias e informações que eu tenho para contar!”.